Capítulo 2

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- Dole três, vendida! - Disseram Henrique e Fernando juntos quando perceberam que ninguém ofereceria um lance mais alto. Seus olhos brilhavam e seus sorrisos de satisfação eram tenebrosos, nem existia mais a possibilidade se ser escondido.

Me levam para fora do palco, minha única mala já estava pronta na porta do camarim. Respiro fundo ao entrar novamente naquela sala e olhar para o espelho. Algumas lágrimas rebeldes insistiam em cair, era involuntário. Estava na hora, não tinha mais como fugir, não existe chance de escape.

O inferno tinha começado.

Henrique aparece na porta do camarim sorrindo de forma vitoriosa, tendo ao lado Fernando que comemorava com um talão de cheque nas mãos. Eles riam e cantavam enquanto eu os olhava com desprezo, mas ainda sim muito medo do que estava por vir.

- 500 mil, quem diria que alguém seria capaz de pagar um valor tão alto por uma aberração? - Ele dizia rindo e chegando perto de mim. - Sabe Marília, se eu soubesse que você renderia tanto dinheiro teria rezado para que tivessem trazido você antes...

Em um lapso de insanidade e um pingo de coragem, cuspo em seu rosto sabendo que não poderia fazer nada comigo já que comprometeria sua venda. Seu olhar era furioso e sua mão já estava sendo levantada para mim quando um homem, aparentando ter seus cinquenta e poucos anos, apareceu na porta.

- Com licença, meu nome é Carlos e vim buscar a senhorita Marília para irmos. - Dizia em um tom amigável e com um sorriso sincero nos lábios. Pela primeira vez, durante todos esses dias que passei nesse lugar, me senti bem e sem total medo. A insegurança ainda estava sendo um problema, a incerteza do que viria a seguir me causava arrepios, mas agora era só levantar a cabeça e enfrentar.

Passo por Fernando ainda em meu lapso de sanidade e empurro forte seu ombro indo em direção ao gentil senhor que me aguardava. Saio pela porta e o acompanho até o lado de fora do enorme teatro. "O que será que te espera? Algum dia você vai precisar de terapia, minha filha. Será que é uma pessoa ruim? "  - Todos esses pensamentos rondavam a minha cabeça durante o percurso.

Agora o que me bastava era aguardar para descobrir o que o destino tinha preparado para mim.

Pov Maiara:

Ser uma mulher de negócios não é fácil. Ser dona de uma empresa multimilionária com apenas 26 anos, é menos ainda. Quem sou eu? Maiara Carla Henrique Pereira, a mais jovem dona da maior empresa de marketing e comunicações de toda a América, com filiais espalhadas por todo o mundo. Amo festas e baladas, não me apego a ninguém. Brincar com o coração dos homens e mulheres que vem até mim é o meu passatempo favorito.

Era mais um dia comum na minha vida, mais um evento beneficente que eu precisava ir. Já escurecia quando comecei a me preparar. Um banho relaxante e um bom vinho eram essenciais para me ajudar a superar a chatisse que seria esse evento. Afinal, como ser interessante um local com um monte de homens velhos, acompanhados de suas esposas praticamente mudas já que só falam em como ser fúteis e itens de decoração muito cafonas? É impossível um leilão ser interessante.

[...]

Ao saltar do carro o enorme tapete vermelho já estava estendido até a entrada. Vários fotógrafos e jornalistas se empenhavam para capturar o flash perfeito. Meu vestido preto arrastava sua calda de sereia por toda a extensão, meus cabelos ruivos com as ondas por todo ele, caiam como cascata por minhas costas. A Maiara poderosa tinha chego e infeliz aquele que perturbar seu caminho.

Ao meu lado entrava Maraísa, minha companheira, a pessoa que me fazia suportar esses eventos, minha irmã.
Entramos pelas grandes portes e já fomos direcionadas a uma mesa mais ao fundo junto com um outro casal, velhos amigos.

Os petiscos e bebidas eram servidos em grande quantidade por todo o salão. Passado um tempo e todos já no local e devidamente acomodados, o leilão começou. Peças de luxo, mas cafonas, eu nunca compraria qualquer coisa daquelas. Até que em um rompante me assusto com um lance feito por Maraísa em um quadro, o que me assustou e me trouxe a atenção de volta para a situação.

Se passaram longas uma hora até o final, estávamos a espera do último item da noite. Eu só queria ir pra casa.

Aqueles cabelos loiros. Aquele vestido. Aquela mulher.

A loira era levada até o centro do palco, e o anfitrião da noite a apresentava como o último item da noite. "Como uma pessoa pode ser leiloada como um objeto?" - Esse era o único questionamento que pairava em minha cabeça. Começo a prestar bastante atenção em cada detalhe, afinal, dizem que sou muito observadora.

Sua expressão de medo e pavor eram evidentes a cada vez que um lance era feito, era possível perceber que a mulher se encolhia timidamente cada vez que alguém gritava um valor mais alto. Algo me dizia que ela não estava ali por vontade própria. Era uma moça muito bonita, e suas características únicas a tornavam ainda mais especial, afinal, não é tão comum encontrar pessoas virgens na idade dela e muito menos interssexuais.

Escuto a voz dele, Roberto, o maior rival que eu poderia ter. Uma voz era inconfundível, ele deu o maior lance, por algum motivo eu não poderia deixar que ele a levasse. Levantei minha placa ao final da contagem.

- Eu pago 500 mil... - E então a regressiva finalizou. Ela era minha. Não sei o que faria com isso, mas com certeza me deixava mais tranquila do que saber que ela poderia estar nas mãos daqueles velhos.

- Maiara, não é possível, 500 mil? Você entende o que é isso? - Maraísa me indagava enquanto eu assinava o talão de cheques.

- Metade, já está feito. Você viu o olhar de pavor dela. Sei lá, não consigo explicar o que aconteceu. - Suspiro levando em conta as perguntas da Maraísa, mas era verdade, quando percebi eu já tinha feito aquele lance.

Após cumprimentar as todos, volto para meu carro enquanto Carlos iria buscar a "minha garota", ok ok isso é estranho. Me sento no banco de trás da minha Range Rover preta e espero ele voltar. Estava nervosa, Maraísa falava várias coisas e eu não conseguia prestar atenção em nenhuma.

"O que eu tinha acabado de fazer?" - Me perguntava com frequência. Eram em poucos momentos que alguém me via na dúvida ou fragilizada.

A porta do carro se abriu, ela entrou e por um momento meu corpo soava frio, meu coração parecia que ia falhar. Eu tinha comprado aquela mulher.

- Boa noite, sou a Marília, seu novo brinquedo. - Ela dizia com um sorriso triste nos lábios e um tom de voz cabisbaixo. Respiro fundo e olho para ela.

- Você não faz ideia do quanto eu gosto de brincar... - Digo olhando para ela e assumindo a personalidade que todos conheciam.

Um leilão diferenteOnde histórias criam vida. Descubra agora