Capítulo 3

772 67 45
                                    

|Luz Noceda|

Para ser sincera, não sei como ainda estou em pé.
Não consegui dormir nada, meus pensamentos constantes não me deram tanta escolha a não ser passar a noite em claro.
O passado e o presente parecem se repetir em minha mente como um disco arranhado desde o momento em que me deparei com Amity, até poucos minutos atrás, no fim da minha primeira aula de biologia.

A aula seria cativante se eu não estivesse pensando tanto na Blight.
Graças aos céus, acordei um pouco atrasada propositalmente e me arrumei tão rápido que nem deu tempo de encontrar com a senhorita certinha. Sempre soube o quão pontual Amity é, então essa ideia veio a calhar.
Eu a odeio profundamente.
Só de olhar para ela sinto a vontade de querer gritar e brigar ainda mais com ela.

Pelo o que eu sei, seu horário de aulas é o mesmo que o meu - cursos diferentes, períodos iguais é claro -.
Das sete e meia da manhã até meio dia.
Então supostamente teríamos que passar o resto do dia após o fim das aulas juntas.

Pensei muito.
E então para ajudar minha mãe com as despesas e ficar distante da Blight, resolvi imprimir meu currículo e sair entregando pelos estabelecimentos da cidade. Antes, almocei num restaurante perto da faculdade e respondi as mensagens de Willow dizendo que eu estava bem.

Às três e quarenta e cinco, pego o último currículo para entregar em um petshop.
Aquela era a minha única esperança já que, a maioria das lojas haviam me rejeitado por falta de vagas - a cidade é pequena e bem movimentada, então já era de se esperar - se eu conseguisse esse emprego iria adorar trabalhar, já que amo animais.

Piso no porcelanato brilhoso com meu par de tênis all star na cor vermelha e ando pelo local. Me disseram que inaugurou recentemente.

Faço uma pequena análise, passeando meus olhos pelo estabelecimento.
As prateleiras estão repletas de produtos novos, rações, brinquedos, gaiolas e tudo o que pode se imaginar.
Há uma mulher sentada numa cadeira, com os pés sob o balcão. Seus cabelos brancos estão bagunçados de uma maneira proposital - acredito eu -, ela parece distraída enquanto toma seu café e observa seu celular.
Atrás dela pode-se ver mais itens como coleiras e remédios para pulgas, ao lado direito uma porta com uma placa "somente funcionários".

— Boa tarde. - Digo próxima ao balcão. — Eu queria saber se ainda estão com vagas de emprego pra trabalhar aqui.

Ela me observa com cautela e logo abre um sorriso.
Estendo meu currículo, ela o lê rapidamente e me entrega.

— Todo mundo mente nisso, não sei porquê ainda usam currículos. - pensa alto. —Mas sim, preciso de alguém para ajudar Hunter a dar banho nos cachorros. Você sabe tosar ou dar banho?

— Dar banho em cachorro de quintal eu sei. E também sei que os produtos a se usar nos cachorros daqui, é diferente do sabão de casa. - Respiro fundo.
— Nada com que eu não possa lidar. Posso pegar o jeito e ser útil.

— Por que eu deveria te contratar? - Ela deixou a tela do celular tombar para baixo e por um momento eu pude ler sua barra de pesquisa do google: "PERGUNTAS PARA SE FAZER ANTES DE CONTRATAR ALGUÉM", com letras gigantescas.
Seguro o riso pois preciso do emprego.

— Preciso do emprego pra ajudar mãe, sou prestativa e aprendo bem rápido. Se quiser eu posso fazer um teste.

— HUNTER! - A mulher berra. Fico parada tentando processar o que aconteceu nos últimos minutos. A porta atrás da mulher é aberta. — Esse é o meu sobrinho, ele vai te ajudar.

— Fala, Eda. - Hunter para ao seu lado, me encarando confuso. — Hmm, boa tarde?

— Oi. - O respondo, voltando a olhar para a mulher. — A vaga é minha ou não?

— Quase sua. Vamos fazer uma aposta, Hunter te ensina a dar banho nos cachorros e se eu gostar do seu serviço, a vaga é sua. Caso contrário, você paga duas rodadas de cerveja pra mim e pra ele.

— Feito. - Lhe ofereço um sorriso convencido.

— Eda, já é a quinta vez que você faz isso. - Hunter resmunga para a tia, que lhe oferece uma risada.

— Andem logo. Luz, a aposta começa agora.

Depois de passar o restante da tarde inteira me esforçando pra lembrar qual a ordem dos produtos a se usar nos cachorros, finalmente consigo impressionar Eda.

Hunter foi paciente comigo enquanto explicava tudo o que eu teria que fazer. Com a prática eu logo chegarei a perfeição.

— A vaga é sua. - Eda sorri pra mim. — Mas... Você ainda me deve uma cerveja.

— Ei! Bom, obrigada pela vaga.

Volto para o dormitório morta de cansaço, mas pelo menos com um emprego novo. No momento estou fedendo a cachorro molhado, necessito urgentemente de um banho.

Eda me disse que preciso chegar lá duas da tarde e ir embora às sete e meia.
De segunta a sexta.
É um bom trampo.
Ao menos me fez esquecer da Blight durante um bom tempo.
Agora é hora de vê-la novamente, mas que porra.

Giro a maçaneta e entro no quarto. Elá está deitada na cama lendo um livro, de costas para mim.
Agindo como se eu não estivesse ali, ela continua a fingir que está lendo.
Ignoro deixando minha mochila na minha parte do quarto, indo direto para o banheiro tomar meu banho.

A água morna desce pelo meu corpo, me trazendo um misto de sensações diferentes.
Penso em como agimos no passado, logo sentindo um nó se formar em minha garganta.
Minha mãe batalhou muito para que eu estivesse em uma faculdade hoje, então eu devo honrar isso e parar de remoer essas lembranças. Preciso de foco.
É o melhor a se fazer.
É o que eu costumava a fazer, ou tentava...

Aliás, não dá pra viver o futuro se não deixar o passado para trás.
__________________________________

Beijoss

Me perdoem por qualquer erro ortográfico.

Por favor, não sejam leitores fantasmas. Seu "simples" comentário dará incentivo para que eu possa continuar essa obra.

You again - LumityOnde histórias criam vida. Descubra agora