Capítulo Oito: To live for the hope of it all
"Mas eu consigo nos ver perdidos nas memórias
Agosto se transformou em um instante no tempo
Porque isso nunca foi meu".
Conto minhas últimas moedas antes de as entregar para o motorista mal-humorado.
Talvez eu estivesse subestimando minhas finanças ao escolher ir para o trabalho de carro, mas hoje é sábado e, acredito eu, depois de uma semana exaustiva, talvez, mereça um pouquinho de mordomia.
Salto do táxi e caminho pela calçada a compartilhando com o tráfego desinteressado, entretanto quando passo pelas portas de vidro do salão, eu recebo a primeira lufada do ar condicionado, respiro fundo e sorrio. É refrescante a brisa que abraça meu corpo, o verão tem lá seus encantos, mas me faz suar, e isso não combina nem um pouco com as mulheres que desviam os olhares das revistas de moda/fofocas e me encaram de relance.
O salão está cheio, o sábado sempre reserva uma surpresa – será que irei receber uma ligação até o fim da noite? Será que o cara mais charmoso da boate irá piscar para mim? – Decerto, muita coisa pode acontecer em um sábado, principalmente pela noite, mas antes disso cabe a esse pequeno lugar, ao lado leste da cidade, a tarefa tecer uma magia.
— O que temos para mim hoje?
Rebecca sorriu, e buscou no robusto computador por minha agenda eletrônica, sua atenção parou em um nome específico.
— Lavagem e hidratação — ela murmurou. — Mas, a cliente ainda não chegou.
Reviro os olhos. Minha clientela já está estabelecida, logo não é sempre que pego clientes novos, confesso que eles não são meus favoritos, mas Janet faltou e acabou desfalcando a equipe. Me refúgio no fundo do salão, guardo minha bolsa no armário para funcionários, porém antes de afundar a Prada falsificada no escuro, pesco dela um pequeno papel.
A fotografia nela estampada já está ficando desgastada. O momento congelado pelo tempo expõe duas jovens apaixonadas, escondidas de olhos curiosos como um segredo perverso, mas o nosso amor era divino. Agora ela está noiva de outra pessoa, vivendo uma vida da qual nunca fui convidada a fazer parte. Respiro fundo e guardo o passado novamente na bolsa.
O meu sábado à noite nunca era saboreado por mistério, pelo contrário, eu sabia muito bem para onde iria após terminar um turno de cinco horas no Salão de Beleza Forbes. Quando retorno para a recepção, me deparo com uma cliente nova à minha espera. O nosso olhar se cruza, uma fagulha acesa em uma sala escura. É despretensioso, não há nada acontecendo.
— Srta. Pierce?
— Estou um pouco atrasada, porque tive problemas com o trânsito — ela não se desculpa, não há preocupações em exibir uma expressão penosa. O mundo que espere por ela, apenas.
— Pode me acompanhar?! — Mordo o lábio, e me esforço para ignorar a maneira presunçosa que a Srta. Pierce caminha atrás de mim.
O corpo delineado por um vestido vermelho-carmim, o decote suave, sapatos de salto e fechados, além da pose acentuada de uma mulher criada para fechar negócios – eu não sabia quais, mas decerto, havia uma aura magnética a envolvendo. Tenho vontade de detestá-la por chegar atrasada e ter dificultado um pouco o início do meu expediente, mas se eu tivesse uma aparência tão grandiosa, que beirava a arrogância, também faria o mundo esperar por mim.
A Srta. Pierce se acomodou na poltrona acoplada ao lavatório, minhas mãos trêmulas agarraram com delicadeza seus extensos e pomposos fios cacheados em castanho-chocolate, mesmo sem lavar eram tão macios quanto sentir o aspecto de uma nuvem. Ela se aconchegou no instante em que a água gelada alcançou suas madeixas. Eu me sentia como uma garotinha sortuda por ter tido a oportunidade de segurar a faixa da rainha do baile. A expressão dela suavizou, meus dedos ágeis tornaram o líquido do xampu em espuma.
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Folklore - Delena, Datherine, Kelena
Romance🌼 Procurei reunir nessa pequena coletânea de contos tudo o que me impedia de dormir a noite, o que me beliscava até me obrigar a levantar da cama, pegar o notebook e escrever até as três da manhã. 🌼 Aqui você vai encontrar narrativas variadas, co...