Ruggero
Hospital Geral de Florença
Horas depois
Finalmente o efeito da anestesia que me deram para
poderem operar meu braço passou. Pelo que soube através do
cirurgião, o tiro foi muito menos grave do que se supunha. Mais um
pouco para o lado e poderia ter sido considerado somente de
raspão.
No fim de tudo, o que importa é que a essa altura, aquele
filho da puta que matou o meu sobrinho está nos braços de
Satanás.
Olho para a janela do hospital, pensando que no fim, deu
tudo certo. Se tivéssemos chegado alguns minutos mais tarde, meu
irmão agora poderia estar vivenciando outra tragédia ao perder a
esposa e a filha, Paola, que eles estão esperando.
A enfermeira me trouxe o telefone celular há cerca de cinco
minutos para que eu pudesse falar com a minha mãe. Ela não tem
se sentido bem há dias e não pode vir me visitar, mas disse que
precisava ouvir minha voz.
O segredo que ela insistiu tanto para que eu guardasse —
que está com câncer em estágio inicial — acabou sendo aberto para
toda a família.
Há cerca de uma semana eu lhe perguntei por que ela me
pediu algo assim. Meus irmãos tinham direito de saber também.
A resposta me enlouqueceu: ela não queria que eles
julgassem mal nosso pai por não poder estar o tempo todo ao seu
lado nesse momento tão difícil.
O destino quis que naquela mesma noite, através de
conhecidos em comum, que eu descobrisse não só que ele estava
separado de Carina, como também a mãe de Benito havia entrado
com um pedido de divórcio.Na verdade, eu precisei de somente uns poucos minutos para
descobrir que o filho da puta já tinha uma nova namorada oficial e
estava viajando com ela pelo circuito Itália-Paris-Londres.
Não sou um cara frio. Meu sangue italiano, para o bem ou
para o mal, sempre acaba emergindo e naquele instante, cheguei ao
meu limite.
Fui à casa da minha mãe, a mulher que apesar de eu não
conseguir entender as escolhas que fez ao longo da vida, amo
incondicionalmente, e contei não só que Carina pediu o divórcio,
como lhe mostrei em meu celular um site de celebridades europeias,
em que Bruno aparecia aos beijos com uma garota mais jovem do
que Chiara.
Foi a coisa mais difícil que eu já fiz na vida.
Por todo o tempo que serviu como estepe para aquele infeliz,
minha mãe nenhuma vez chorou pelas ausências dele ou mesmo o
acusou de ser um canalha — coisa que todos nós filhos,
achávamos.
Ao contrário, se qualquer assunto surgisse em que o nome
de Bruno pasquarelli fosse sequer levemente tocado, ela o defendia.Eu não fazia ideia de qual seria sua reação quando visse
aquelas imagens dele com outra mulher; se iria me odiar ou me
mandar embora de sua casa. De uma coisa, no entanto, eu tinha
certeza: ver aquelas fotografias nunca lhe faria tanto mal como ela
fez a si mesma durante todo o tempo em que ficou à espera de que
ele mudasse de ideia e a escolhesse.
Eu achei que estava preparado para qualquer coisa que me
dissesse, mas ela não me agrediu. Somente chorou e disse: eu
nunca serei a escolhida dele.
E assim, depois de mais de trinta e cinco anos à espera de
ser amada pelo homem que só fez pisar em seu coração, ela
finalmente entendeu que o problema jamais foi Carina, Benito e
Chiara, as pessoas a quem odiava e culpou, e sim o próprio Bruno .
Percebeu que se Carina não tivesse pedido o divórcio, ele
continuaria visitando as duas, destruindo a vida de suas mulheres
enquanto se divertia com tantas outras.
Eu não sei por quanto tempo a segurei em meus braços,
enquanto desabafava sua mágoa.
Por anos, tive raiva até mesmo dela, por permitir que ele a
tratasse daquele modo. Foi preciso vê-la quebrada, doente, em um
momento de maior fragilidade de sua vida, para finalmente entender
que mesmo que aquele sentimento que ela nutria por Bruno fosse um
veneno para sua alma, ainda assim, era amor.
