O Gigante e a Bela Delicada

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O homem rapidamente se sentou como se alguém ou uma força maior o tivesse projectado contra a cadeira. Aquiesceu contra a sua vontade, por condescendência. Fechou a cara e olhou para frente, inquieto, enquanto batia com o pé direito lentamente no chão.

- Eric, vais fazer birras por eu levar o carro?


- Estou a fazer um esforço para não te atirar pela janela fora. Então, não me provoques. Miguel. Não hoje.


- Ui que ele está quase a parir.


Explodir era o normal para o Eric e o irmão gostava de o provocar. Naquele momento ele parecia um vulcão em ebulição. E, explodiu mais uma vez.

- Importas-te de ligar esse maldito carro e irmos embora de uma vez?


Miguel riu-se ao se deparar, mais uma vez, com a raiva do irmão mais novo e pacientemente, como se já tivesse feito o seu dia, ele ligou o carro e seguiu em direção à cidade. O trabalho esperava a ambos. No mesmo local só que em cargos diferentes. E, talvez fosse isso o motivo de tanta ebulição.

Para o irmão mais velho teve dinheiro para tudo. Desde da escola básica ele tinha sempre tudo o que ele queria, explicações nas aulas que estava com dificuldades. Foi para a faculdade e surgiu dinheiro para o pagar. Lhe apeteceu tirar a carta de condução, logo de imediato o dinheiro apareceu por um passo de mágica.

Eric chegou dez anos depois. A vida se tornou difícil para ele. O pai ficou doente e parou de trabalhar e a mãe teve que se esmerar para pagar as contas. Durante muito tempo ele não pareceu se importar com as diferenças entre os dois. Mas logo se apercebeu que não teria as mesmas oportunidades que o irmão mais velho.

Segundo a imaginação do Eric, a sua vida foi dificultada logo de imediato ao nascer prematuro. E, a partir dali, foi sempre a mesma merda de vida. O pior só veio ao de cima quando ele fez quinze anos. De um momento para outro ficou sem pai. E a casa teve que ser vendida para pagar dívidas que estavam por pagar. Foi aí que Eric começou a dar nas vistas e criaturas do Ontem surgiram ao redor dele para o colocar à prova.

Tudo começou quando ele se mudou de zona. Saiu da sua pacata vila para a grande e movimentada cidade. Nas grandes cidades sempre tem mais seres que se vagueiam ao redor dos humanos, a fazer com que eles se auto nomeiam a si mesmos de Caminhantes do Ontem.

O ser que o vigiava, observou calmamente o carro a seguir o seu caminho até o seu destino. Desta vez não foi preciso ir atrás. Havia coisas mais importantes para fazer.

Nas sombras surgiu outro ser, de aparência robusta e gigante aos olhos de qualquer humano, que esperava pacientemente pela outra.

- Sempre na minha sombra Groove. - a criatura virou o seu olhar escuro, como o céu noturno para o ser que a observava. - Até quando pretendias manter-te escondido?


- Ora essa pequena Ethel. Sabes perfeitamente que é quase impossível não te observar. A tua beleza sempre me deixa encantado, digamos que fico de olhos presos a ti.


Groove movimentou os braços no ar e cruzou duas delas. Apesar da ironia na sua voz, era possível sentir um pouco de empatia vindo do ser escondido entre as sombras e acrescentou;

- Vejo-te muito empenhada com os seus pupilos...


Ethel reagiu de imediato, impedindo o gigante de continuar.

- Não te atrevas a mencioná-los. Eles não são para aqui chamados.

- Claro que não. - um sorriso travesso se fez notar nos seus lábios grossos. - Quando vais cair na realidade que é ao meu lado onde pertences. Podes sempre trazer junto contigo toda a tua criação. A ralé é sempre bem-vinda quando vem acompanhada de uma bela Deusa.

O robusto Groove deu alguns passos em frente e o seu rosto pálido apareceu de dentro da escuridão. Era o oposto da Ethel em aparência.

Ela tinha um aspecto delicado que aparentemente parecia ser frágil aos olhos dos seus oponentes. A pele negra combinava perfeitamente com os seus olhos grandes e extremamente escuros. O seu cabelo torcido em dreadlocks compridos eram tão brancos como a neve.

Enquanto ele, tinha uma aparência robusta e gigantesca que meteria medo a qualquer humano. Os seus olhos tão claros como a água numa praia paradisíaca combinava com a sua pele extremamente pálida enquanto o seu cabelo curto era tão negro quanto os olhos da Ethel. As suas mãos eram garras com unhas compridas e muito bem afiadas, prontas para despedaçar qualquer ser humano que aparecesse à sua frente. Com um olho em cada palma das suas seis mãos, nada escapava à sua visão.

Aquele ser de aparência gigantesca não se contentava com pouco. Tudo o que ele almejava tinha que ser concretizado no exato momento em que ele a desejava. O seu egoísmo era demasiado grande para esperar que as coisas acontecessem no seu devido tempo. Ninguém se atrevia a opor-se sem antes ter algo em concreto na sua mente para o encarar e sobreviver a sua raiva. Até mesmo os Deuses temiam a sua fúria, pois o mundo dos humanos era quem pagava as contas no final. Os estragos não eram fáceis de concertar.

Por isso, Ethel driblava aquele Deus com sabedoria e pulso firme em relação a aquilo que realmente desejava, mas tentava sempre lhe desafiar e mostrar que não tinha medo. A sua beleza era a fonte para o manobrar. Para aquela Deusa demonstrar medo era a última coisa a fazer. E, sendo assim, usava o seu charme e encantamentos para o manter sob controle, sem que ele apercebesse que o manobrava em águas mansas.

Acima de tudo nunca mostrar-se inferior a ele, tanto em força como em poder, pois Groove tomaria conta da sua pele e a manobraria sem menor pudor, tornando-a em apenas mais uma das suas servas e posteriormente numa concubina celestial.

Ethel almejava mais do que aquilo para a sua longa vida e para a sua criação. Milênios passaram desde que surgiu na órbita celestial dos universos, juntamente com novas galáxias, sistemas solares e planetas. Cada Deus tinha o seu próprio universo e este era o seu. Não pretendia deixar que um mero Deus egoísta e insignificante aos seus olhos o destruísse como mero pó.

Talvez fosse justamente por isso que Groove a queria. Ele adorava brincar de gato e rato com a sua pequena Ethel. Tentava a manobrar sempre que surgia uma oportunidade. Eram escassas as vezes que ele conseguia tirar algum proveito do altruísmo da sua Deusa preferida. Mas nada se conseguia sem um pouco de esforço. Groove se esforçava, não para mostrar o seu poder mas sim para a ter sobre o seu domínio. Não a deixaria escapar e muito menos deixaria que ela se tornasse independente de si.

A evolução de Ethel tem sido rapidamente notada dentro da órbita dos universos. A inveja até entre os Deuses torna-se num estorvo pesado a carregar nas costas.

Impelido por uma força maior, Groove observava de perto o desenvolvimento do trabalho da Ethel. Esperava uma única falha para destruir toda a criação ralé daquela pequena Deusa em ascensão, e tornar tudo em mais um universo que se juntaria ao seu e assim aumentar o seu poder perante todos.
Mas será que é realmente isso o propósito final daquele Deus? Ou ele vê algo mais naquele universo e na sua Deusa?

Ascensão De Ethel: Caminhantes do Ontem Onde histórias criam vida. Descubra agora