07.

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O som dos galhos de uma árvore batendo contra a janela fizeram Newt acordar, mas diferente do comum, ele não despertou em um pulo assustado. Seus olhos abriram lentamente, não estava tão frio e até mesmo alguns raios solares davam sinais pelo chão.

A paz e silêncio estabelecida no quarto contrastava na confusão mental que começava a surgir no rapaz conforme ele tomava consciência. Não sentia dor, mas os flashes da noite anterior eram estranhos e desconfortáveis... aquele breu completo, o fulgor que ardia em seus olhos, o som de partes do corpo quebrando e a sensação de estar sufocando dentro de si mesmo.

O medo voltava a gelar seus ossos, se antes não possuía algum nível de claustrofobia, havia desenvolvido e muito.

Ao mesmo tempo aquela voz baixa e rouca agia feito uma onda tranquilizante, tinha certeza que nunca havia escutado antes, ainda parecendo tão familiar. Parecia que sua mente pregava peças quase o tempo todo e não teria porquê ser diferente dessa vez, mas o fato de ter conseguido finalmente dormir bem após aquele episódio o deixava encabulado.

Um impulso fez o loiro se espreguiçar rapidamente e levantar, nem havia parado para olhar o celular ou algo do tipo. Respirou fundo e logo notou em sua mesa de cabeceira um bilhete rosa, ele teve certeza instantaneamente que aquilo era coisa da sua irmã.

"Parece que você teve um dia (e uma noite) difícil,
então achei melhor não te acordar.
Tem muffim pro café, se cuide.
Amo demais você!

Com amor, Sonya :)"

Ele riu, mas percebeu então que não era tão cedo quanto imaginava. Seu celular marcava quase onze horas da manhã, não conseguiu se preocupar o suficiente com a ideia de recuperar as aulas perdidas, apenas queria um moletom confortável e um muffim com mel.

Virou-se para o guarda-roupa, em busca do artigo de lã que talvez fosse seu favorito de todos. Um arrepio estranho passou por sua nuca logo após a peça de roupa entrar em seu corpo, não era um clássico arrepio de frio, era o tipo que Newt já conhecia muito mais. Sua visão periférica localizou algo no batente da janela.

O loiro fechou os olhos, sua mente brigava entre "Não olhe, Newt" e "Nunca tem nada, olhe logo". O desconforto descia por sua espinha e se alastrava no estômago em um nervosismo dolorido.

Seu corpo agiu rápido e quando percebeu, encarava o vulto que não era mais uma mancha escura e disforme, mas sim uma pessoa.

O par de olhos castanhos escuros o arrebataram e a vontade de gritar pelo susto ficou apenas trancado em sua garganta, parecia que mãos seguravam seu rosto o impedindo de soltar qualquer som.

— Não surte, até porque não vai adiantar nada. — Ele falou com muita tranquilidade, o que o deixou mais desesperado. — Vamos conversar, isso nem é novidade na sua vida, Newt.

A pressão sobre seus lábios lentamente sumiu, seu peito ainda subia e descia de agonia. O garoto (ou homem, talvez fosse mais apropriado) era mais baixo do que ele, usava uma malha grossa preta, com gola alta. Os jeans eram desgastados assim como os coturnos pretos, que lembravam botas militares. Era atraente, tirando a parte de ter surgido das sombras.

— Está bem? — Perguntou, o tom de voz ainda sereno, sentado no apoio de madeira com os braços cruzados.

— Vamos do começo, quem é você? — As palavras formuladas saíram como de uma criança que aprende a falar. — E como você chegou aqui? E de onde você veio? E de novo, quem é você? Ah, e como você sabe meu nome? Eu te conheço?

A gagueira era rápida e fez o outro dar uma risada nasalada.

— Okay, vamos do começo. — Ele pulou do batente, se aproximando um pouco. — Meu nome é Thomas.

Outra sensação gelada girou no estômago do loiro.

— Eu fiz mais perguntas. — Pontuou.