No dia seguinte, chamamos meus irmãos em casa e
contamos sobre o câncer. Juntos, decidimos que nunca nos
ausentaríamos da Itália todos ao mesmo tempo. Sempre teria que
haver um de nós por perto caso mamma precisasse.
O médico me disse que o câncer de mama dela, no
momento, é tratável, porque foi descoberto logo no início. A cirurgia
foi feita há cerca de quinze dias, antes que meus irmãos soubessem
porque ela não me deixou contar e agora haverá também a
necessidade de algumas sessões de radioterapia.
Bruno tentou visitá-la depois que tivemos aquela conversa e
ela descobriu que ele já estava com outra, mas dessa vez, minha
mãe se recusou a recebê-lo.
Eu nunca imaginei que ela diria não àquele infeliz, ainda mais
estando tão frágil.
Nunca precisamos dele para nada — as três famílias são
muito ricas: a dele, a de Carina e a nossa — e no momento em que
minha mãe disse que não o queria mais por perto, sua vontade para
mim se tornou lei.
Dinheiro jamais foi problema, mas sim, sermos apontados
enquanto crescíamos, como filhos bastardos de uma mulher que se
tornou amante do marido da melhor amiga.
Alguém bate na porta e dois segundos depois, ela se abre.
Benito fica parado no umbral, me encarando.
Quando o médico perguntou qual dos meus irmãos eu queria
ver primeiro, não tive dúvida.
— Não deveria ter feito aquilo. Foi idiota da sua parte — diz.
— Imprudente, talvez. Não idiota. Além do mais, não fiz por
sua causa. Luna é muito jovem para ficar viúva e minha sobrinha
merece ter o pai ao lado.
Ele cruza o espaço entre nós e para perto da cama.
— Um inferno que não fez por minha causa.
Eu o encaro, nem um pouco disposto a ceder. O orgulho é
uma característica forte nos pasquarelli.
— Obrigado — diz, oferecendo a mão e eu hesito somente
por um segundo antes de aceitar. — Estou cansado de continuar
alimentando tantos anos de mágoa, Ruggero de Não digo que tudo o que vivemos até aqui será esquecido da noite para o dia, mas eu
quero deixar o passado para trás.
— Sua família nunca vai concordar com isso.
— Não posso falar por minha mãe, mas sabe o quanto Chiara
jamais quis que ficássemos separados. Quem sabe um dia todos
nós possamos nos entender.
Sei que para Carina será muito difícil perdoar. Por várias
vezes, minha mãe a ofendeu quando se encontravam
ocasionalmente.
Eu não sei porque as mulheres sempre põem a culpa uma na
outra ao invés de apontar o dedo para o verdadeiro bastardo: o
homem que lhes devia respeito.
— Não posso falar por meus irmãos, mas estou de acordo
sobre deixar o passado onde ele pertence — digo.
— Luna pediu para que lhe agradecesse também e disse que
virá visitá-lo. Eu a mandei para casa com Chiara.
Aceno, concordando.
— Se está pensando que por conta do que aconteceu,
seremos melhores amigos, pode esquecer — resmungo e ele
quase sorri.— Isso nem passou pela minha cabeça. Agora, deixe de ser
preguiçoso e trate de melhorar rápido. Sua sobrinha nascerá em um
mês e sabe como as mulheres com nosso sangue podem dar
trabalho.
Vira as costas para ir embora, porque mesmo que tenhamos
muito o que dizer um ao outro, não acontecerá em um passe de
mágica.
— Benito ?
Ele para de andar.
— O que foi?
— Não me importa que você seja somente meu meio-irmão.
Paola será minha sobrinha e protegida por mim para o resto de
nossas vidas.
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Segunda Chance
FanfictionUma garota com um passado corrosivos. Um ex-galinha com cicatrizes externas e internas. Um amor que pode salvar ambos... ou destrui-los de vez.