Lado a Lado ou Contra

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-Pronto! Consegui! - disse Ribeiro ao conectar a consola à televisão.

Virou-se para o melhor amigo para lhe dar o comando e não precisou nem de um segundo para se aperceber do vídeo de certa forma comprometedor aberto no telemóvel nas mãos do loiro.

Ribeiro não sabia o que havia de dizer ou fazer. Sentou-se ao pé do mais alto e tirou-lhe o telemóvel da mão.

-Desde quando? - foi a primeira pergunta com que Ribeiro se deparou. Valadares soou seco e até confuso.

-Aconteceu duas ou três vezes... Não é nada. Deixa isso... - Ribeiro estava a olhar para o ecrã da televisão, colorido pelas cores do jogo que pretendiam jogar antes.

-Estás a beijar o João! É o nosso melhor amigo! Como assim "não é nada"? - Valadares levantou um pouco a voz.

-Val! O que é que interessa? - Ribeiro estava nervoso. Também ele levantou a voz.

-Porque é que o beijas?

-Porque não beijaria? Dá-me uma razão que me impede de o fazer! - os dois corpos começavam a ficar tensos.
A janela do quarto estava um pouco aberta, deixando uma pequena aragem entrar.

-Tu não gostas dele! - Valadares cuspiu - Não estás apaixonado por ele!

-Ah, então tu gostas da Sónia... Certo. - aquela discussão seria demasiado dura para Ribeiro.

Valadares e Ribeiro não sabiam o que sentir.
Curiosamente, aquela seria a primeira discussão em toda aquela amizade que antes era bonita e agora limitava-se a um loop estranho entre a distância e a colisão quente entre os dois.

-Tu beijas o João por ciúmes? - Valadares perguntou diretamente.

-Quem é que está com ciúmes aqui?

Silêncio.

-Sim, eu tenho ciúmes, imensos! Mas isso nunca me fez impedir-te de viver! Ver-te todos os dias com ela destrói-me, não só porque sou apaixonado por ti, mas também porque eu vejo que não és feliz e ainda assim sujeitas-te àquilo... Todos os dias! E mesmo estando contra isso, eu nunca te impedi de ter a tua vida. Então não me impessas de viver a minha!

Silêncio de novo.
Valadares olhava para o mais velho, atónito. Abriu a boca várias vezes à procura das palavras certas, mas não as encontrou.

E aquele clima estava tão tenso que os dois rapazes só ouviram as suas mães chamarem quando elas gritaram pela segunda vez.

Ribeiro saiu do quarto, mudando a expressão. Precisava de pelo menos fingir para as mulheres.
Valadares suspirou antes de o seguir.

Sentaram-se em silêncio à espera que os seus pratos fossem cheios.
As mulheres sabiam que algo estava errado. Os rapazes evitavam olhar-se nos olhos e tudo o que disseram foi um mero "obrigado" quando as mulheres lhes serviram a comida.
Mesmo assim, não quiseram procurar o que se passava. Aos olhos delas, os seus filhos precisavam do seu espaço e já eram crescidos para se resolverem sozinhos. Joana e Sandra também esperavam que a amizade (ou fosse o que fosse aquilo que sentiam um pelo o outro) conseguisse superar aquelas caras amuadas que tinham.

Não houve qualquer palavra trocada durante a refeição. Custou a cada um dos presentes ficar em silêncio, mas se algum deles dissesse alguma coisa, instalaria-se um caos que metia medo às mulheres que se preocupavam cada vez mais com os seus meninos.

Quando todos pousaram os talheres juntos no prato, Ribeiro e Valadares olharam-se pela primeira vez desde que entraram na cozinha.

Os olhos deles carregavam dúvidas, lamentos e dor. Carregavam também saudades e, inevitavelmente, amor. No final de tudo, só doía porque era inevitável amarem o outro.

After SchoolOnde histórias criam vida. Descubra agora