Naufrágo

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Para todo lado que olhava, o mar era tudo que via. Já nem se lembrava de como era conversar com alguém. Nem das várias refeições ao dia. Nem dos banhos demorados. Sabonete. Shampoo. Água quentinha saindo do chuveiro. Tudo isso parecia tão distante. Sentia que tudo isso tinha acontecido com outra pessoa, não com ele.

Há semanas que está sem suas provisões. Desde então, o que o está mantendo de pé são os peixes que conseguira capturar. A maioria que pulou em seu bote, ele não tinha talento para pescaria. Sua única fonte de água potável é a chuva, que, felizmente, aparece com frequência.

Sua esperança acabou faz tempo. Sabia que as chances de ser resgatado por um navio ou de aparecer nas margens de alguma praia eram muito baixas. Mesmo se passasse algum avião ou helicóptero, não tinha nenhum sinalizador ou algo que pudesse usar para chamar a atenção.

Nos primeiros dias, nutria uma forte crença de que seria logo encontrado, dado o tempo que o desastre acontecera. Mas, à medida que os dias viraram semanas e as semanas viraram meses, aceitou que estava por conta própria. Ninguém viria ao seu resgate. Era mais certo que ninguém nem ao menos soubesse do que acontecera. Como poderiam?

Nunca tinha visto nada parecido. A não ser nos filmes de ficção cientifica ou nas histórias em quadrinhos que seu filho pedia para que lesse todos os dias antes de dormir. Em alguns momentos ainda se perguntava se aquilo tinha realmente acontecido ou se tinha sido fruto da sua desnutrição.

Agora que a noite já se instalara, ele larga os remos dentro do bote e deita a sua cabeça sobre uma boia laranja. Gostava do balanço que a embarcação fazia. Tinha algo de tranquilizador naquilo. Se fechasse os olhos, podia fingir que estava deitado na rede de sua casa, enquanto seu filho o embalava e em seguida pulava em cima dele.

Era doloroso pensar nisso. Mas, de alguma forma, o ajuda a não desistir. Muitas vezes, antes de dormir, o desespero toma conta e ele chora. Até não haver mais lagrimas a serem derramadas.

Pensava em acabar com todo o seu sofrimento. Pular no mar e deixar que ele o leve cada vez mais para baixo. Não resistiria. Não se debateria para chegar à superfície. Se entregaria inteiramente. Era uma ideia tentadora, mas logo o cansaço o vencia e ele caia no sono.

Dessa vez, no entanto, ele dormiu para nunca mais acordar.

Se Prestasse Bastante Atenção & Outros ContosOnde histórias criam vida. Descubra agora