Ativo e Passivo - Nossa já cansativa rotina

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Por Túlio

Sabe, há algum tempo que estamos numa espécie de paz, equilíbrio e maturidade. A relação estabilizada traz isso e a mesmice, que não é de forma alguma negativa, apenas repetitiva e tudo segue tão natural que parece monótono.

É possível que seja o amor na sua forma mais pura, pois a repetição é até agradável.

Tudo parece de repente muito simples.

Tudo parece infinitamente perfeito. Assim é quando tocamos a estabilidade em um relacionamento. Nós nos pegamos apenas a contemplar o outro que faz a mesma coisa todos os dias, os hábitos e até as reclamações das mesmas chatices, jogo, política e (in)tolerâncias. E de certo ele faz o mesmo e reflita sobre.

— Túlio, qual das duas hoje? — ele me questiona se deve usar a camisa branca social ou azul escura pólo. Eu escolho meio sem pensar, pois antes disso as cores claras ficam melhor nele destacando sua pele morena que eu sempre achei lida demais. — Ué braquelo, estás no mundo da lua hoje?

— Pensativo.

— Viajando bonito, anda amor do Braz. — ok, ele me abraça dá um selinho e o repetitivo tapa na bunda como se eu estivesse empacado.

Dá para passar a borracha, corretivo ou delete em metade desse meu devaneio inicial?

Não dá porque pensei e assim está pensado. Não são só as coisas deliciosas que enfeitam a repetição, mas as chatas também e com isso, não há como ficar chateado e por fim me decido pela camisa social preta, pra tentar pesar no clima com ele. Já sei que vai mandar eu tirar e vou me irritar e o sangue esquenta à toa... porque ele nada diz dessa vez, quebrando o que tentei estabelecer.

— Braz??? Vai me deixar ir de preto?

— Vai passar calor.

Bem, não é o que eu esperava, porque sim, ele tantas vezes foi capaz de me tirar a camisa e dizer: "ficas melhor com um tom verde ou azul". Sempre a comentar sobre meus olhos, algo que me deixa vaidoso sempre ou nem tanto porque já caiu na rotina também.

— Pronto. Coloquei essa azul. — espero o elogio que não vem — Gostou?

— Gostei sim.

— Só isso?

— Vida, a preta também lhe veste bem. Eu acho que fica bem, tu és clarinho fica um charme.

— E os meus olhos?

— O que houve com eles?

Mas que cabeção! Depois eu que estou no mundo da lua. Nenhum elogio hoje? Quando me proponho a falar de repetição, ele vai contra tudo e me deixa irritado e confesso que há meses que não sentia isso. Verdade, não sentia a frustração tola que senti há minutos.

Enfio-me de volta na camisa preta, que aliás foi um presente dele e entendo melhor que às vezes sou um pouco mimado. Elogios dele são um bálsamo contra minha baixa autoestima. Mas vou ficar bem sem isso, hoje quem sabe.

Sim, olhos claros tem seu charme, mas e os castanhos? Castanhos contém sedução e mistérios que nos aprisionam e fazem escravos.

Eu sei que ele diz o mesmo sobre mim, porém sinto que é justo comentar que um olhar escuro fala uma língua própria, mesmo que não diga com palavras dá para sentir quando estão sorridentes ou sombrios. Há diversão neles, há frieza e um quê de mistério também. É possível perceber quando o Braz está me escondendo algo, seja bom ou ruim, ele esconde bem. Coisa que eu não sei se saberia fazer tão bem.

— Tô dizendo, hoje o alemão está no mundo da Lua... ei beleza do Paraná, vai mudar a camisa de novo? — ele aponta as outras seis camisas que tirei dos cabides. Caramba, seis camisas!

Ativo e Passivo 3 - Mais RotinaOnde histórias criam vida. Descubra agora