Blind

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Domingo - 2 de Fevereiro de 2014


Acordei e abri meus olhos. Não adiantou muito. Continuou tudo escuro. De qualquer modo, não tinha muito que fazer. Aparentemente, a SIF está de ferias. Não é quinta-feira, então não possuía motivos para sair dali. Mas ainda assim, desci pelo elevador. Cumprimentei Clarice, que estava tendo pensamentos obscenos com meu irmão. Não havia necessidade de saber de tais coisas. Ao quase sair do consultório, ouço Clarice me chamando e viro para ela.


- Doutor Hermann, não vestiu sua camisa. De novo.


- Obrigado, Clarice. Sempre me esqueço.


-Se esquece de outras coisas também. Meu aumento, por exemplo Disponha, doutor.


Subi pelas escadas com cuidado, ignorando o pensamento de Clarice sobre seu aumento. Ao chegar no meu divã, tateei procurando minha camisa. A abotoei e em seguida vesti uma blusa de frio com gorro. A saudade de minha terra natal faz com que eu esqueça a baixíssima temperatura aqui. O nome da cidade é bem merecido. Everfrost. Apenas não consigo compreender quais motivos para colocar o nome em inglês. Desde a Guerra Codificada, tudo mudou. Os EUA tiveram de ceder boa parte de seu capital para converter em militarização europeia e como a guerra não aconteceu há tanto tempo atrás e nós, europeus, ainda não nos recuperamos, boa parte dos países entrou em crise incluindo o próprio EUA. Apesar de nós, dinamarqueses, não sofrermos tanto com a guerra, a desolação de outros países fez com que muitos europeus migrassem para cá, o que aumentou drasticamente o índice de criminalidade aqui. Com isso, não existe mais o idioma oficial mundial, apesar de o inglês ainda ser bastante falado em alguns locais. Aprender esperanto é algo a ser considerado.


Sai e comecei a andar pela rua. Sentei-me em um bar e já dei ao garçom algumas coroas para que ele me trouxesse um prato com alguns peixes e um copo d'água. Velozmente, o garçom apareceu em minha mesa e pelo som, me entregou um prato com diversas iguarias do mar, um copo de vidro comum com água e algumas moedas, aparentemente o troco.


- Pode ficar com ele, senhor. - Eu disse.


- Eu não posso aceitar senhor. - Ele me respondeu.


- Por que não?


- Senhor, você me deu 600 coroas pra algo que não custa nem sequer 100.


- Presumo que sua gorjeta será um pouco a mais do que os 10% pedido. - Sorri.


- Senhor, obrigado! Muito obrigado mesmo, senhor!


Enquanto o garçom se afastava e eu pensava se ele possuía alguma conexão genealógica com Soren, tateei o prato e ao tocar em uma sardinha e um pote pequeno de molho tártaro, me ajeitei em minha cadeira. Mordisquei de leve o peixe após mergulhá-lo no molho e fiquei ouvindo algumas conversas. Ouvi sobre política, religião e a falta dela, o antigo modo hygge de se viver. Coisas comuns que são discutidas. Cansado de fingir olhar para o prato, ergui minha cabeça enquanto ouvia uma conversa sobre traição de namoro. Ao ver todas as memorias e pensamentos dela, percebi o quão hipócrita a mesma era:

Rorschach - Entre a Lei e a AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora