Dark

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Neymar costumava escrever em um pequeno caderninho antes de dormir, mas que fique claro que não era um diário. Ele odiava que dissessem que ele escrevia um diário. Era mais um caderno de lembranças. Lá ele escrevia frustrações, alegrias e, de vez em quando, até alguma receita que nunca faria, pois era preguiçoso demais para isso. Ele batia a caneta sobre a mesa freneticamente, não sabia o que escrever. Quando ele estava assim, normalmente ia dormir sem escrever nada. Mas ele sentia que devia escrever alguma coisa. Uma frase qualquer ou um pequeno resumo, ele não sabia. Só queria por algo para fora e sentir-se mais leve e dormir em paz. A conversa com Richarlison tinha ajudado ele a se sentir bem, isso era verdade. O camisa dez sorria sempre que lembrava do jeito bobão do amigo, mesmo que isso o lembra-se de Pombo pelado. Era engraçado, a cena foi inusitada e acabou por pegar Neymar de surpresa, mas agora ele apenas se divertia com tudo e apenas fingia que tinha sido algo comum.

Não foi. Não mesmo.

Era um pouco estranho estar em um país tão diferente do seu, lutando por um sonho que tem consigo desde o momento que começou a jogar futebol. Neymar era um jogador experiente, sabia disso. Tinha certeza que era bom e tinha capacidade para ganhar, mas a pressão era algo surreal naquele momento. Ele sequer conseguia abrir seu Instagram e interagir um pouco com os seus seguidores, sentia certa ansiedade só de imaginar os comentários falando de sua índole. A vitória contra a Coreia do Sul tinha feito bem para ele, sentia como se estivesse mais leve e satisfeito em relação a si próprio, mas os acontecimentos na entrevista tinham mexido um pouco com ele.

Ele era humano afinal.

Embora soubesse do seu valor, críticas o abalaram de vez em quando. Normalmente quando ouvia algo muito pesado sobre si, Neymar jogava. Saía de madrugada apenas  para chutar a bola, sem de fato treinar. Veja bem: Neymar não era um poço de maturidade. Ele tinha explosões com críticas, chegou a brigar com vários do mesmo ramo. Isso ele não pode negar, mas era difícil manter a pose ou a sanidade estando no foco do mundo. Tudo isso colaborou para a imagem de mimado que carrega, mesmo que às vezes ele julgue injustas as críticas que recebe e mesmo não podendo competir com as inúmeras pessoas que o julgam, ele tentava dar o seu melhor. 

Se levantou de onde estava sentado, soltou a caneta e o caderno fechado na mesinha do seu quarto, olhou ao redor procurando sua toalha e entrou no banheiro para tomar um banho. Era a única coisa que pensava que o deixaria menos tenso. Não foi um banho demorado dessa vez, mas ele sentia que estava mais relaxado para escrever alguma coisa.

Ou achava.

— Pode trazer um chá onde estou? — Falou segurando o telefone.

Uma coisa indecifrável foi ouvida.

— Tá, Portuguese? Spanish? Francês? — Gesticulava falando com o objeto do hotel em suas mãos. — Algum idioma? Por Deus...

Ele riu lembrando de Richarlison, o amigo tinha dito algumas vezes que o menino Ney devia aprender mais línguas, ou se dedicar de fato no que era proposto pelo Paris, mas Neymar achava perda de tempo porque sempre tinha um intérprete ao seu lado.

O lado bom de ser rico.

Voy Hablar slowly, tá bem? — Fez uma cara estranha de vergonha alheia. — Tea? I want a cup of tea. É isso né? Puta merda eu acho que não é. Mas é o que eu quero, ok?

Desligou.

Trinta minutos depois ele conseguiu seu chá, mas não era um chá para relaxar ou saborear. Era um chá verde como capim, amargoso como alho e fedorento como uma sopa estragada. Sim, ele recebeu um chá para quem estava doente, ou com uma infecção horrível na barriga. Riu descontroladamente de sua mancada, como se tivesse conseguido a proeza de pagar o maior dos micos possíveis. Entornou o chá na privada e voltou ao quarto para escrever o acontecimento em seu caderno. Foram poucas linhas, mas foram as mais divertidas que podia escrever.

Anti-hero | Neymar & Richarlison Onde histórias criam vida. Descubra agora