ABANDONADOS

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Quando completei 11 anos, a vida ficou ainda mais difícil, pois mamãe resolveu ir embora do nada. Ela ainda deixou um bilhete todo amassado onde dizia "Fui embora. Agora se virem sozinhos. ". Como uma mãe podia ser tão fria e insensível assim? Nós tínhamos deixado de ser seus filhos?

Enquanto eu tentava assimilar o que estava acontecendo, o Arthur apareceu ainda de pijama, com o cabelo bagunçado e esfregando os olhos. Bocejando, ele me perguntou:

– Cadê a mamãe?

Não havia mais desculpa. Eu tinha que dizer toda a verdade sobre nossos pais irresponsáveis. Sentando com ele no sofá da sala, respirei fundo e falei de uma vez:

– A mamãe foi embora. Agora somos só nos dois.

– Por que ela foi embora? Ela não gosta mais da gente?

Ele tinha entendido tudo. Segurando as lágrimas, eu o abracei forte e fiquei afagando seus cabelos, até que ele levantou a cabeça e me encarou com aqueles lindos olhos castanhos.

– Ela foi embora por minha causa, não é?

Não aguentando ouvir essa pergunta, comecei a chorar e respondi:

– Foi, irmãozinho.... Ela te rejeitou assim que você nasceu e quanto ao papai... Ele voltou pra casa depois de 3 dias de bebedeira, brigou com ela e resolveu ir embora de casa. Nenhum dos dois te queria...

Naquele momento, temi ter partido o coração dele em milhões de pedaços, mas não podia mais esconder nossa cruel realidade. As lágrimas rolavam por seu rosto, mas ele ria descontroladamente, o que me deixou desolada.

Eu o abracei ainda mais forte e ele tornou a me encarar.

– Lizzie, eu sou um menino mau?

– Claro que não, maninho. Você é o menino mais doce, inteligente e querido que existe em todo o mundo.

– Então, por que a mamãe e o papai não gostam de mim?

– Eu não sei.... Acho que não conseguiram ver como você é especial.

Depois de uma pausa para tentar me acalmar, o beijei na testa e disse:

– Fica tranquilo, meu amor, pois eu nunca vou te abandonar, pois te amo de todo o coração. Nada vai nos separar.

Enquanto tentava acalmá-lo, os pensamentos se misturavam na minha cabeça como um turbilhão. O que seria de nós agora? Nem tínhamos idade para trabalhar e buscar nosso sustento. Agora, eu era a adulta da casa, mesmo ainda tendo 11 anos! Era um fardo muito pesado sobre meus ombros e não sabia se conseguiria suportar isso. Apesar de minha insegurança, precisava ser forte para meu irmãozinho. Nada era mais importante do que ele em minha vida.

Felizmente, aquela mesma vizinha resolveu cuidar de nós quando soube o que havia acontecido. Mesmo mudando de casa e não sofrendo mais ameaças de uma mãe alcoólatra, nossa vida não mudou muito, pois o marido de nossa benfeitora não gostou nada de ter duas crianças por lá, principalmente quando o Arthur teve uma crise de riso na sua frente. O coitadinho só estava assustado com aquela muralha com voz de trovão.

Todas as noites, eu rezava para que nossa sorte mudasse. Não era possível que estivéssemos condenados a sofrer pelo resto da vida! Assim que tive idade para trabalhar, arranjei um emprego de meio período como entregadora de um mercadinho do bairro e com o pouco dinheiro que recebia, podia sustentar a nós dois e sair daquela prisão.

Foi difícil ter que voltar para nossa antiga casa, pois cada cantinho me trazia alguma lembrança ruim de nossa infância, mas eu sabia que Deus sempre estava olhando por nós e que um dia, as coisas iriam se acertar.

POR TRÁS DE UM SORRISOOnde histórias criam vida. Descubra agora