capítulo 2

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O NASCIMENTO, MORTE (E RESSURREIÇÃO?) DE SLIM SHADY

Eu morava em um lugar de merda na Fairport do lado da 7 Mile quando Proof me ligou. Ele disse, "Quero reunir os 12 melhores mcs de Detroit e fazer o nosso proprio Wu-Tang Clan". Ele queria 12 rappers porque queria nomear o grupo de Dirty Dozen.

Mas só conseguimos seis. Mas ai Proof apareceu com a ideia de que cada um de nós teria um alter-ego. Cada um seria uma outra pessoa, só assim teríamos 12 fortes mcs. Esse é um dos momentos mais importantes de Proof na minha vida, pois foi dai que surgiu o Slim Shady. Proof não me ajudou a chegar no nome, mas me ajudou a tornar algo real.

O nome surgiu quando eu estava na privada. Literalmente falando. Eu estava fazendo cocô e o nome apareceu. Você sabe, pensamos muito quando estamos no banheiro. Sempre que entro no banheiro levo comigo uma caneta e papel.

Quando pensei no nome Slim Shady, comecei a pensar em um milhão de rimas possíveis para o nome. Esse foi o ponto decisivo. Eu queria que esse alter-ego fizesse algo alem de chocar as pessoas do rap. Eu não queria só chocar as pessoas, parte também era um desabafo. Como se eu estivesse puto com o mundo.

Olhando o inicio da minha carreira hoje, eu me vejo na Tv e penso "Por que eu estava tão nervoso o tempo todo?". Eu tinha raiva toda hora. Era quase uma piada. Eu praticamente me sentia como se fosse o Madd Rapper.

Parte disso era que as pessoas passaram a se referir a mim como se eu tivesse surgido de um estacionamento de trailer. Eu fui junto, porque me identificava com aquilo... Eu digo, eu era basicamente um lixo branco e pobre. E se fosse assim que eu iria ser rotulado, então vamos fazer jus a coisa. Eu pensei "foda-se, vou entrar nessa".

Outro conceito que Proof tinha era que todo nós tínhamos que rimar da forma mais doentia e ridícula. Essa era a ideia original por trás do D12. Tipo o Bizarre que rima sobre transar com pit bull ou chihuahua, estuprar a avó dele...

Todos desenvolvemos dali nosso próprio estilo. Não imitamos o Bizarre - todos queríamos soar diferente - mas rimávamos sobre a coisa que mais achávamos chocante. Se uma pessoa qualquer sentasse e escutasse o que dizíamos ela pensaria "que porra é essa que eles estão falando?".

Mas eu não queria dizer coisas loucas apenas por dizer. Se fosse fazer, eu tinha que demonstrar algum talento lírico com isso. Eu queria ser um tipo de acrobata lírico, as sílabas tinham que se conectar e fazer sentido. Em "Just Don't Give a Fuck" eu digo "Não me julgue por uma piada, eu não sou um comediante". Logo em seguida eu digo que estuprei o time feminino de natação.

Eu me lembro da primeira vez que me apresentei como Shady. Eu fiz um show em Detroit em uma casa chamada The Phat House, por volta dos anos 96 ou 97. Eu me apresentava junto com Bizarre e Bugz, outro membro do D12. Era só rima, mas rima com aquele tipo de humor característico de Slim Shady. Eu apresentei "Low, Down, Dirty", "Just dont give a fuck", e talvez mais outro som.

Slim Shady não era somente uma forma de composição, mas era um poder retrucar com estilo. Como Shady eu tinha toda uma voz diferente, e foi assim que descobri que essa seria uma pessoa parte de mim.
Quando eu ouço as músicas hoje eu penso, "por que eu soava assim?" aquele tom agudo de merda que não tendo ideia da onde saiu aquilo. Talvez tenha vindo da zuação com os caras, imitando os amigos, e de alguma forma começei a rimar assim. Se você ouvir o primeiro álbum, "Infinite" e depois ouvir "The Slim Shady EP", você vai perceber os dois estilos completamente diferentes.

Uma vez que as pessoas ouviam o Shady, eles não queriam o Marshall ou o Eminem mais. "I've created a monster, because nobody wants to see Marshall no more. They Want Shady. I'm chopper liver". Eu digo isso em "Without me". Mas eu não sou um aproveitador. Eu sou a melhor coisa que ja existiu. Vamos exclarecer isso para começo de conversa. [brincando]

Poder rimar como uma pessoa completamente diferente era ótimo. Proof costumava descrever assim: "Slim shady é o cara que aparece depois de umas doses de Bacardi; Eminem é o mc que vai ao palco sóbrio e solta suas metáforas. Slim Shady fica bêbado e quer brigar".

