Cena 2

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Andava de ônibus a caminho do hotel, Sanji notou nuvens densas se formarem no céu daquela noite e em 5 minutos caiu uma chuva torrencial, desceu do ônibus se protegendo com o casaco esverdeado e com as poucas marquises das calçadas.

Morria de fome quando chegou no hotel moribundo, daqueles bem baratos com quartos cheirando a mofo ou naftalina e ainda decorado com papéis de parede em arabesque. Não havia ninguém, além da recepcionista lendo alguma revista de moda. Sanji se aproximou do balcão.

— Olá, eu gostaria de alugar um quarto.

A mulher atrás do balcão não se moveu e nem deu a entender que se moveria. Ela ajeitou seus cabelos e disse sem tirar os olhos da revista. — Toque o sino.

Sanji a achou estranha e tocou o sino levemente enferrujado, ela largou da revista e se levantou. Porém, assim que viu Sanji sentiu falta de algo. — Cadê o seu pai?

Como previsto, o hotel reconheceu sua idade e Sanji, aflito, apanhou sua carteira falsa e depois deslizou sobre o balcão, a mulher apanhou colocando a mecha do cabelo para trás e revelando seus piercings na orelha. — É falsa.

Sanji deu no pé antes que ela resolvesse chamar a polícia.

Perona chegou em casa, tomou banho e vestiu um pijama. Pensava em assistir netflix debaixo das cobertas quentinhas, aproveitando bem aquele friozinho, mas parou o passo quando esteve em frente à janela da sala, notou que chovia mais que antes quando chegou. Pensou se o rapaz que conhecera no ônibus estaria bem e, caso realmente estivesse fugindo de casa como suspeitava, muito provavelmente não conhecesse ninguém na capital e procuraria por um hotel. Mas temia de não conseguir um quarto, afinal, não estava acompanhado por um responsável e poderia terminar dormindo na chuva.

Por isso Perona deu o seu celular para Sanji. Qualquer problema, ele poderia contatá-la e dormir no seu apartamento, protegido daquela chuva que só engrossava. A garota uma vez já tentara fugir de casa, então foi fácil perceber que Sanji estaria fazendo o mesmo.

Andava debaixo da chuva bem injuriado, procurava por uma marquise para se meter por baixo, pois não retornaria pra casa. Preferia dormir na rua e na chuva do que ter que voltar. No entanto, se lembrou do número de Perona e abriu sua mochila da forma mais destrambelhada possível. Finalmente encontrou uma marquise — Deus parecia estar pegando leve — e correu para debaixo dela, depois pegou no papel e no celular.

Debaixo das cobertas e com o notebook no colo, Perona ouviu a campainha da casa soar. A moça se levantou e foi até a porta para abri-la, encontrou Sanji todo ensopado pela chuva e com uma carinha de um cão pedinte.

— Veio tranquilo? — Perguntou e abriu caminho para o rapaz entrar.

— Sim, o motorista do táxi sabia o endereço. — Respondeu, enquanto entrava e mirava os olhos para baixo. Perona estava com um pijama curto e seu rosto esquentava feito brasa.

Ela piscou os olhos confusa com sua atitude até finalmente entender. Riu. — Minha roupa tá muito audaciosa?

— N-Não! Está perfeita! — Exclamou bem alto e a garota voltou a rir. — Digo, não tem problema, você se veste como quiser! Afinal, seu corpo, suas regras!

Perona desatou a rir. — Calma, não precisa ser tão dramático! — Continuou a rir e Sanji só ficava mais corado, o que era terrível; tinha a pele branca feito palmito e quando estava constrangido ficava bem perceptível por virar um tomate com facilidade. — Vou buscar uma toalha e se sinta à vontade.

— Será que posso tomar um banho?

— Claro!

Quando Sanji foi tomar banho, ele havia esquecido que estava num banheiro de uma garota e levou um susto ao ver absorventes de tudo que é tipo no armário do espelho, uma calcinha de renda sobre a pia de porcelana, maquiagens e perfumes, tudo tão feminino... Por um instante se sentiu invadindo o interior de Perona, já que todas aquelas coisas no banheiro eram tão pessoais. Também era um pouco bagunçado, mas não fazia tanto mal quanto aquela peça de roupa sobre a pia.

