capítulo 1

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POV ROBERTA

"Freeridge, aqui é o meu lugar"

O costume de dizer essa frase já é persistente no meu vocabulário, mas a verdade é que eu já não sei se essa afirmação é verdadeira.

Presa entre as palavras escritas na fina folha, tento decifrar os rabiscos que nela eu havia feito. Imersa em pensamentos, escuto ao fundo a voz aguda da professora ordenando a formação de duplas e ditando os pares. Não movo um músculo sequer.

Não faz nem um semestre que as aulas começaram e que eu voltei a estudar mas todos da sala já parecem ter a sua bolha. O fato é que, já era pra eu ter concluído o ensino médio, mas o destino prega peças na nossa vida em momentos inoportunos. Eu e meu irmão fomos meio que obrigados a parar tudo por dois anos porque descobrimos que a mãe estava muito doente e tivemos que cuidar dela.

O Latrell e eu tentamos ao máximo fazer com que ela ficasse bem e confortável mas sabemos as batalhas que ela travou e as guerras que ela lutou, sabemos a dor e o sofrimento que esse mal trouxe a ela e hoje, cinco messes após o seu falecimento, eu a enxergo como a mulher foda que ela sempre foi. Saber que todo o seu sofrimento acabou me conforta.

Minha mãe nos criou sozinha, então sempre foi só a gente. O Latrell é aquele típico irmão mais velho super protetor que quer que você viva debaixo da asa dele e isso me estressa.

Latrell acabou entrando pra gangue Os Profetas logo no início do tratamento da mãe, a gente precisava de dinheiro pros medicamentos e consultas médicas além do básico dentro de casa e ele "encontrou uma solução", palavras do próprio. A princípio eu não fazia ideia do que ele fazia lá dentro até eu meio que me sentir obrigada a entrar também, logo após a mãe morrer e não, eu ainda não sou uma Profeta; esse lance de rito de inicialização ainda não rolou comigo. Eu só queria me sentir importante em alguma coisa. E sim, o Latrell odiou essa decisão, mas ele não tem nenhum poder sobre mim e eu acho que no fundo eu só quero ser forte e independente como ele, e ele NÃO PRECISA SABER DISSO.

Ainda perdida em pensamentos, observo a movimentação da sala e as duplas tomando forma. O ditado da professora continua, até que ela cita o meu nome: Roberta e Jasmine. Dou uma olhada rápida na sala e encontro a minha dupla com a mão erguida e um belo sorriso direcionado a mim, retribuo com um sorriso de canto e começo a guardar os materiais da minha mesa.

Não conheço a Jasmine pessoalmente mas já observei ela nas aulas de biologia e eu não tenho nada contra ela.

Me levanto e caminho em direção a ela, de certa forma eu me sinto aliviada por fazer dupla com alguém de boa.

-Oi Jasmine- digo num tom amigável, já me sentando ao seu lado.

-Oii Rô- fala de forma amável. Olho pra ela com um sorriso simples e com as sobrancelhas um pouco juntas, meio surpresa com o apelido -Você não se importa se eu te chamar assim, né?- ela pergunta.

-Não, tá tranquilo- digo e posiciono o caderno sobre a mesa e a mochila no chão.

Ficamos em silêncio durante a explicação da professora sobre as instruções do que deveria ser feito no trabalho. Assim que a mesma termina de falar, Jasmine organiza o seu material na mesa.

-Então, você tem alguma ideia do que a gente pode fazer?- ela pergunta me devorando com os olhos.

-Não, zero ideias- falo olhando para o caderno, ambas ficamos caladas por alguns segundos -Você entendeu alguma coisa?- pergunto baixo tocando a sua mão na expectativa de quebrar o silêncio.

-Não!- ela exclama e sorrimos -E você?- ela pergunta e segura a minha mão.

-Tô no mesmo barco que ti, mana- ambas gargalhamos.

-Qual a graça?- a professora de repente fala se apoiando na nossa mesa. Nós engolimos a seco o riso e desgrudamos as mãos olhando pra ela -Espero que o projeto da "duplinha" esteja pronto no prazo e que seja tão engraçado quanto- ela fala com desdenho e volta pra sua mesa.

