Capítulo 1

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Os meus joelhos doem de tanto esfregar o chão. O pano sujo que seguro cria movimentos circulares no soalho de madeira já limpo. Porquê limpar algo que já está perfeito?!

O elástico escorrega e apanho o meu cabelo castanho ondulado num coque alto.

-Senhorita Price, pagamos-lhe para estar num cabeleireiro? Volte ao trabalho!- A Senhora Smith avisa-me severamente, dirigindo-se depois para a ala este da sua monstruosa mansão.

Volto a esfregar o pano do salão quando Amanda passa por mim. Ela é mesmo sonsa. Pois, não admira, tem tudo o que quer e é super mimada pelos pais. E eu que pensava que poderíamos ser amigas... Sou tão ingénua... Onde é que uma rapariga de casta 2, da realeza, portanto, se poderia dar com uma 6, quase sem-abrigo, que só por acaso é sua empregada?

De qualquer forma estou feliz por não me dar com nenhuma das raparigas de casta 2, ou são modelos arrogantes, ou umas meninas do papá que não sabem o que a vida custa a ganhar...

Levanto-me depois de perceber que já são horas de ir para casa e dirijo-me para o escritório para receber o meu pagamento mensal.

-Posso entrar? - Sr. Smith encontra-se sentado a trabalhar em alguns processos. Quando se apercebe que lá estou sorri amigavelmente e acena. Sento-me à sua frente - Vinha pedir o meu pagamento.

- Há, claro Rose. Aqui está.

O envelope amarelo é me entregue, volto a acenar e dirijo-me à porta da mansão do Sr. Smith.

Demoro cerca de 10 minutos a chegar a casa. Como é que a uma distância tão pequena existem extremos tão grandes? De uma mansão para um T1 num pequeno bairro social onde vivem os 6. Rodo a chave na fechadura e assim que entro em casa avisto Mel, a minha irmã.

- Como é que está a mãe? Ainda tem febre? - Pergunto desanimada.

- Sim... - Ela parece esgotada, mas de repente ela sorri e tira os olhos da televisão, uma herança de família. Definitivamente a coisa mais valiosa que temos em casa - Chega aqui, rápido! Tens de ver o que é que está a dar.

Aproximo-me dela e sento-me no chão a seu lado.

" Bem-Vindos, cidadãos de Illéa! Hoje o jornal Nacional tem uma edição especial com uma notícia astronómica que todas as raparigas vão gostar de saber!"

Mel olha para mim sorrindo enquanto eu tento perceber que notícia é esta.

" Como sabem, o Príncipe Sebastian completou ontem os seus 19 anos. E, como todos sabem, aos 19 anos o herdeiro da coroa organiza a Seleção. Desde gerações em gerações que esta tradição se tem mantido, onde 35 raparigas plebeias, as Filhas de Illéa, são selecionadas para ir viver para o palácio. Entre elas o príncipe escolherá a futura rainha de Illéa. Se achas que tens a capacidade de ser a nova princesa de Illéa e de ganhar o coração do rapaz mais desejado de todo o país então inscreve-te na tua freguesia na próxima Quarta-feira. Irá haver depois todo um processo de seleção e se fores selecionada contactar-te-ão. Apressa-te, só tens dois dias para decidir e o palácio está à tua espera! "

O apresentador do Jornal despede-se e a televisão volta aos anúncios.

- Vala, Rose, tu tens de tentar!- Mel interrompe os meus pensamentos - Tens poucos meses de diferença da idade do príncipe e sabes que se fosses selecionada irias ganhar imenso dinheiro para salvarmos a mãe e para eu poder ir à escola. Além disso, quero deixar de passar fome.

Olho para ela, com os seus olhinhos esverdeados iguais aos meus a brilhar, incrédula com a sua excitação:

- Mel, estás maluca? Antes de mais eu não seria selecionada, e depois? Quem é que tomaria conta de ti? Tu não és adulta! Eu sei que não é fácil mas com o meu emprego ainda consigo arranjar algum dinheiro para os medicamentos da mãe e para a comida!

- Tu não percebes, ok? Tu não sabes o que é ficar em casa semanas e semanas, sem fazer nada sem ser olhar para a parede e tomar conta da mãe. - O seu tom de voz sobe e ela agora está a gritar - Tu não tens noção do quanto é difícil para mim ver todas as crianças das outras castas irem à escola e eu não!

- Achas que é fácil para mim? Eu passo o dia todo a lavar roupa já lavada, a esfregar o chão já esfregado, calando-me com as provocações da Amanda, tudo isto para regressar a casa e ouvir-te a queixares-te. Eu adoro-te Mel, mas eu não posso fazer melhor do que faço, não te posso dar mais porque já dou tudo aquilo que tenho!

E é verdade! Eu percebo que é difícil para ela, mas é difícil para todos nós! Para todos os casta cinco e abaixo. Já temos muita sorte por não sermos casta 7 ou 8, porque felizmente o rei Maxon, que eu nunca cheguei a conhecer porque morreu antes de eu nascer, conseguiu retirar essas duas castas. Todos temos de aprender a viver com isso, e eu aprendi-o aos 10 anos, quando a minha mãe solteira ficou doente e a minha irmã tinha 2 anos.

- Desculpa Rose, eu sei que também é difícil para ti. - Ela dá-me um abraço - Mas esta é a solução! Tu irias para o palácio, eu podia ir à escola e ainda sobraria dinheiro para contratar uma empregada para tomar conta da mãe.

De certa forma ela tem razão, mas eu não o quero admitir. Eu sei que não suportaria ir para longe delas.

- Mas é que eu não sei nada sobre o príncipe, a família real, e não tenho modos de pessoa rica. Não sei as normas de etiqueta, não sei fazer uma vénia! Não sei se consigo viver sem ti a meu lado...

Ela abraça-me outra vez, enquanto me diz ao ouvido:

- Não te preocupes, eu posso ajudar. Afinal este tempo todo em casa a ver televisão vai servir de alguma coisa! - Ela está entusiasmada outra vez - Eu sei tudo sobre o príncipe, a família real, as normas, as maneiras, as vénias, tudo! Passei anos e anos a ver reportagens sobre isso. Por favor, Rose!!??

Não a quero desanimar, porque por mais que eu aceite as probabilidades de ser selecionada são ínfimas.

- Por favor?! Porfavorzinhooo?!

Oh. Ela começa a fazer beicinho e sei que não vou resistir. Afinal, tentar não custa, não é? Assim, quando eu não for selecionada, ela pode confortar-se porque eu fiz tudo o que pude. E eu não quero o melhor para a minha família? Isto vai ser melhor para elas.

- Ok... - Eu paro de resistir. O rosto dela ilumina-se de excitação e eu alarmo-a. - Mas tens de me ajudar. Preciso de saber o mais que puder sobre esta nova vida.

A Seleção de SebastianOnde histórias criam vida. Descubra agora