CAPÍTULO 26

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SARAH


Ligo as luzes da sala quando eu entro em casa e tudo parece um breu, apenas a vela acesa que a mamãe costuma acender para o anjo dela todas as vezes que algo está errado. Isso já me deixa com um pé atrás, mas sigo para a cozinha, que está com todas as lâmpadas embutidas ligadas e as da escada também. Está muito estranha a situação, por isso fico um tempo parada, tentando entender o que está acontecendo.

Passos brutos de alguém descendo os degraus me faz virar. A minha mãe com um enorme saco de lixo preto nem segura no corrimão para descer, apenas passa reto em direção a porta da entrada.

Que porra...

Meus olhos caem diretamente na capa do meu disco dos Beatles que está perfurando o material fino do saco, então consigo ver que é extremamente familiar aquela capa e que sou a única que coleciona discos de vinil.

— Ei! — Começo a correr para alcançá-la que já está do lado de fora, indo na direção da lixeira que temos para colocar o lixo da semana todas as sextas-feiras. — Mãe!

Eu devo ter colocado meu disco jogado e ela pensou que queria jogar fora. Sou bagunceira demais, não é possível distinguir lixo das minhas coisas.

— Mãe, espera, o meu disco não. — Paro sua mão com a minha antes dela jogar o saco na lixeira, mas mesmo assim ela continua e ele se arreganha com a queda e me possibilita uma visão melhor de tudo lá dentro. — O que...

— Cansei. Fiz um limpa. — Fala para mim com uma expressão passiva, como quando me dá um conselho para fazer a comida certa.

— Oi? — Sem querer o meu tom sai grosseiro.

— Você começou faculdade de direito, por isso vai precisar de espaço. — Cruza os braços. — Além do mais, precisa focar nos estudos ao invés de arrumar brecha para a música.

No saco tem cordas dos meus instrumentos, meus cadernos de composição, camisetas que fizemos para a banda anos atrás, cartas de fãs, algumas roupas para apresentações e várias outras coisas que são importantes. Olho novamente o saco, encontrando um violão de brinquedo que ganhei quando criança, ele é daqueles que nem sai um som de verdade e é todo de plástico que custa menos de cinquenta notas.

— Mãe... esse violão... — Pego ele que está por cima de vários cadernos meus, agarro o cabo com força e analiso o brinquedo um pouco velho por causa do tempo. — Compramos na nossa primeira viagem em família...

A lembrança do tamanho da minha empolgação andando pela areia da praia, bem na frente tinha um homem com várias bugigangas e esse violão estava no meio de tudo, quando bati os olhos me apaixonei. Lembro-me que ainda não tinha muita intimidade, me sentia péssima por ficar pedindo alguma coisa ou só aceitando, mas o meu pai viu em que direção estava meus olhos, então o comprou para mim.

— Mãe. — Repito, tentando não chorar na frente dela. — Não mexa nas minhas coisas e não decida o que precisa jogar fora. — Falo quando levanto o olhar para encará-la, a raiva sai em formas de palavras, cuspo tudo para fora com as lágrimas embaçando a minha visão.

— Sarah, por favor, não aja como uma criança. — Diz como se eu fosse uma burra que não entende nada, até fala pausadamente. — Já cansei de agir com palavras, tentando explicar as coisas, mas vi que não dá certo agir assim com você. Agora vou começar a fazer as coisas.

— O que a música tem a ver com o direito? — Cerro os olhos, fazendo meu choro descer para o lugar de onde veio. — Eu já estou fazendo o que me pediu, não estou? Deixa as minhas coisas quietas. A senhora não trabalha e mesmo assim pratica dança?

Antes de Você Dizer Te Amo - Eva RabiOnde histórias criam vida. Descubra agora