Capítulo 03

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Caminhei pelo jardim banhado por água e inspirei o ar úmido que a Mãe Terra deixou para trás. Não fazia aulas de magia há dois dias e por isso tive a oportunidade de organizar minha mente, cacei algumas vezes coelhos e lebres que soltei na natureza logo depois. Me banhei no rio de Cinitra que ficava a pouca distância de Thalam a cavalo. Cuidei de meus potros que ocupavam o celeiro da corte e pude me distrair estudando mais sobre minha maldição e literatura élfica.

Atrás de Thalam ficava uma floresta, há muito tempo ela foi contida pelo Senhor, pois tinha as piores criaturas dos 5 reinos. Desde Hisii a Sluagh's.

Conseguia ouvir gritos de socorro vindo de lá quando me escondia de Seelie atrás dos limites da ultima aldeia, barulhos de pele sendo rasgadas e gritos de socorro, implorando perdão.

Ouvi os passos de Seelie esmagando a terra fofa por conta da chuva de dias atrás, ela estava me caçando para me forçar a repetir as aulas de etiquetas alegando que a nobreza não poderia ficar no esquecimento dessa matéria. Naquela altura do campeonato aquela elfa rechonchuda queria me dominar de qualquer maneira. Ela nem me considerava nobre. Estava farta daquela situação, há dias que Seelie estava no meu pé por nada.

Corri descalça sentindo a fofura da lama e serpenteei até o celeiro, não tive tempo de colocar a cela em Skar, minha égua mais eficiente e musculosa. Montei e cavalguei até o limite da pequena aldeia de Thalam, podia me esconder próximo a Floresta Proibida porque o cheiro podre que emanava de lá disfarçava o meu, e Seelie não conseguia me farejar.

Desde que parei as aulas de magia ela não tem me deixado em paz.

Saí de cima de Skar, que ficava agitada sempre que alcançava as proximidades daquele pedaço de terra sem dono. Respirei fundo e xinguei a mim mesma, o ar era podre e denso, dava para observar a magia que prendia as criaturas naquele lugar. Me sentei ao lado de minha égua que aguardava obedientemente e fechei os olhos aproveitando o raro silêncio por aquelas bandas.

"Menina doce..." abri os olhos assustada, não era a voz de Seelie, na verdade, era mais aconchegante, um mesclado de tudo e todas as coisas que tranquilizava minha alma por inteiro. Olhei ao redor e não tinha ninguém e acredito que cavalos não evoluíram ao ponto de poder soltar a língua, não ainda.

"Chegue mais perto, para que eu possa te ver." Verifiquei novamente, nada. Minhas sobrancelhas se juntaram, inspirei fundo afim de localizar alguém, talvez uma presença que Skar não conseguiu notar, mas não sentia nada além do cheiro podre que ficou mais forte, algo tentava se soltar, a floresta. "Tens os olhos de purpura, olhos de sua mãe" Prendi a respiração.

Não pude conter minha curiosidade, cheguei mais perto do paredão invisível que cintilava um arco-irís sutilmente. "Escondem de você um segredo, venha até mim, me deixe lhe mostrar" meu coração palpitou e a curiosidade se aflorou pelo meu corpo, a descarga de adrenalina foi tão intensa que minha pele estremeceu. "Venha, menina. Sua mãe daqui te espera e te observa"

- Mamãe? É você?! – me desesperei. Não me recordava de sua voz, poderia ser ela do outro lado, o Senhor deve ter a prendido lá sem querer, junto com outras criaturas que, junto com a podridão e tristeza. Me aproximei mais em desespero. Minha mente entrou em devaneio, tinha tantas perguntas. Mas tinha mais esperanças, esperanças de poder sentir novamente o calor de seu corpo contra o meu, seu cheiro de lavanda que perfumava cada lugar que ela passava, seu colo macio e confortável. Tinha esperanças de que de fato possa ser minha mãe, de que ela estava lá o tempo todo pronta para ser salva da imensidão melancólica da floresta, lutando pela própria sobrevivência, tendo que conviver com bestas.

Abri meus olhos e senti a adaga que ganhei de presente de Bryn pesar sobre minha coxa, onde ficava meu boldrié de couro. Vivo em paz, mas ainda sou uma élfa, conheço muito bem os meus.

Uma descarga de adrenalina me impulsionou para frente, já estava correndo floresta adentro e não conseguia frear meus pés. Entrei sentindo um mesclado de metal e enxofre por toda a parte, o silêncio se fez presente e a floresta melancólica estava vazia, infeliz e fria. Os galhos choram e as cores da natureza élficas se esvaíram, assim como a voz de minha mãe. Entrei, mas como? Nenhum ser entra ou sai da Floresta Proibida, nem se quisessem, pois, a magia de Vosso Senhor prendia tudo que era maligno ali dentro. Era uma fortaleza que beneficiava os dois lados; humanos que tentavam se aventurar por aquelas bandas a fim de nos caçar eram estripados antes de dar seu primeiro suspiro nas profundezas das florestas, virando comida e nós nos aproveitamos da proteção que os seres bestiais nos ofereciam sem perceber, pois, também não tinham acesso para nos atacar.

Ofeguei e apoiei minhas mãos em meus joelhos que doíam feito o Caldeirão por conta da brisa gelada que cortava minha pele como pequenos caquinhos de vidro, até respirar virou um desafio, mas consegui me adaptar com a podridão e chamei minha mãe, vim salvá-la.

"Tola..." Ouvi os galhos rangerem e direcionei minha cabeça para cima tentando enxergar o vulto que pulava graciosamente de arvore em arvore. "Será um prazer me deleitar com seu sangue e me deliciar dos seus órgãos" mais um vulto, círculo a área afim de detectar a fera. Nada. "Os humanos já estavam me entediando, agora tenho algo para degustar, te agradeço, menininha"

Liberta-me - Em revisãoOnde histórias criam vida. Descubra agora