Sex with a Ghost

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Enquanto o professor Welles explicava pela milésima vez que ser roteirista não tem nada a ver com ser um bom cineasta e que era um trabalho assíduo, puramente técnico e desvalorizado, eu mexia no cordão-amuleto de "elmo do terror" que eu recebi na tarde de sábado como uma criança com um brinquedo que não gosta tanto, mas era o que os pais haviam trazido para distraí-la. Estou tentando ignorar minha crise existencial, até porque eu ainda tenho mais um teste a fazer...

– Boa tarde, gente – meus devaneios são cortados por uma aparição que eu nunca vi na vida, de pé ao lado do professor, em frente de toda a classe, chamando nossa atenção – Como alguns de vocês já devem ter visto pelas redes, a Hexside vai sediar sua primeira Mostra Artística e Cultural, motivada pela nova direção do curso de Artes Visuais.

Eu não estava sabendo disso, obviamente. Minha ambição morreu a muito tempo e eu parei de procurar onde expor meus projetos, ou de fazer esforço mínimo para criar uma "network", importantíssima para quem quer trabalhar nessa indústria. Fora todo o lance de não tenho amigos que comentariam comigo sobre o assunto. Mas quando esse garoto falou a palavra "Hexside", minha atenção era toda dele.

– E eu vim aqui, comunicar pessoalmente que, graças ao professor Welles, nós vamos poder incluir um cineclube ao evento, com a ajuda de vocês.

– Aos interessados, eu concederei crédito extra para quem submeter seu projeto. Deve ser um curta de no máximo vinte minutos. Vocês podem me entregar o roteiro junto com a descrição dos personagens principais, espaço ideais das locações e, se houver, uma lista de peças importantes para produção, tais como carros, figurinos muito específicos, e similares, até esta sexta-feira. Alguns vão ser selecionados para serem produzidos e integrarem o cineclube. Peço que considerem a oportunidade, já que uma conquista dessas é excelente para o portfólio dos senhores e vão haver convidados da elite artística de Connecticut no evento, tais como professores de Yale.

­– O cineclube é em parceria com os alunos de Teatro de Hexside. O evento será apenas sediado na Universidade, mas ele é aberto a todos. Inclusive, se algum de vocês ou alguém que conhecem, também pintar, esculpir, escrever, ou trabalhe com qualquer manifestação artística, podem mandar um e-mail para a coordenação do curso com seu projeto e ele será analisado para exposição. Vou deixar um panfleto no quadro de avisos, mas qualquer dúvida, só mandar mensagem para esse contato aqui.

O garoto escreve um número no quadro e, após de despedir do professor, se retira. A conversa paralela era ensurdecedora. Não vou mentir, também estou animada, só não tenho com quem comentar mesmo. Não apenas porque eu precisava desesperadamente de crédito extra – já ficou claro que eu, como uma ironia do destino, odeio essa aula, não é? – Mas porque seria muito fácil conseguir tal crédito dessa forma.

Eu escrevo histórias desde que me entendo por gente. Também ficou claro que eu vivo no meu mundo de fantasias, imaginá-lo do zero é a melhor parte. Agora, uma história que tenha no máximo vinte minutos e que não envolva uma puta equipe de CGI para dar vida às minhas criaturas, as opções ficam um tanto limitadas. Mas deve haver alguma. E de bônus: Hexside. Amity. Ok, isso pareceu menos obsessivo na minha mente.

Preciso apenas de alguns minutos no meu laptop antes da aula acabar para encontrar a história perfeita. Um romance idiota que escrevi após uma desilusão amorosa. Não precisa de quase nenhum recurso. Originalmente era para ser uma animação, mas acho que vai funcionar. Eu aprendi na marra que em eventos assim, os projetos mais simples tendem a ser escolhidos, por exigirem menos verba.

A turma foi dispensada e a nuvem de alunos que se forma ao redor da mesa do professor Welles assemelha-se à uma roda-punk. Infelizmente, estou inclusa nessa. Aos poucos, as pessoas vão dispersando, sobrando apenas eu e alguns puxas-saco, que também já tinham projetos prontos para entrega como se já soubessem de tudo há séculos. Odeio eles, mas aqui estou eu, junto deles.

O Livro das Sombras [AU Lumity]Onde histórias criam vida. Descubra agora