Era ótimo ter alguém em quem culpar. "Eu não disse isso, foi o Slim Shady". Essa desculpa nem sempre funciona no mundo real - na vida real se você vive assim as pessoas vão te chamar de louco. Rap é uma grande Ilha da Fantasia - é o local onde sempre vou quando as coisas na vida real ficam muito difíceis.

Eu me lembro de assistir "Animal House" quando criança. Adorava aquilo. A lembrança mais nitida que tenho era o demônio em um ombro e o anjo no outro. Esse cara ta no quarto com uma garota desmaiada de bêbada, e o demônio aparece em seu ombro e fica "Fode ela! Fode ela toda!" E ai aparece o anjo e fica "Tome vergonha! Se você encostar um dedo nessa pobre, linda e inocente garota...". É esse o tipo de relacionamento entre Eminem e Slim Shady.

Dre entendeu onde eu queria chegar com aquilo. Ele disse "E se fizermos uma música onde eu sou o bom moço e você o cara mau? Você é o cara doido e doente que fugiu do hospício". No inicio de carreira eu estava menos exposto, então topava tudo. Essa foi a base do Slim Shady LP - explorar o mal ouvindo o bom gritar em meu ouvido também.

Quando estávamos fazendo o nosso primeiro álbum juntos, Dre dizia, "Temos o álbum, só falta a imagem". Mas eu nunca imaginei como o Slim Shady seria. Até que um dia, eu estava sob efeito de ecstasy, e andando na rua com Royce. Nós entramos em uma farmácia e compramos um litro de agua oxigenada. Eu tinha engolido duas pílulas de ecstasy - tava doidaço! No dia seguinte eu tinha esquecido de tudo o que fiz e olhei no espelho. Era tipo, duas da tarde e eu "Puta merda!!!" eu parecia um gambá - nem tinha ideia do que fiz com aquele litro.

Dai fui para o estúdio com esse cabelo loiro novíssimo e camisa branca - era tudo o que usava na época - Dre, em silêncio total, olhou para mim intrigado. Depois lembro dele dizer "É isso! Achamos sua imagem!". Jimmy Iovine veio ao estúdio para ver o que Dre queria e também entrou na onda dele. "Essa é sua imagem. Essa é a identidade que estávamos procurando esse tempo todo".

EU NÃO PENSEI QUE DESCOLORIR O CABELO SERIA MEU NOVO LOOK; EU SÓ ESTAVA SENDO BURRO USANDO DROGAS.

A linha que separa Slim Shady do Eminem é muito fina. Onde termina o Shady e começa o Eminem? Acho que meus fãs sabem bem diferenciar quem é um do outro.

Ainda há um terceiro ponto: Onde está o Slim Shady, onde entra o Eminem, onde começa o Marshall? Vamos dizer "Just Dont give a fuck" é Slim Shady. Eminem é "Lose yourself" e "Mockingbird" é Marshall. Acho que esses são os exemplos mais gritantes que posso dar.

Eu usava o Slim Shady como uma desculpa para soltar a minha raiva, e costumava dizer que Eminem tinha mais lirismo, letras mais trabalhadas. E Marshall era o cara sincero e sem brincadeiras. Mas hoje vejo que estão balanceados, não são mais extremos, um não está longe do outro. Slim, Em e Marshall estão misturados e podem ser vistos nas minha composições de hoje. Achei um jeito de misturar tudo e te-los todos juntos.

Todos nós temos um Slim Shady dentro de nós. "Guess there's a Slim Shady in all of us. Fuck it, let's all stand up". Tem momentos em que todos nós somos imbecis e espertalhões. O segredo é que, os adultos espertos sabem como disfarçar ou reprimir esse cara. Eu estou melhor nisso hoje.

Eventualmente Slim Shady se tornou uma metáfora da pressão da fama para mim. Por exemplo na música "when i'm gone" eu digo "Shady made me/But tonight shady's rock-a-bye baby". E o refrão vai 'Whan I'm gone/Just carry on/Don't mourn/Rejoice every time you hear the sound of my voice". Basicamente eu estava dizendo, não quero mais essa vida. Eu gosto de ter o Slim Shady por perto, mas ele se tornou tão famoso que quase destruiu a minha família.

ENTÃO EU MATEI O SLIM SHADY. ELE TEM ESTADO MORTO NOS ÚLTIMOS ANOS. EU NA MINHA. CRIANDO AS MINHAS FILHAS. VENDO O RAP IR PARA O LIXO.

Minha fama ainda está presente. Essa é a minha realidade, e é um pouco trágico. Não que esteja procurando pessoas para sentir pena de mim - eu posso chorar sozinho. (Slim sempre me bate na cabeça e grita CALA A BOCA quando eu choro).

As pessoas se perguntam se vou reviver Shady para o meu próximo álbum. Bem, eu suponho que enquanto eu exista, o Shady também está aqui.

The Way I AmOnde histórias criam vida. Descubra agora