-Sem noção- Jasmine sussurra. Olho para ela que está com cara de deboche, apenas esboço um sorriso, ha cutuco e começamos a trabalhar no nosso projeto.

A animação da Jasmine é contagiante e ela tem umas histórias bem malucas. As aulas passaram voando e só nos tocamos que o tempo havia acabado quando ouvimos o sinal tocar.

-Caraca! As aulas já acabaram e a gente não tá nem no meio do projeto- falo parando o riso e analisando as nossas poucas pesquisas e anotações.

-Acho que a gente se distraiu um pouco- ela fala meio que em um sussurro entre os risos.

-A gente termina na próxima aula, ok?- digo já de pé com a mochila nas costas e começo a pegar as anotações sobre a mesa.

-Ok- ela diz com empolgação organizando os seus materiais. Sussurro um beleza -Eu não sei você, mas eu tenho a estranha sensação de que esse trabalho não vai ser terminado no prazo- ela diz quando se levanta.

-Uma vibe bem sensitiva- gargalhamos. Começamos a caminhar em direção a saída da sala, ambas com diversos materiais nos braços. Esboço um tchau com os lábios e sigo disparada na frente.

Mais cedo, recebi uma mensagem do Latreell avisando que viria me buscar, ele faz isso as vezes.

-Vai almoçar aqui gata?- Jasmine pergunta trombando o meu ombro em meio a multidão do corredor.

-Puta merda Jasmine- falo alto por conta do susto, ela apenas sorrir e começa a caminhar junto comigo -Hoje não- falo olhando para a mesma -tenho uns assuntos pra resolver- digo e lhe dou um sorriso amarelo.

-Então tá "senhora ocupada"- ela começa em um tom de brincadeira -Você é muito misteriosa- sorrir por final.

-Tá bom "senhora minha vida é um livro aberto"- digo e ambas sorrimos -Uma próxima, ok?- digo, Jasmine apenas concorda com a cabeça e diz que vai me acompanhar até a saída.

Seguimos jogando conversa fora. O sol de freeridge é sempre quente mas hoje tá insuportável, assim que passamos pelo portão principal do colégio sinto os raios solares queimarem a minha pele.

Quando passamos por uns caras que estavam recostados em em uma parede pequena bem na saída do colégio, um deles diz alguma coisa que eu nem tento distinguir mas eu acho que a Jasmine levou pro pessoal.

-O que?!- grita bem do meu lado -Cara você escutou isso?- pergunta indignada me cutucando, faço um negativo com a cabeça -Vagabunda- fala mais próxima, quase que sussurrando.

-Deixa isso quieto- Falo calma -Não vale a briga- termino lhe olhando.

-Não! Eu tenho que resolver isso agora amiga- diz me abraçando já um pouco distante dos caras -A gente se ver depois- me solta e vai de encontro ao grupo. Observo ela indo tirar satisfação com os caras e percebo o quanto ela é maluquinha.

Volto a minha atenção para o meu destino e já fora do colégio avisto o meu irmão um pouco longe recostado em seu carro com o olhar me fuzilando e com cara de poucos amigos, vou de encontro ao mesmo.

-Fala cara de beterraba- digo quando já estou perto o suficiente para que ele me escute.

-Por que você tá andando com a Jasmine?- ele pergunta impaciente.

-Ahh já começou- digo passando por ele -E dês de quando você conhece a "Jasmine"?- pergunto lhe encarando.

-Não te interessa- ele retribui o olhar.

-O mesmo vale pra você irmãozinho- digo segurando as alças da mochila.

-Voce não pode andar com ela entendeu?- ele fala segurando o meu braço e com o rosto fervendo, sua mão faz um pouco de pressão contra a pele do meu membro. O olho confusa, ele nunca agiu dessa forma comigo -tem muita coisa que você não sabe...

On My Block - Oscar Diaz Onde histórias criam vida. Descubra agora