Capítulo 4

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Pov. Pérola

Desde quando nos mudamos, os dias passaram voando. Tentei me concentrar mais em procurar algum trabalho, principalmente porque estava quase perdendo as estribeiras por ter que voltar a ser sustentada por alguém — ainda mais esse "alguém" sendo o meu pai. Mandei currículo para muitos lugares do Brasil, mesmo que o fuso horário fosse um grande problema. Infelizmente nenhum chegou a me responder, mas eu ainda não havia desistido.

Hoje era o dia que eu levaria meu irmão para o seu primeiro dia na escola. Ouvi tantas reclamações de Júlio sobre "como ele odiava ser tratado como uma criança" antes de sairmos de casa que só consegui fazer ele ficar quieto quando passamos o quinto quarteirão. Sabia que essa reclamação não era por isso, e sim porque o meu pequeno estava com medo de ir à escola.

Ao chegarmos na porta da escola, agarrei sua mão e fingi estarmos andando de mãos dadas, chamando a atenção de alguns estudantes próximos a porta. Júlio largou tão rápido a minha mão, quase batendo nela.

— Eu já tive que aceitar usar esse uniforme ridículo e vir andando com você. Pegar na mão é demais! — Resmungou. Suas bochechinhas estavam tão vermelhas de vergonha que ele mal conseguia perceber pelo estresse.

— O que tem o uniforme? — Na Coreia do Sul os uniformes tinham o mesmo estilo dos que apareciam nas novelas mexicanas (foi a única coisa que consegui pensar na hora que vi meu irmão saindo do quarto de manhã). Era algo misturado com roupas sociais e confortáveis também. A cor da escola era azul, a minha preferida, então eu realmente tinha gostado do look.— Eu acho fofinho.

— Pérola... — disse, fazendo um beicinho.

— Olha só — falei me afastando devagar enquanto acenava —, estou indo embora!

Fingi andar em câmera lenta, fazendo meu irmão rir disfarçadamente.

— Você é ridícula! — murmurou.

— Eu faço tudo para ver você feliz — respondi de forma dramática. — Que horas você sai mesmo? Tenho que me programar para vir e...

— Não!!! — Interrompeu-me desesperado. — Eu volto sozinho!

— Júlio, eu prometi ao papai que ia levar e buscar você na escola!

— Eu sei ir pra casa... Por favor, Pérola!

— Então me liga quando estiver saindo daqui.

Júlio abriu um sorriso tão largo e me alcançou para me abraçar. Aquilo me fez ficar com dó de deixá-lo entrar. Depois de um longo abraço e muitos estudantes nos encarando com estranheza, meu irmão entrou na escola e eu segui meu caminho até a Universidade de Seul.

Quando comecei a estudar coreano, fiquei me perguntando se um dia seria capaz de conseguir seguir a área de línguas. A criação de jogos sempre foi algo presente pra mim, então realmente pensei que não iria conseguir a bolsa de estudos que prestei para a área de língua e literatura. Foi uma surpresa pra mim e para o meu pai também quando abri o e-mail e lemos juntos.

As minhas notas sempre foram ótimas e o meu ciclo social era até que reduzido, principalmente quando o assunto era garotas. Não suportava nenhuma conversa que se limitava a meninos; parecia que ninguém tinha uma vida fora de um relacionamento e isso era problemático demais para engolir. A única amizade que sobreviveu com o tempo foi a de Daniela, uma grande amiga da faculdade que acompanhou todas as minhas fases pós-formatura.

Dani era aquele tipo de mulher que não segurava a língua quando era necessário e foi por isso que eu gostei dela desde o início. Tinham tantas pessoas sem noção naquele lugar que não teve se quer uma vez que Dani não tenha feito um comentário certeiro. Hoje ela mora no Canadá, depois de pegar uma proposta legal em design. Depois dela, fiz amizades dentro do trabalho, mas era uma coisa mais profissional do que íntima. Eu com certeza não chamaria meus amigos do trabalho para ir à balada, por exemplo.

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