XIX

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—Se sente melhor? - Liu questionou, visivelmente ansioso.

    Em resposta, você acenou positivamente. Nas mãos trêmulas segurava uma xícara. Pouco antes, sua tia preparou um chá de camomila para acalmá-la e naquele momento o líquido morno rasgava sua garganta. Desenvolvera uma estranha afeição pela dor.

—Sinto muito S/N. Eu não esperava que meus assuntos a afetariam. Fui descuidado. - Ele desculpou-se.

    Desde a crise que teve no jantar, você mantia-se em silêncio absoluto. Seus olhos encaravam o nada, vidrados e opacos. Após a voz de Liu cessar, o silêncio recaiu no cômodo. Sua tia permaneceu na cozinha. Foi um pedido do homem.

—Pode me contar mais sobre ele? - Repentinamente você resolveu falar. Repousando a xícara vazia sobre o criado.

—Eu não acho que seja uma boa hora.

—Por favor Liu, eu preciso saber.

    Sua insistência pareceu assustar Liu.

—Mas por qual razão minha vida a interessa tanto?

—Se me contar, eu explico tudo. Mas primeiro, preciso saber o que ele fez a você.

    Liu parecia ponderar aquele pedido. Ele apertou as mãos, entretanto cedeu. O homem ergueu-se, arrastando uma cadeira e pondo-a ao seu lado. Ele refletia sobre estar fazendo o certo, entretanto, sentou-se.

—Este homem da foto é meu irmão.

    Você finalmente esboçou alguma expressão. O cara a sua frente não se parecia em nada com aquele da imagem, exceto pelas cicatrizes nos lábios.

—Prossiga.

—Bom, a muito tempo, nós fomos unidos. Eu o amava genuinamente. Porém, em uma noite, enquanto todos dormiam, ele matou nossos pais cruelmente. - Liu suspirou, sua voz falhou por um breve momento. —Ele me atacou enquanto eu dormia. Fingi-me de morto e mesmo muito machucado, consegui sobreviver. A ambulância chegou a tempo de me salvar, mas já era tarde para os meus pais. Naquela mesma noite, antes de desmaiar, jurei encontrá-lo novamente. Quando saí do hospital, dediquei-me a está promessa, mas todos os meus esforços foram em vão. Ele havia sumido, restando apenas capturas de imagens dele em câmeras de segurança. Soube por terceiros que uma vizinha próxima a nossa antiga casa também foi vítima dele.

—Ela sobreviveu? - Você questionou, embasbacada por toda aquela estória.

—Não posso dizer ao certo.

    A cada palavra de Liu, sentia uma pontada em seu peito. Ele sofreu tanto nas mãos de Jeff e mesmo assim foi forte. Seu próprio irmão o apunhalou. Não poderia imaginar a dor que Liu carregava.

—Por fim, estudei, me tornei um bom advogado, entretanto meu desejo não foi realizado. Apesar de tudo, eu ainda o amo e ele sempre será meu irmão. Espero um dia encontrá-lo para tentar entender os motivos que o levaram a cometer tudo aquilo.

    Liu encarou-a, suas orbes esverdeadas estavam vermelhas. Ele segurava as lágrimas, porém uma ainda insistiu em rolar. Você não permitiu que ela caísse. Roçando os dedos sob a pele cicatrizada, limpou-a.

—Liu, eu sinto tanto... - Você murmurou por um fio.

    O homem afagou sua mão, cuidadosamente. De seus lábios um sorriso surgiu.

—Você acalma minhas dores.

    O olhar hipnótico de Liu a prendia. Não conseguia mover-se e quando deu-se por si, seus rostos estavam próximos o suficiente para sentir a respiração do homem contra sua pele. Ele acariciou sua bochecha, semicerrando os olhos. Quando cogitou beija-lo, uma dor aguda atingiu-lhe, cortando a alma já quebrada. Afastou-se de imediato, ofegante.

—Perdão! - Ele sobressaltou-se de seu assento. —Está na hora de ir embora.

    Você não conseguia formular uma frase, então limitou-se a acenar em concordância. Liu catou seus papéis, guardando-os na maleta.

—Até outro dia. - Ele despediu-se cabisbaixo.

    Enguendo-se ainda trêmula, abriu a porta e o viu partir sem ao menos falar-lhe um "adeus". Quando o mesmo sumiu entre os pedestres, trancou-se adruptamente aspirando o ar que lhe faltou dos pulmões.

—Ouvi um barulho. Aconteceu algo? - Sua tia apareceu na sala, visivelmente preocupada. —Onde está Liu?

—Foi embora. - As palavras saíram involuntariamente.

—Poxa, mas nem se despediu. - Ela suspirou.

    Você ignorou-a, praticamente correndo para seu quarto.

{ ... }

    Naquela madrugada, não conseguiu descansar. Rolava sobre as cobertas, aflita. As imagens do ocorrido de mais cedo não saíam de sua mente. A foto do tal Jeff, o quase beijo de Liu, enfim, foi uma noite agitada. Mal respirava, mas não sabia explicar a falta de ar. Você levantou-se da cama e caminhou até a janela, erguendo o vidro. A brisa gélida tocou sua pele, arrepiando-a.

—Por favor mãe, me ajude. Me dê um sinal. - Você praticamente implorou num sussurro quase choroso.

    De repente, sentiu-se observada. Novamente o flashback das orbes glaciais abateram-na, causando vertigem. Quando recuperou-se, não podia crer no que presenciava.

    Do outro lado da rua, recostado a um poste mal iluminado, a figura de moletom branco a observava. Seus cabelos cobriam os olhos, entretanto explicitavam o sorriso feito a faca. Porém, a criatura estava longe de sorrir, sua boca contorcia-se falando-lhe algo, ou melhor, tentando. Naquela distância não conseguia distinguir as palavras ditas. Observando o térreo, você cogitou pular a janela, mas lhe custaria uma perna quebrada e diversos arranhões. Precipitando-se, correu porta a fora, em direção a entrada. Quando abriu a porta principal, a figura não estava mais alí, restando apenas a opaca luz do poste.

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⏰ Última atualização: Dec 29, 2022 ⏰

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Kill Me, Jeff The KillerOnde histórias criam vida. Descubra agora