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Finn passou por ela como se não fosse nada, como se ela não fosse nada. Aquilo a enfureceu mais que as bestas do pântano que a desobedeciam. Thalisnia sabia de sua beleza esdrúxula, tinha pleno conhecimento de seu sorriso mortalmente sedutor, e seus dotes desejados. Mesmo entre seus soldados e habitantes de Bogdana, ela sabia que era linda. Sua pele brilhava como a lua naquela noite, seu cabelo parecia resgatado do brilho das estrelas, caindo em ondas para delinear seu corpo, após um longo dia preso em uma trança. Ela encarou o Rei sentado à fogueira, com uma mão estendida para o fogo crepitante.

— Acha que pode senti-la através do fogo?

Thalisnia nunca havia falado com o rei de Kibtaysh, até aquele momento. Mas Finn havia saído com sua pupila, e ela queria ver mais de perto a lenda dos ventos, o nome pelo qual o chamavam em sua terra.

— Nem todo o fogo vem dela. — Ele começou. — Mas certamente me lembram de seu calor.

A garota observou as chamas, ao lado de Lúcios, o homem que havia passado por tanto para não acreditar no amor. Lúcios havia sido feito para não sentir nada, fora torturado por isso. E mesmo assim, como uma espécie de destino, seu olho brilhou em ametista para a garota que mais o irritava. Thali riu com a ironia, a coincidência ou destino em que eles se encontravam.

— Eu pensei que você fosse o mais fraco no começo. — Ela admitiu. — Assistir vocês sem poder fazer nada, era... emocionante e desesperador, na mesma medida.

Lúcios não estava surpreso, os ventos o contaram a conversa entre ela e Finn.

— Nunca tinha visto algo como o seu poder, mas quando se jogou na frente de Kalishta... — Ela suspirou. E Lúcios podia jurar que havia visto um traço de humanidade em seus olhos. — Eu entendi que seu tipo de força vai além dos outros. Você e Kalishta encontraram forças um no outro, e isso é algo que nenhum outro herdeiro tem.

O rei refletiu. Faziam apenas alguns meses que ele estava no castelo de Ellywe, tentando esconder seus sentimentos por Kalishta, relutando contra a necessidade que seu corpo tinha de estar perto dela. A decisão de tomar a facada por ela não foi pensada, foi puro instinto. De alguma forma, o sentido literal a que Thalisnia se referia, fez sentido pela primeira vez na cabeça de Lúcios. De fato, as vezes era como se seus ventos dialogassem com as chamas de Kalishta. Mas aquilo não era normal? Não eram todos capazes de fazer aquilo? Talvez...

— Me pergunto o que Finn seria capaz de fazer com esse tipo de poder.

Lúcios encarou a floresta no local onde Finn havia desaparecido, e quase pode enxergar um rastro de poder. De fato, o mundo não estaria preparado para uma ligação como aquela.


Imogen segurou a própria barriga quando seu lanche ameaçou voltar pela boca, após um soco de Finn. Não um soco qualquer, um belíssimo soco de uma mão direita cheia de poder. Ele a observou se encurvar, e não com pena, se aproximou para ver se a garota estava bem. Já faziam algumas horas que eles seguiam treinando, e a garota ainda não tinha tentado acertá-lo. Ela apenas desviava, de novo e de novo, não importava o quanto Finn pedisse para ela atacar.

— Uma hora você precisa vir pra cima. — Finn apoiou uma mão delicadamente nas costas da garota. — Use seus poderes.

Imogen abriu a boca pra falar , mas uma voz soou nos bosques antes da sua.

— Ela não vai atacar você. — Thali desfilou para dentro do círculo desenhado no chão, o qual estavam usando como ringue de treinamento. — Ela admira você. E só vai atacar de verdade quando você fizer isso.

Finn apoiou as mãos na cintura e encarou a invasora. Com o melhor olhar de desdém que pôde forjar, ele se afastou do "ringue" indicando sua pupila com as mãos estendidas.

— Faça melhor.

Thalisnia sorriu com aqueles dentes reluzentes, o olhar vítreo e concentrado. Um arrepio subiu pela espinha de Imogen, o enjoo piorou, mas ela se levantou.

— Eu vou.

Thalisnia sorriu para Imogen, que se ergueu ereta. Seus cabelos negros escorriam pelos ombros envoltos pela roupa de couro e pele, onde seus membros tremiam. ela manteve seus pés fixos no chão, mesmo com o coração incerto. A garota à sua frente lhe causava arrepios que nem sempre podia evitar, mas sempre viu como medo. A forma como seu braço se estendeu para a criatura, e ela simplesmente... explodiu.

— Prepare-se.

Thali avisou. E foi o máximo que fez. Rápida como um raio, ela avançou para Imogen, tão forte que ela pensou que fosse quebrar. Em um segundo ela estava caindo, no segundo seguinte Thalisnia pressionava seu tórax com firmeza, a pressão nauseante que a impedia de pensar.

— Ela não consegue respirar. — Finn avisou.

— Se quiser respirar,— Thali começou — me tire de cima.

Imogen pensou que aquilo nunca fosse acabar. A pressão em seu crânio a cegava. Sua garganta se comprimia em uma tentativa inútil de tentar respirar. Quanto tempo podia levar pra o alívio vir através de morte? Ela não sabia. Seus braços se debateram, os dedos flexionados se enterrando na terra, jogando o corpo para cima, contra o pé de Thalisnia.

— Poderes garota, use seus poderes.

a garota usava apenas um dos pés, sem qualquer vestígio de poder, mas ainda foi capaz de paralizá-la daquela forma. Imogen absorveu o último resquício de ar que havia em seu corpo, e obedeceu. Seu medo, aquele temor antigo, deixou seu corpo quando suas veias se expandiram, e se esvaiu completamente. Finn suspirou quando viu a explosão de poder, o gelo sólido se expandindo de dentro dela, até afastar Thalisnia o suficiente. Uma estaca de gelo, nascida de seu peito, simplesmente derreteu quando ela se levantou. O ar invadiu seus pulmões com agressividade, fazendo-a tossir ao ponto de sua garganta arder.

— Bom.

Thalisnia encarou a garota de cima a baixo, olhos semicerrados e um meio sorriso no rosto. Finn sentiu um arrepio quando sua voz soou, imponente e audível apesar do baixo volume:

— Agora defenda.

Imogen tentou erguer uma parede de gelo com os braços, mas Thalisnia foi mais rápida. No tempo de uma piscada, Finn quase a perdeu de vista quando atacou, com um soco direto bem no rosto de Imogen. Sangue jorrou, sua visão ficou turva, e Thali nem sequer havia usado seus poderes. O que diabos era aquela garota? Finn se perguntou, quando aqueles olhos escuros brilharam com lascas prateadas, sua magia se encantando em resposta. Ele nunca havia sentido seu poder daquela forma. Como se fosse uma parte viva dele, como se pudesse ser mais.

Filho de BulhartOnde histórias criam vida. Descubra agora