Iraci sentiu a vibração da ligação no bolso da calça de brim, porém, se movesse a mão para trás seus dedos esbarrariam nas partes baixas do homem que a empurrava para fora do ônibus, rumo ao destino final, deixou-o tocar enviando a vibração por todo seu traseiro e seguiu o curso do empurra-empurra até bater os pés em um chão que não fosse de alumínio. Aquela altura quem fosse que a tivesse ligando, havia desistido.Veria aquilo depois, prometeu.
Durante todo o dia, tinha estado no calor sufocante, asfixiada no cheiro forte de fumaça e corpos suados, mas, apesar do rebuliço em seu estômago, desejava desesperadamente por comida, sentiu a névoa da tontura e cambaleou entrecruzando como podia os corpos no desembarque em um ciclo sem fim de movimento, férias no meio do ano sempre dava movimento em demasiado.
A estrutura do terminal era em arco longo e largo trazendo um abrigo bem vindo contra a chuva lá fora, houve movimento nas barraquinhas de salgados e doces que Iraci não teve vontade de enfrentar, em vez disso, ela cortou para fora da passarela de mármore, as gotas frias de chuva tamborilaram na pele, o tempo estava abafado, mas era uma chuva mediana, nem para deixar as roupas secas tampouco deixar ensopadas.
Ela atravessou a rua principal correndo e tomou de bom grado um lugar à mesa da lanchonetezinha que sempre marcava sua chegada, um lugar cinza de ladrilhos de mar até metade das paredes, a iluminação débil. Mas os lanches eram ótimos.
Deixou a mala de lado. Apenas uma bagagem, tinha roupas e pertences suficientes na casa de Edilene, sua mãe, e passou seu pedido para a moça que correu para atende-la.
A mulher colocou um prato com um salgado, uma lata de refrigerante e um copo na mesa.
Os hábitos alimentares dela eram melhores que aquilo, mas isso jamais evitou os escorregões na dieta e coisas do tipo.
"É só mais uma vez, e então paro de vez", pensou, arrancando e engolindo uma grande porção do salgado. Esse sempre havia sido o argumento, e seria até o fim da vida dela nessa terra.
O sabor era dos deuses. Sempre tinha tido essa impressão, em São Paulo as comidas eram boas, mas em Águas Santas eram ótimas.
Pagou sua refeição quando notou a chuva menos implacável, e achou seu rumo para a casa da mãe novamente em chão de alumínio.
O serviço de transporte de Água Santa era menos deteriorado, porém não bom. Afinal, algum transporte público no Brasil era bom? Ela duvidava.
Um ponto excelente em Águas Santas era que não precisava-se gastar tanto as solas dos sapatos para chegar de um ponto a outro, ali ainda haviam cavalos e carroças que eram muito mais aconselháveis para as ruas não pavimentadas, estreitas e esburacadas (sem falar que era uma artimanha turística), bicicletas também eram muito usadas. Iraci mesmo, havia sido criada no lombo de um cavalo tanto quanto no assento de uma moto em São Paulo, não podia dizer gostar mais de um do que de outro.
Como não tinha nenhum cavalo, ou bicicleta, caminhou por certas vias estreitas, enlameadas e esburacadas, com a chuva engrossando e afinando ocasionalmente o processo foi mais lento.
Fazendas exuberantes, com cercados matizados de branco puro e telhados de cores vivas deram lugar a um descampado incoveniente até mesmo para os sapatos esportivos e enfim um matagal que engolia tudo, exceto a estrada espremida lutando para existir naquele desleixo todo. Ela chegou em sua casa, a casa de sua mãe.
Edilene atravessou a porta velha e lascada trotando como uma criança recém versada na habilidade de andar e atirou os braços ao redor de Iraci em um abraço de aperto esmagador.
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O Caos entre Nós
Chick-LitIracema ama sua família demais, por isso, quando eles são ameaçados, ela se vê presa na companhia de um homem misterioso que ela acha que a vê simplesmente como uma aventura. Laerte sempre teve tudo o que queria, mas ao conhecer Iracema seu lado p...