As lágrimas caem-me pelo rosto, enquanto leio o que está escrito no pedaço de papel. Nunca tive demonstrações de afecto, muito menos um homem disposto a chamar-me de Rainha. A sua Rainha!
Tiro os sapatos da caixa, para os observar melhor. O salto aparenta ser um bocado alto, mas farei um esforço. São brilhantes, e são o meu número. Não faço ideia de como descobriu ele qual o meu número, mas não consigo deixar de sorrir com o gesto.
— Só espero não fazer figuras tristes em cima disto. — lamento.
Pouso os sapatos na cama, para ver bem o tipo de vestido que ele espera que use. O tecido é extremamente fino ao toque, com brilhantes todos prateados e, para meu extremo espanto, este deixa-me as costas completamente expostas.
O terror percorre-me o corpo todo, não quero que ninguém veja a cicatriz que ocupa a totalidade das costas, terminando na cintura, bem na minha barriga. Quando tinha apenas 10 anos, aquele monstro tentou matar-me numa noite de bebedeira, só porque lhe pedi algo para comer. Como resposta, achou que uma catana era o objecto ideal para me calar. Mas, em vez de me deixar morrer, terminando assim com o meu suplício, decidiu tratar-me. Só para me continuar a torturar, até eu ter fugido, há 3 anos atrás.
Não mostro o corpo desde então. Temo os olhares de desaprovação das pessoas. Até os SEUS olhares.
Respiro fundo.
Tenho que usar um casaco que fique bem com a escolha de Joong Ki, para que ninguém saiba que sou uma fugitiva, vinda de uma família de torturadores de crianças.
— Nem sequer posso usar soutien com este pedaço de tecido! — reclamo. Por mais que esteja muito confiante com o micro vestido, não posso recusar um presente de um chefe da Máfia. Ainda corro o risco de virar a sua próxima vítima.
Decido levantar-me da cama e preparar-me ara o regresso do meu belo mafioso, que me conquistou sem sequer ter tido o devido tempo para o conhecer.
Inspiro.
Expiro.
Dirijo-me até à casa de banho, para tomar um duche, lavar a alma e as manchas de sangue das pernas. Estou envergonhada, mas ele não se queixou uma única vez. Não me ofendeu, não teve pressa e não me julgou por ainda ser virgem. Achava que os mafiosos não passavam de assassinos impiedosos, mas estava bem enganada.
As questões que me consomem desde o primeiro momento são: porque contrataram a Máfia para me encontrar e, mais importante que isso, porque se deu, o chefe da Máfia, ao trabalho de me encontrar pessoalmente?
Não sei se realmente quero saber a resposta a estas questões.
Abro a torneira da água quente e deixo-a a correr uns segundos, até esta estar quente o suficiente para eu entrar na banheira.
Permito que a água me caia sobre o corpo, relaxando cada músculo. A água quase me queima a pele, mas não me incomoda, até porque já fui torturada com água ainda mais quente que isto, deixando-me uma cicatriz na perna esquerda. Mas não é do mesmo tamanho que o corte nas costas, suponho que não fará muito alarido ter as pernas à mostra na tal festa.
Não me demoro muito no duche, pois não sei a hora exacta que me vêm buscar. E gostaria de fazer uma maquilhagem digna do outfit estendido na cama. Cama essa que precisa ser trocada, não vá alguma pessoa achar que houve ali alguma morte. Mas porque raio têm as mulheres que sangrar para perder a virgindade?
Se perco tempo a pensar em disparates, não terei tempo para nada e não se pode deixar um mafioso à espera.
Vou até à pequena cómoda de madeira preta, com um grande espelho oval com uma moldura na mesma cor da cómoda. Em cima do tampo, tenho alguns produtos de maquilhagem, que espero ser suficiente para transformar este rosto banal num rosto digno de uma Rainha da Máfia. Quero desempenhar bem este papel, enquanto este sonho durar.
