Capítulo 1

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O reencontro

Miguel Castello

Eu me arrumava no banheiro de Jéssica enquanto ela fazia o mesmo no seu closet. Geralmente não era assim, nossa sintonia era perfeita, a nossa parceria e a nossa química invejável, fazíamos tudo juntos. Há alguns meses que eu comecei a trabalhar em uma mineradora e há seis meses que temos empurrado esse namoro com a barriga. Estávamos com divergências de ideias, pois ela não aceitava que eu estivesse trabalhando para a empresa Minerações Wilson², justamente para a responsável pelo crime e devastação ambiental de Serrana³, um povoado onde havia uma grande Jazida de Bauxita. A sua exploração causou grande perda da biodiversidade local, conflitos de uso do solo, além de uma grave poluição atmosférica, onde as famílias assentadas naquela região, foram obrigadas a se mudar, na época. Esse detalhe importante foi o que levou o caso a ser conhecido e mostrado pela mídia nacional há alguns anos, até hoje as famílias afetadas brigavam na justiça por seus direitos.

A nossa discussão parecia eterna sobre o assunto, uma vez que nos conhecemos justamente em uma ONG voltada para a temática do desenvolvimento sustentável de Minas Gerais e dentre os trabalhos que fazíamos, um deles era dar apoio para algumas famílias que foram afetadas por algum tipo de desastre ambiental, Jéssica sempre se envolvia muito com as histórias deles e quando eu lhe falei sobre o meu novo emprego, parte do que construímos como casal se perdeu. Eu não ia voltar atrás, sabendo que essa era uma ótima oportunidade. Eu tinha muito a crescer trabalhando como geólogo na equipe de prevenção de impactos ambientais e recuperação de áreas degradadas. Infelizmente o que aconteceu no passado não teria como mudar, tínhamos que precaver para isso jamais se repetir no futuro e era isso o que eu estava fazendo, a passos de tartaruga, mas eu sabia que não seria tão fácil assim. Com paciência e perseverança chegaríamos no ideal.

Jéssica, no entanto, não acreditava que poderíamos conseguir mudar o modus operandi da empresa e insistia para que eu saísse e procurasse outro trabalho ou me dedicasse inteiramente ao meu mestrado, ela simplesmente não entendia que eram minhas escolhas, meu emprego e enquanto eu me sentisse bem no meu ambiente de trabalho, continuaria ali. Mas não, ela não dava o braço a torcer e somente a opinião dela era importante sobre esse assunto e me doía, porque eu já estava ficando cansado disso tudo, do nosso relacionamento.

Terminei de pentear o cabelo, passei meu perfume favorito, conferi o traje social despojado, abri os dois primeiros botões da camisa e estaria pronto, se não estivesse faltando meus acessórios. Coloquei meu Rolex favorito no pulso, anéis nos dedos da mão direita — para fazerem companhia com a aliança de compromisso —, um brinco de diamante na orelha e ainda ponderei sobre o piercing que eu carregava no mamilo, mas eram pessoas importantes que eu veria depois de tantos anos, portanto decidi ir sem aquele acessório. Eu era muito vaidoso, não era segredo para ninguém e provavelmente Jéssica já deveria estar impaciente com a minha demora. Suspirei fundo quando saí do banheiro, hoje ela conheceria uma parte da minha família, meus padrinhos e os dois filhos deles e eu estava nervoso, a opinião deles era muito importante para mim, tanto quanto a dos meus pais.

Como eu suspeitava, ela já me aguardava sentada na cama de pernas cruzadas, balançando-as impaciente. Quando me viu, levantou-se, o vestido que cobria o seu corpo desceu com o movimento brusco, chamando a minha atenção para o seu corpo coberto pelo pano preto de alças e colado, uma fenda discreta na sua coxa direita fez minha mão formigar de vontade de tocá-la ali.

— Você tá linda — elogiei, me aproximando dela, que já não tinha mais o tédio estampado em seu semblante.

— Eu nem preciso falar que você está impecavelmente bonito, porque pelo tempo que passou no banheiro, você já sabe disso — brincou, passando os braços em volta do meu pescoço.

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