— Sei como se chama por outros motivos, mas a toalha com seu nome bordado feito pela vovó ajudou. — Ele deu de ombros. — Mais alguma pergunta?

— Literalmente te fiz umas outras três ou quatro perguntas. — Cruzou os braços com certa indignação, Thomas chegava mais perto e o deixava cada vez mais inseguro também.

— Como eu imaginei, que ótimo! — Ele o ignorou, caminhando de um lado ao outro. — Eu até que estou te achando um cara interessante, não costumo interagir de verdade com muitas pessoas.

— Obrigado, eu acho? — Franziu o cenho, se aproximando sem nem notar. — É sério, como você entrou aqui?

O moreno parou onde estava, virando-se novamente para Newt. Ele fitava o loiro sem desgrudar por um segundo se quer e a sensação de eletricidade o percorreu, conhecia aqueles olhos.

— Ah, você. — Disse baixinho. — Era você ontem, não?

— Surpresa. — Sorriu ladino.

Newt não conseguia se sentir assustado, e talvez isso fosse um pouco apavorante, causando um complexo total dentro de si, mas o que realmente não entendia era como aquilo havia acontecido. Mais do que isso: como era possível.

Ele observou a janela onde o tal Thomas estava, observou o quarto todo, o garoto surgiu do além. Além disso, por que diabos ele havia entrado ainda na noite passada?

— Por favor, eu quero entender o que está acontecendo comigo. — Ele pediu após um longo suspiro.

O moreno se aproximou mais, agora sua expressão era séria, como quem não queria exatamente falar sobre aquilo, mas precisava e sabia disso.

— Você sempre foi assim, mas em algum momento as coisas se acentuaram, certo? — Colocou a mão nos bolsos, não parecia confortável. — Vultos, algumas vozes estranhas, sonhos que não faziam sentido, ver coisas em lugares onde elas nunca realmente estiveram, além de se sentir mais esgotado e até doente do que a maioria em alguns ambientes.

— Como sabe? Você também passa por isso? — Seu olhar era desesperado, buscava respostas a tanto tempo.

O outro parou por um segundo, encarando o chão.

— Não, eu era como qualquer outra pessoa. — Deu de ombros. — Não era como você.

A reação do loiro foi inesperada até para Thomas, ele caminhou até sua cama e se sentou, segurando a própria cabeça com as mãos. Uma pequena mariposa branca entrou pela fresta da janela, pousando exatamente na cômoda ao lado de Newt, que a encarou com uma sensação assustadoramente tranquila. Ele devia ter medo, não sabia porque não o sentia.

— Você está morto, não é? — A pergunta atravessou o moreno como uma adaga, mas apesar da surpresa, ele se sentou ao lado do mais alto.

— Nunca, em toda minha morte essa foi a primeira reação que alguém teve. — Riu sem muita graça. — Não sou o primeiro, certo?

— Não é, mas eu nunca consigo me recordar de detalhes, acho que foi minha cabeça aos dez anos tentando me proteger e apagando o máximo possível do que aconteceu. — Seu olhar era pesado.

Thomas se sentia mal por ele, não podia imaginar como era conviver com o fato de nunca estar sozinho por tanto tempo.

— Eu não sei quem ou o que apareceu para você antes, mas sei porque estou aqui nesse momento. — O tom do mais baixo também não era alegre.

— E pode me responder o motivo?

Os dedos de Thomas passaram a poucos centímetros do rosto de Newt e sem qualquer comando do próprio corpo, seus olhos se fecharam, mas segundos antes ele pôde ver a íris do outro se tornar completamente branca e translúcida.

Parecia que havia sido transportado para aquele mesmo Nada de seu sonho passado, mas logo a forma de um sorriso maldoso surgiu, com dentes brancos e alinhados que se transformaram então em um par de olhos azuis, tão azuis que eram incômodos e o encaravam, como quem persegue uma pequena formiga com uma lupa contra o sol.

— Porque alguém quer você morto, Newt. — A voz de Thomas ecoou por todos os lados.

my sweet fallen angel | newtmasOnde histórias criam vida. Descubra agora