Capítulo 4

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Luna estava tremendo, só agora tinha parado para processar os acontecimentos com o lobo na clareira. Buscava por uma explicação para o modo como o animal agia, talvez fosse apenas um cachorro muito grande, pensou. Não sabia que existia cachorros tão grandes, era admirável o modo como o animal a tratou, ele deve ter sido bem-criado pelos seus donos para se tornar tão dócil assim, o modo doce de agir não negava que se tratava de um cachorro, as constantes tentativas de lamber sua boca não deixavam dúvidas, era definitivamente um cachorro que amava carinho.

Assim que chegou em casa decidiu por tomar um banho, ela agradecia aos deuses enquanto afundava seu corpo dolorido dentro da água morna, o cheiro de sais de banho estava perfumando o ambiente, deitou cuidadosamente na grande banheira, as pontadas de dor em sua barriga fazia com que desejasse os analgésicos mais pesados que alguém pode comprar. Mas a dor constante dos hematomas não fizeram com que o seu sorriso saísse de seus lábios, mesmo tendo provavelmente quebrado uma das costelas, aguentou a dor calada como de costume, o passeio por Kalaram tornou a dor um pouco menos dolorida, estar naquele lugar a deixava calma como nunca antes esteve, o medo sumiu e restou apenas ela.

Fantasiava em sua cabeça, ela morando em uma pequena casa nessa vila, trabalhando em algum emprego simples, vivendo uma vida pacifica e feliz, talvez poderia até terminar a escola e entrar em uma faculdade. Seu peito apertava ao pensar que todos esses pensamentos nunca passariam de um sonho. Se apoiando na banheira, ela tenta levantar sem sentir tanta dor, quando finalmente consegue ficar de pé, encara seu reflexo nu no espelho. Os grandes borrões roxos conseguiam assustar qualquer um, sem a maquiagem as marcas vermelhas no pescoço davam sinais de melhora, com cuidado ela passa uma pomada para aliviar a dor e toma os analgésicos.

Seu corpo estava muito frágil, mas a dor não incomodava tanto quanto antes, ela aprendeu a suportar com o passar dos anos. Sentia nojo ao olhar para seu corpo em um espelho, as cicatrizes espalhadas pela pele lhe davam mal-estar apenas de olhar, as memorias de cada ferida ainda atormentavam seus pensamentos, se confortava agora por saber que tinha conseguido fugir de toda essa dor, não se permitiria sentir pena de si mesma, na verdade queria ter forças para encarar aquilo tudo como passado.

Seu padrasto esteve na vida de Luna desde seus 6 anos de idade, no começo ele parecia alguém calado e indiferente a ela, mas com o passar do tempo, as brigas caóticas entre ele e sua mãe começaram, não demorou muito tempo pra que ele batesse nela, e logo Luna virou seu alvo também. Aos seus 8 anos, sua mãe fugiu e a deixou com ele, a presença dela parecia incomoda-lo de algum jeito. Ele constantemente se via irritado com ela por motivo algum, parecia apenas gostar de puni-la, as surras, no começo, não eram algo tão sério, mas parecia uma forma de castigar uma criança levada, mesmo com ela tentando sempre o agradar. Mas foi então que ela começou a perceber que ele sentia prazer em puni-la, gostava de descontar suas frustações nela, ele a maltratava por puro prazer, e então as "leves surras" se tornaram sessões de espancamento constante.

Quando completou 14 anos ela foi abusada por ele pela primeira vez, ela conseguia lembrar perfeitamente cada detalhe daquele dia, a dor que sentiu tanto física quanto emocional, nunca iria sair de sua memória, mesmo que quisesse. Sua vida foi marcada por cada chute e cada abuso, em seu corpo carregava as marcas daquele ódio lascivo que seu padrasto sentia por ela. Ele fez questão de que ela não conseguisse meios de escapar de suas garras nunca, a tirou da escola assim que sua mãe foi embora, a trancou em casa e fez dela sua prisioneira, ela já tinha perdido todas as esperanças de um dia conseguir fugir e ter uma vida melhor, mas então ela descobriu que estava gravida, tentou esconder com todas suas forças, montou um plano e fugiria para bem longe onde ela criaria sua própria família, apenas ela e o bebe, a esperança e os sonhos que um dia teve voltaram para sua mente quando descobriu a gravidez, o sonho de ter sua própria família para amar e cuidar, parecia a um passo de ser verdade, porém, seu padrasto descobriu tudo, bateu nela ate que perdesse a criança, a torturou para nunca pensar em fugir novamente.

Mas algo tinha mudado nela depois da perda, algo dentro dela quebrou de vez depois disso, o tempo não parecia passar mais como antes, sua mente não conseguia pensar em nada além de fugir, não pra começar outra vida, ou tentar ter uma vida comum, ela sabia que ele iria atrás dela aonde fosse, sabia que pra ela não tinha outra opção, então encontrou o número de seu pai nas coisas de sua mãe que ainda restavam, e decidiu que iria pra longe, qualquer lugar calmo onde passaria seus últimos dias feliz e no dia de seu aniversário iria colocar um fim em tudo para finalmente descansar em paz junto com sua única família, o seu bebe.

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