Olho para o meu reflexo, não o reconhecendo. Por mais que saiba que me estou a encarar, não consigo ver a mesma pessoa do dia anterior. O cabelo preto, por baixo da toalha enrolada na cabeça, os olhos amendoados e castanhos, o nariz fino por cima dos lábios rosados e ainda inchados dos beijos trocados ontem. As maçãs do rosto coradas da lembrança dos nossos corpos entrelaçados e dos seus dedos acariciarem-me a cicatriz desde as costas até à cintura.
Como posso evidenciar esta nova beleza, quando nem eu sei como pude ter mudado tanto de um momento para o outro.
Inspiro.
Expiro.
Repito o processo para me acalmar.
Desço o olhar até aos produtos de maquilhagem e decido fazer algo discreto, que me realce o olhar e, em homenagem aos sapatos vermelhos, vou usar um batom da mesma cor.
Terminada a maquilhagem, tiro a toalha do corpo e vou até à cama, para colocar o vestido. Este recai-me sobre o corpo como uma luva. Observo-me novamente no espelho e quase deixo cair o queixo no chão. Como pôde o vestido assentar-me tão bem?
Engulo em seco.
Preciso focar-me , não quero derramar uma lágrima que seja e estragar a maquilhagem que deu trabalho a fazer. Mas terei que agradecer a bondade deste gesto mais tarde.
Decido deixar o cabelo liso e solto, para dar um ar mais adulto a todo o visual.
— Agora falta encontrar um casaco que me proteja as costas. — digo a mim mesma.
Estou bastante confiante dos meus feitos, só espero que Joong Ki goste de me ver na roupa escolhida por si. No pequeno roupeiro, acabo por escolher um casaco branco de pelo, perfeito para o vestido e, mais importante, para não existirem olhares indesejados. Nem perguntas que não quero responder.
Respiro fundo.
Estou a preparar-me para trocar a roupa da cama, quando 3 fortes batidas na porta me fazem o coração acelerar como um louco. Penso em todos os piores cenários, menos em Joong Ki a vir buscar-me para a tal festa, como prometido no bilhete. Nem sequer tenho noção da hora, para ser honesta.
Permaneço imóvel, não quero abrir a porta a quem quer que ali esteja.
Mais 3 batidas e o pânico instala-se em mim.
— Menina Adriana? O senhor Joong Ki aguarda-a no carro. — diz uma voz masculina, num tom sereno e tranquilizante. Quase como se tivesse conhecimento do meu medo e me assegurasse que estou segura.
Respiro fundo.
Há um alívio que me percorre o corpo, por saber que ainda me encontro a salvo. Pelo menos, enquanto o conseguir entreter.
Caminho devagar até à porta, abrindo-a com algum receio. O homem que me espera é da mesma altura do chefe, o cabelo igualmente escuro e muito bem penteado. Ao contrário de Joong Ki, o capanga à minha frente não é asiático e tem olhos claros. Ara ser honesta, , não presto grande atenção ao físico do homem.
Aceno-lhe com a cabeça, ao mesmo tempo que me dirijo para o exterior da cabana. Pergunto-me se voltarei a entrar nela depois desta noite.
O homem indica-me o caminho, sem proferir uma palavra. Isso dá-me algum conforto. O silêncio é sempre a melhor opção quando não existe nada para se dizer.
Não demoramos a chegar ao carro preto, com os vidros escurecidos, o típico carro de filmes sobre a Máfia e criminosos de alta patente. Sou conduzida até à porta traseira, onde sou recebida por um Joong Ki de sorriso demasiado sedutor no rosto.
Assim que os nossos olhares se encontram, sinto a cara ferver e quase me desequilibro a entrar no carro, mas o homem que me acompanhou impede a queda.
Dava tudo para me enfiar num buraco neste preciso momento.
— Estás linda, Adriana. — perco as forças no corpo com o elogio.
— O-obrigada. — gaguejo.
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Amor Feroz
Short StoryEle é um mafioso coreano, que a procura há 2 anos. Quando a encontra, as coisas desenvolvem-se rápido! Ela, vive escondida de um tio que a torturou grande parte da vida, numa cabana remota, perto de um lago. Quando ele aparece onde ela está, a ponde...