VIII - Ligação

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Não devia fazer nem uma hora que Richie estava dormindo quando acordou ao som irritante do toque de celular de Eddie. A noite fora divertida, depois da ponte do beijo ele e Eddie voltaram para o hotel e ficaram acordados até tarde recuperando o tempo perdido, mas agora Richie queria dormir.

—Desliga essa porra logo, – resmungou Richie, com a voz sonolenta.

Eddie também despertara com o som, ainda de olhos fechados teteou pela mesa ao lado da cama em busca de seu celular. Quando finalmente conseguiu pegá-lo, Eddie abriu os olhos e olhou para a tela, esperando sua visão embaçada pelo sono focar para então saber quem estava ligando. Assim que leu o nome, o corpo de Eddie recebeu o efeito instantâneo de dez xícaras de café, ele arregalou os olhos, afastou-se do abraço de Richie em um sobressalto e sentou-se na cama.

—É a minha esposa, – falou Eddie.

Richie olhou para Eddie com uma expressão facial que demonstrava um "e daí?" sonolento.

Eddie suspirou em desaprovação, parecia querer atender mas não saber nem mesmo o que falar para Myra. Richie continuou encarando-o.

—Se for atender mesmo coloca no viva voz, Eds. Se eu vou ter que ouvir de qualquer jeito quero ouvir a briga completa.

—E o que você ganha com isso?

Richie deu de ombros.

—Entretenimento?

—Você é o que? Uma vizinha fofoqueira?

—Não! Eu apenas gosto de ouvir as vizinhas fofoqueiras, elas são meio solitárias, precisam de alguém pra ouvir as fofocas de vez em quando, pense em mim como um simples ouvinte e às vezes comentarista da vida alheia.

Eddie respirou fundo e atendeu, realmente colocando no viva voz.

—Myra?

—Eddie!? – falou Myra do outro lado da linha, – por Deus, Edward, onde você está!? Você não dá notícia a dias, acha que eu não me preocupo!?

—Eu... estou bem. Estou em Derry, minha cidade natal, você sabe. Vim reencontrar alguns amigos, só isso.

Richie percebeu que Eddie parecia hesitante em tudo o que dizia, ele não gostava de mentir, mas também não queria magoar Myra. Richie se moveu até o lado de Eddie, deitando a cabeça em seu ombro e segurando sua mão.

Que amigos, Eddie!? Eu nunca te vi ter contato com nenhum amigo em Derry! Na verdade você nunca nem falou sobre amigos em Derry! E... – Myra parou por dois segundos, depois sussurrou, – tem alguém do seu lado?

Silêncio. Eddie não sabia o que responder.

—Edward Kaspbrak, eu ouvi uma respiração! Quem está do seu lado?

—Myra, calma! É um dos meus amigos, só isso.

Richie olhou para Eddie, fingindo ofensa, moveu os lábios sem permitir que som algum saísse – "amigo!?".

Myra soltou uma gargalhada.

Amigo!? Ao seu lado, à essa hora da manhã!? Tão perto ao ponto de eu ter ouvido a respiração dele!? Você espera que eu acredite nisso mesmo, Edward!? Eu sabia que você estava me traindo! SABIA! Tudo isso estava muito, muito estranho! Agora vamos, desembucha, quem é a puta que tá aí do seu lado!??

Eddie estava paralisado, não sabia o que dizer e nem por onde começar, Richie se sentiu na obrigação de tomar partido.

—A puta sou eu, – disse Richie para o celular.

Eddie lançou um olhar irritado para ele, soltando sua mão e movendo seus lábios silenciosamente de maneira a formar a frase: "que porra é essa, cara?".

—Myra, perdão, – Eddie tentava fingir calma, mas o desespero estava enrustido em sua voz, – Esse que falou é o meu amigo. Ele é comediante, não consegue se controlar suas piadas.

Myra hesitou.

Rich? Esse é o apelido, deve ser Richard, né? É ele?

Richie estava confuso, Eddie parecia igualmente perdido. Ele nunca havia contado de Richie para Myra.

Como...?

—Eu vi a foto, a da sua carteira. Na verdade, às vezes eu pegava você olhando pra ela. Você nunca me contou muito sobre seu passado, Eddie, me diz agora, por quê?

Eddie respirou fundo.

—Olha Myra, essa questão em específico é muito complicada, acredite em mim. Você merece uma explicação complexa sobre tudo isso, mas é algo difícil. Você acreditaria, por exemplo, se eu dissesse que perdi todas as minhas memórias de infância e só recuperei elas há algumas semanas? A foto na minha carteira mesmo, eu nunca te falei nada porque não lembrava nem quem o Richie era, sabia que ele era importante pra mim, mas apenas isso. Eu lembrei de tudo faz apenas alguns dias e foi uma grande... sobrecarga.

Myra riu.

—Você não acredita, não é? – Eddie falou.

Eddie, eu sei que existem algumas coisas de perda de memória assim na medicina, talvez na psicologia, mas... me desculpa, não sei se eu consigo acreditar, esquecer sua infância inteira e depois se lembrar do nada? Isso é demais.

E isso porque ele nem contou pra ela as partes mais bizarras e inacreditáveis, – pensou Richie.

Mas então, – Myra continuou, – me conta agora. Quem é Richie?

Eddie olhou para Richie, que estava sorrindo para ele.

—Richie é um completo sem noção. É o cara que vai te fazer rir o tempo todo, principalmente em momentos inoportunos; aquele que sempre acaba ofendendo alguém sem querer porque não consegue controlar a própria boca; o cara que tem uma piada ruim na manga pra todas as situações possíveis. – Eddie encarava Richie fixamente enquanto falava, carregando um brilho imensurável em seu olhar, – e, ao mesmo tempo, Richie também é a pessoa mais incrível e corajosa que eu já conheci, no sentido de rir na cara do perigo e também no de enfrentar um alienígena bizarro com um taco de baseball por você se for necessário.

Eddie ainda encarava Richie, ambos sorriam um para o outro. Myra ficou em silêncio por alguns segundos.

Você ama ele?

—Me desculpa, eu não queria te falar tudo isso por telefone, eu... – Eddie voltou a segurar a mão de Richie, – Amo. Amo ele.

Dá pra perceber só pelo jeito que você fala. – Myra pareceu pensativa, perdida em alguma memória, talvez alguma que Eddie não conhecesse, – Não temos como controlar o coração, certo?

Segundos se passaram sem nada ser dito, o silêncio foi ensurdecedor.

Eddie, eu espero que você seja feliz ao lado dele porque eu sinceramente nunca senti tanta felicidade na sua voz como eu senti agora, e eu estou feliz vendo você feliz, mas ao mesmo tempo eu quero que você morra por ter feito isso comigo, – Myra respirou fundo, – e nem tente me pedir desculpas nesse momento porque eu não quero ouvir nenhuma palavra vinda de você agora, eu só quero... pensar. Depois que a minha mente estiver mais organizada a gente pode conversar sobre tudo isso. Pessoalmente.

E então ela desligou.

E se...? - ReddieOnde histórias criam vida. Descubra agora