Acidentes não acontecem

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  Véspera de Natal.

  Há um ditado popular que diz "Diga com quem tu anda e eu direi quem tu és". Esse ditado quer dizer que podemos julgar o caráter de uma pessoa baseado em suas companhias. Muitas pessoas discordam desse ditado, porque boas pessoas não necessariamente estão distantes das pessoas más. Às vezes, é inevitável, apenas.

  Às vezes, andar com uma pessoa má, não vai torná-lo mau. Pode ocorrer de você ser uma boa influência para essa pessoa. É o que acontece muitas vezes. Aziraphale sabia muito bem disso. Ele vinha notando certas atitudes novas de seu melhor amigo. Como se Crowley estivesse virando um molenga, assim como ele. Não que ele achasse que o demônio tivesse sido realmente mau em algum momento.

  — Quais são as regras? — perguntou o ruivo, após voltar da bilheteria do play park.

  Apesar de ter vários parques de diversões espalhados pela cidade, a maioria abria tarde, então a escolha da vez foi um parque no shopping, que misturava brinquedos tradicionais com jogos de videogame. Diferente do receio de Aziraphale, as crianças adoraram as opções.

  — Não sair de vista — responderam Rafael e Pedrinho, em uníssono.

  — E ter cuidado para não se machucar — acrescentou Aziraphale.

  Crowley entregou o cartão de ingresso para Rafael.

  — Aí. Cuida do seu irmão, hein? Não quero ver ninguém com a cabeça rachada no chão.

  — Tudo bem.

  — Eu e o anjo vamos esperar na área de alimentação.

  — Mas eles só deixam entrar no carrinho de bate-bate com um adulto — resmungou Pedro Henrique, a voz chorosa.

  — Então não entre no carrinho de bate-bate — propôs Crowley, simplesmente.

  — Mas o carrinho de bate-bate é o brinquedo mais legal daqui. — Pedro juntou as mãos, suplicante.

  — Não era a montanha-russa?

  — Uma rodada não vai fazer mal — interviu Aziraphale, um pouco nervoso. — Adrenalina, Crowley. Você não gosta?

  O demônio ponderou por alguns segundos, percebendo que havia desenvolvido certa habilidade, ao longo dos séculos, em dizer "não" para um par de olhos pidões. Mas dois pares de olhos pidões, bem, essa era a sua ruína.

  — Argh... Tá.

  — Eeeeeeeh! — O menino pulou até Crowley para abraçá-lo.

  — Hm, tá bom. Vamos logo, antes que eu desista.

  O quarteto decidiu que aquele seria o primeiro brinquedo do dia (também porque seria mais seguro que Aziraphale brincasse de barriga vazia). Os dois times foram divididos: Crowley e Pedro, contra Az e Rafael. Não havia prêmio. Sequer havia alguém contando pontos, mas o espírito de competitividade estava aflorado.

  Os 10 minutos que se passaram foram como se Crowley e Aziraphale descontassem os últimos 6 mil anos de raiva em batidas poderosas, enquanto as crianças riam da sensação de seus cérebros balançando. Claro que as outras pessoas do brinquedo não estavam imunes, e algumas até tentavam se vingar.

  A área de brincadeira havia se tornado uma carnificina metafórica para os adultos, e uma grande fonte de diversão para as crianças.

...

  — Eu não me libertava assim há tempos! — aspirou Aziraphale, colocando sua bandeja de lanches na mesa da praça de alimentação. — Deveríamos fazer mais vezes.

O casal inefável de fériasOnde histórias criam vida. Descubra agora