3 - De volta pra casa

59 10 70
                                    

Miley

Evoluir, crescer como pessoa e fazer boas escolhas não significam nada quando aqueles que te cercam preferem levar em consideração apenas seus erros, não importa quantas vezes você acerte ou ceda às suas próprias vontades.

Eu poderia ganhar um Prêmio Nobel da Paz e ainda assim seria vista como a ex-viciada que precisa ser supervisionada.

Tenho minha vida definida por um erro.

*
Um dia antes na Mansão Miller

- Noah, cuidado! - tento avisar, mas seu envolvimento com a música da playlist animada que ela escolheu e colocou no último volume, não deixou que minha voz chegasse aos seus ouvidos. Seu braço esbarrou na tigela com a mistura para brownie, ou algo perto disso, que estava sobre a pia, e a massa se esparramou inteira pelo piso da cozinha, que antes de nós estava tão limpa quanto uma nota "Si Maior" capaz de estourar taças.

Trocamos um olhar travesso semelhante ao das crianças arteiras que fomos um dia e caímos na risada.

Noah chegou de viagem tem uma semana. Terminou o curso preparatório que estava fazendo na Suíça e voltou ansiosa por um descanso merecido após anos trabalhosos estudando fora. Desde o último ano do fundamental pulando de colégio interno para colégio interno sempre que nossos pais concordavam que a atual instituição era liberal de mais para uma garota menor de idade morando fora sozinha - como se ela estar sozinha não fosse culpa deles.

Sempre duvidei dos motivos que fizeram meus pais tomarem essa decisão tão radical a respeito da filha caçula, enviando-a para outro continente somente pela educação, a única mandada para tão longe por tanto tempo. Nenhum de nós - os filhos mais velhos - passou por algo parecido; o máximo foi passar um ou dois anos nos EUA para aperfeiçoar o idioma enquanto cursava o fundamental, como Trace e eu, ou o ensino médio, como Brandi e Braison. Embora nunca admitam o verdadeiro motivo, eu sei o porquê: não queriam que mais uma filha desse errado; não podiam correr o risco de minhas escolhas afetarem o senso crítico em formação de Noah.

Não vejo Noah desde o Natal; estamos em Julho agora. Ela veio nos visitar para as festas e não passou mais que uma semana aqui. Segundo nossa mãe, era importante que voltasse ao colégio interno para acompanhar as cerimônias de encerramento, porque foi escolhida como oradora de turma - escolhida não, honrada - e não podia fazer desfeita.

Me admira que, depois de seis meses, Noah queira passar o dia comigo para que eu tente recriar a receita do Brownie que fazia quando éramos adolescentes "ingênuas". Não tinha maconha e nenhum tipo de entorpecente no brownie que eu dava pra ela; sinceramente, era horrível, não faço ideia do porquê ela gostava.

Pedimos licença a Cíntia - responsável pela cozinha da mansão - e tomamos o lugar, que em poucos minutos se transformou em uma zona de guerra. Há mais farinha nos cabelos pretos de Noah do que em qualquer outro lugar. Colocamos uma música e a destrambelhada não consegue dançar sem esbarrar em alguma coisa. Os aventais que usamos de alguma forma não serviram para nada. As portas da geladeira estão abertas como se fôssemos usar tudo que tem lá dentro. O forno está pré-aquecendo há mais de 15 minutos, o balcão/ilha no centro está coberto por cascas de ovos, farinha de trigo, chocolate, leite condensado (que tenho quase certeza que não vai na receita) e bandejas que foram untadas por Noah apenas com manteiga.

- Eu sei que você sabe, Mana - peço à Alexa para baixar o som da música e continuo - Mas eu tenho que dizer - me esforço para recuperar o fôlego em meio a crise de risos - Não tenho ideia do que estamos fazendo; sempre que fiz brownie estava chapada.

Independe: "Foi escrito com marcador permanente, então é para sempre!"Onde histórias criam vida. Descubra agora