Aproximava sua mão aos poucos para pegar aquela calcinha, mas parou antes que uma coisa muito pervertida pudesse acontecer. Sanji nunca se envolvera com alguma garota, e estava naquela idade com os hormônios à flor da pele. Talvez aquela calcinha seria a primeira que via na vida, Reiju não costumava largar suas roupas jogadas assim. No entanto, um barulho na porta lhe assustou.

— Está tudo bem aí? — Era Perona batendo na porta.

— Sim! — Sanji ainda continuava a falar de forma muito exasperada.

— Tem uma calcinha aí, mas ela está limpa. Não pense que eu largo minhas roupas sujas em qualquer lugar, certo?

— N-Não pensei n-ada d-isso, nem tinha v-visto algu-ma calc-cinha.

— Okay. — Não acreditou nem um pouco.

Perona colocou um macarrão no microondas para comerem, pois ela ouviu um ronco sair da barriga do rapaz que ficou muito constrangido. Enquanto esperavam ficar pronto, Sanji pensou que a garota não era muito feminina. Não só o banheiro, mas a casa toda era bagunçada e parecia haver peças masculinas — devia ser de um namorado, o coração de Sanji ficou apertado nessa hora — no meio dos entulhos. Perona também parecia não saber cozinhar, quando preparava comida congelada para o jantar.

— Então, me diga Sanji, por que fugiu de casa? — Perguntou e se sentou na mesa em que Sanji se sentava.

— Eu pretendo trabalhar no Baratie. — Omitiu o outro motivo que era o de não viver mais com sua família.

— O restaurante?

— Sim!!

— Por quê?

— É o meu sonho, eu até mesmo sei cozinhar. Caso não se importe de eu ficar alguns dias contigo, posso cozinhar para você e dessa forma irá parar de comer essas comidas industrializadas.

Perona levantou uma sobrancelha com a audácia do garoto de se oferecer a morar ali e ainda dizer indiretamente que ela não sabia cozinhar.

— Mas, ora, Sanji... Esse apartamento não é meu.

Sanji piscou o olho que não era coberto por sua franja longa. Ele tinha uma franja que só cobria o olho esquerdo por completo. — É de quem?

— É do meu irmão, ele permitiu que eu ficasse aqui por um tempo. — Perona ouviu o microondas apitar e se levantou. — A propósito, você irá dormir no quarto dele hoje. Se eu me lembro bem, ele disse que dormiria fora essa noite.

Sanji acenou positivamente e um pouco receoso, algo lhe dizia que isso não iria terminar bem. — Okay

— Agora vamos comer!!! — Colocou o macarrão, ainda na embalagem, no centro da mesa.

Chegado a noite, Perona trocou a roupa de cama de seu irmão por outras limpas. Disse a Sanji que se houvesse algum problema, era só chamar e largou o quarto.

Sanji deitou naquela cama de casal e não achou o colchão ruim, na verdade, era até melhor que o dele. Resolveu virar para o lado da parede e adormeceu.

Porém, não contava que sonharia com Perona e aquele pijama extremamente curto, que o loiro achou realmente audacioso. Sua mente maliciosa ainda fez com que a garota estivesse com a calcinha de renda em vez do short. Ela se aproximou dele e disse "estou apaixonada por ti, por isso dei meu telefone". Emocionadíssimo — ou excitadíssimo — pegou nas mãos macias da bela garota.

— Eu também te amo, Perona-chan!!!

— Quem é você? — A garota disse, mas com um timbre grave. Sanji estranhou e acabou acordando, dando de cara com um rapaz; um rapaz de cabelo estranhamente verde. Conseguia vê-lo pela luz que a cidade emitia da janela e por isso também via sua expressão de confusão. No entanto, olhou para baixo e notou que sua mão agarrava a dele e não a de Perona.

Deu um berro de susto. Um homem estranho estava deitado ao seu lado. Um homem marimo.

Only  (reescrita)Onde histórias criam vida. Descubra agora