i wanna rock.

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  Para compreender à fundo essa história, é preciso saber que ela se divide em três pontos de partida extremamente importantes. E esses três pontos começam todos ao mesmo tempo.

  Hawkins, Indiana; 1990. 

  Hawkins. Ah, a pequena cidade de Hawkins. A cidade de pouco mais de três mil habitantes que costumava ser um paraíso para os que anseiam pelo conforto e prezam pela paz e boa convivência. Lojas, um shopping center, escola, hospital. Tudo próximo, tudo pacato e sempre tudo na mais perfeita ordem. Como dito, para os sossegados, um verdadeiro pedaço de céu na terra. Porém, para os mais "inquietos", diga-se assim, a rotina de sempre ver as mesmas pessoas, os mesmos conversíveis, as mesmas árvores e os mesmos lugares era um tanto quanto tedioso. Um porre, definitivamente. Quase como acordar de ressaca todos os dias, tirando a parte da noitada divertida da noite anterior e o álcool correndo em suas veias. Apenas a sensação de se estar zumbificando
  E para o moreno atendente do Ben&Jim Burger, o processo de tornar-se um zumbi já havia se adaptado aos horários enraizados de tão fixos. 

Primeiro Ponto — Um guitarrista sem perspectiva. 

  — Aqui está seu pedido. — A voz monótoma, robótica e deprimente acompanhou o som fino do prato de cerâmica entrando em contato com a mesa. 

— Ei, eu pedi sem anel de cebola. — A mulher de longos cabelos longos e volumosos reclamou, fazendo o garçom suspirar fundo antes de tentar explicar a situação gentilmente. Por mais que a gentileza naquele caso não fosse exatamente o que desejava expressar para a esbelta mãe do pirralho do final da avenida. 

— Senhora, o especial da casa se chama Double Dash Rings. Ele obrigatoriamente vem com duas camadas de aneis de cebola empanados com óleo de gira– 

— Mas eu disse que não queria. 

  Mais um suspiro. E ele poderia jurar que tentou ao seu máximo controlar a língua. No entanto, a necessidade teatral de expor seu sarcasmo não se conteve diante da impertinente reclamação. 

— Minha gentil senhora. — Uniu as palmas e entrelaçou os dedos — Toda semana a senhora vem aqui e desmembra um a um os nossos sanduíches. Já retiramos a carne e os molhos, trocamos o queijo por requeijão e os seus insistentes e constantes protestos até nos fizeram implementar uma ala só de sucos "dietéticos". — Fez careta — Da próxima vez, você pode pedir só uma salada. Assim poupa a gente de cortar o pão! 

  Tomou o prato para si, o repousando enfurecido sobre o balcão que dividia a cozinha do salão das mesas e do palco ao fundo onde uma banda amadora se apresenta. A mulher, completamente ofendida pelo bom bocado de palavras que ouvira do empregado do estabelecimento, saiu alegando nunca mais pisar ali e ser submetida a aquele tratamento imundo. O empregado debochava, revirando os olhos ao que enchia a boca com uma mordida no lanche descartado. 

— Eu não dou um mês pra essa imbecil estar aqui me buzinando nos ouvidos. "Sem molho", "sem carne", "mal passado". Ora, tenha santa paciência. 

— Munson. 

  Jim Hopper o chamou da porta de seu escritório pessoal, fazendo Eddie saltar do banco e engolir em seco o grande anel de cebola envolto na língua. Pôde sentir sua garganta contraindo em resposta ao alimento mal digerido. 

— O que a gente conversou sobre isso? O cliente...

— Sempre tem razão. Mas qual é, Jim...

— Hopper. 

— Hopper. Qual é, Hopper! Essa caquética todo dia me faz ir e vir com essa por... caria de pedido até que esteja do jeito que ela quer. Se ela tá achando tão ruim, não deveria ela mesma fazer? 

blackout | steddie.Onde histórias criam vida. Descubra agora