SOBRE AS SELECIONADAS

42 5 89
                                    

EM HIPÓTESE ALGUMA
tente convencer uma das selecionadas a pintar o cabelo de rosa claro.
▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬▬

NÃO PRECISO nem falar que o caminho inteiro da volta ao castelo foi preenchido com uma bronca, né? A dupla sertaneja me repreendeu dizendo que eu acabaria atrapalhando o cronograma da rainha e que para alguém tão contra o discurso, como eu fui, não era de se esperar que eu ficasse por mais de meia hora no palco interagindo com o público. Tudo bem, eu admito que fui meio hipócrita, mas eles estavam se divertindo tanto! E qualquer oportunidade de irritar a rainha não pode se deixar passar em vão. Durante o percurso da volta, comecei a prestar atenção na paisagem do Rio, meus pensamentos foram longe o suficiente para imaginar como minha vida tinha mudado em questão de algumas semanas.

O castelo finalmente aparece no horizonte, em seus tons de verde-água, presente na tão conhecida Ilha Fiscal, o trajeto mais conhecido é a barco, mas como uma boa preguiçosa que sou, escolhi vir pela ponte que liga o lugar com a praça XV. O portão de entrada está rodeado de guardas, todos vestidos nas cores da bandeira brasileira, alguns me reconhecem e abrem os mais leves dos sorrisos em minha direção, que eu retribuo sem pensar duas vezes.

Sou direcionada pelo lugar que conheço como a palma da minha mão, minhas malas — apenas duas de mão —, são levadas por um homem. Em poucos minutos chegamos até o salão das mulheres, que agora estava repletos de cadeiras e espelhos, com pelo menos três profissionais de beleza para cada selecionada. Me sento entre duas selecionadas, uma de cabelos ruivos e olhos verdes, escondidos pelos óculos em formato redondo, a reconheço como Micaela, a selecionada de Santa Catarina. Do meu outro lado está sentada uma mulher de pele negra, seus olhos eram verdes, o cabelo era ondulado e chegava aos seus ombros, era a Agatha, de Roraima. Não pude evitar de prestar atenção na conversa que ela estava tendo com seu cabeleireiro, os dois estavam tentando decidir que cor pintar o seu cabelo.

— Se me permite dizer — me intrometo na conversa —, você ficaria linda de cabelo rosa.

— Rosa? — pergunta ela, suas sombrancelhas estavam franzidas, os olhos verdes me fitavam com confusão — Igual o teu?

— Isso! — respondo, me levantando rapidamente, afastando, com o máximo de gentileza que habita em mim, o cabeleireiro que estava atrás dela — Se liga.

Me abaixei na altura da sua cabeça, deixando que meus cabelos tomassem o lugar do seu, em uma cascata cor de rosa, demonstrando o quão linda ela ficaria com esse tom em suas madeixas. Seu cheiro inebriante de morango invadiu meus sentidos como uma onda na beira da praia, você não sabe o quanto eu tive que me segurar para não respirar um pouco mais fundo e guardar o perfume na minha mente. O sorriso leve que tomou conta da sua boca foi o suficiente para eu saber que ela concordava com a minha ideia.

— Curtiu? — indaguei para o seu reflexo no espelho a nossa frente.

— Tá massa! — respondeu ela, enrolando uma mecha de meu cabelo na ponta de seu indicador. — Acho que não tenho coragem de fazer uma mudança tão drástica, talvez só uma parte?

— Você pode começar pintando só a parte de baixo, dá pra esconder com o cabelo natural qualquer coisa — sugeri — Tipo assim — expliquei, separando a parte que poderia ser pintada da que o cabelo permaneceria castanho escuro.

— Boa! — exclamou ela, chamando o cabeleireiro de volta — Ei bicho, faz aí o que a algodão doce sugeriu.

— Algodão doce? — perguntei confusa, me sentando na cadeira reservada para mim, minha cabeleireira misturava a tinta rosa em um pote pequeno.

— Teus cabelos parecem algodão doce — deu de ombros. — Tendeu?

— Entendi, moranguinho.

— Moranguinho? — foi a vez dela de ficar confusa.

GUIA DE SOBREVIVÊNCIA À REALEZA Onde histórias criam vida. Descubra agora