CAPÍTULO 37

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Gabriel se postou à janela e ficou observando a mulher morena jogar a cabeça para trás para que o sol banhasse seu rosto. Claudia. Ou Celeste, que era o nome real dela. Gabriel ficava admirado da necessidade que algumas mulheres tinham de viver mais de uma vida. Celeste devia ser o nome de um período da vida dela, Claudia, um nome mais bonito, mais vibrante, aberto, com certeza era o de outra fase. Mas se ela fosse buscar o significado do nome Claudia, saberia que significava côxa ou manca, ainda que fosse o feminino do nome de um imperador. Já Celeste era referente a céu. Coisa que ela não parecia ter interesse.
"O que está fazendo?" Michael apareceu no quarto, Gabriel apontou a mulher.
"Você fode agora, pelo que fiquei sabendo. Ela é bonita. É uma das de Candid?" Gabriel fez o que ele sempre fazia antes, quando eles ainda moravam com o pai deles e o encarou em silêncio. Michael não o desapontou:
"Eu não tenho como saber, tenho? Não sou adivinho!" Gabriel continuou encarando Michael em silêncio, Michael ergueu as mãos para o céu.
"Tá. Eu conheço ela. Seu nome é Claudia, o pai era um detetive barra vigarista barra idiota. Ela é irmã de Celina, não é?" Ele perguntou, Gabriel sorriu. Nunca falhava.
Gabriel não tinha muita paciência com Michael, nunca teve. Ou carinho de irmão. Amor? Talvez, ainda que não fosse o amor de Joe e James por exemplo. Gabriel sempre se sentiu superior a ele. A consequência disso foram os filhotes de Vengeance espalhados pelo mundo. Isso era algo para jogar na cara de Vengeance em alguma oportunidade.
"E você? Você ainda fode?" Gabriel perguntou, ainda que já imaginasse a resposta.
"Às vezes eu tenho sorte e uma fêmea dorme comigo. Justice não me obriga a ficar isolado. E, é claro, há o Candid."
Gabriel se surpreendeu de seu irmão ter contato com as fêmeas em Homeland, mas fazia sentido. Michael não fez mais mal a eles que Gabriel e eles perdoaram Gabriel, não iriam tratar Michael pior. Já o fato dele usar os serviços de Candid, só provava que ele era um idiota.
"O quê? Você também usa as garotas dele." Gabriel não respondeu.
Ele não 'usava' as garotas de Candid, elas prestavam um serviço para ele e só. Mas não iria discutir isso com seu irmão idiota, não valia a pena.
"Você me surpreendeu agora, Michael. Você tem o privilégio de transar com uma fêmea Nova Espécie, mas ainda assim fica nas mãos de Candid por causa de prostitutas humanas. Não há limites para a sua burrice." Ele balançou a cabeça.
"Não é sempre que uma delas aparece." Michael disse se justificando, Gabriel não retrucou.
"Por que está observando ela?" Michael perguntou, Gabriel o encarou. Michael bufou.
"Candid só me pediu para elaborar algumas fórmulas. Parece que a sugestão de Simple nela, a deixou meio incapaz."
"Se você não tivesse conseguido recuperar a mente dela, o que teria acontecido? Já pensou nisso?" Gabriel não esperava resposta, seu irmão não respondeu, talvez se lembrando de quando Simple e os outros dois arrancaram as unhas dele.
Michael se afastou e colocou as mãos no bolso. Gabriel sempre invejou o fato dele ser forte, ele sempre foi. Não era tão alto como Gabriel, mas Gabriel era magro, muito magro. Tanto que na escola o chamavam de vareta. Não importavam seus olhos muito azuis, seu cabelo loiro, nem seu rosto bonito, ele era ridicularizado e Michael endeusado.
"Eu consegui. Não foi mais difícil que a mente de Hoffmann." Gabriel assentiu.
Hoffmann. Eles o sugestionaram para que ele dispensasse a polícia e depois continuaram sugestionando para que ele não entrasse na justiça pela guarda compartilhada de Jonathan. Isso fez a mente dele entrar em colapso. Mas quando Rebbeca e Jewel foram atingidas pelo chip de Samantha, Gabriel disse que Hoffman podia ajudar, eles o trouxeram da clínica onde estava e Michael o recuperou. Ele não podia ajudar, nunca soube nada sobre o chip, mas Simple se sentia culpado pelo que fez com ele, então Hoffmann agora estava em sua casa, Jonathan e os clones inclusive o visitavam às vezes, e ele devia tudo a Gabriel. Foi com o dinheiro de Hoffmann que Gabriel e sua mãe tinham sobrevivido os anos em que ficaram juntos.
Uma mulher que Gabriel não conhecia saiu para o jardim e se sentou no banco ao lado de Claudia. Claudia se afastou e não olhou para ela.
"Interessante." Gabriel sussurrou.
"Não venha com hipocrisia pro meu lado, Celeste. Você não tem moral nenhuma para se sentir superior a mim." A mulher disse. Claudia não respondeu. Era uma mulher gorda, daquelas bem obesas. O rosto dela era feio com várias papadas, pele marcada por espinhas, olhos arregalados, um nariz bulboso e lábios finos. Os cabelos eram curtos, loiros mas pareciam ser pintados, a raiz era escura. Ela vestia uma das roupas de ginástica dos Novas Espécies.
"Então, Simple quase derreteu seu cérebro. Vai continuar fiel a eles?" A mulher perguntou, tentando levantar um assunto com Cláudia.
"Ele quase derreteu meu cérebro por eu ter sido fiel a você. O que não serei mais." Claudia respondeu.
"Eles já sabem tudo, você me entregou. Mas vou te dar o dinheiro." Gabriel examinou bem a mulher.
Aquela mulher seria Mary? Mary não tinha morrido no fim das contas? Tinha sido implantada? Por quê? Por quem?
Gabriel se lembrou das vezes em que viu Mary. Ela era madrinha de Lily, Gabriel tinha passado o dia observando todos naquele dia, o dia do batizado. Mas por arrogância, ele mal passou os olhos por ela.
"Acha que vão matá-la?" Michael perguntou. Gabriel o encarou, ele fez uma careta.
"Não é como eles agem, eu sei. Sabemos por experiência própria." Michael respondeu sua própria pergunta. Gabriel não o contestou, mas o que Simple estaria tramando? Era perigoso Mary ali. Se ela era Mary, implantada naquela mulher, significava que ela tinha pleno conhecimento do funcionamento dos chips.
As possibilidades eram infinitas! Ela poderia passar para o chip de Jewel por exemplo. Ou usar a força de Rebbeca e matar um dos netos de Valiant. Ou matar Sarah que era humana. Ela poderia usar Ann, ou a própria Elize e fazê-la se enforcar . E também podia matar Honest. Gabriel pegou seu celular e ligou para Simple. O que ele estava pensando?
Enquanto esperava Simple atender, Claudia perguntou:
"Por que está aqui?" Gabriel e Michael se aproximaram da janela o máximo que podiam sem se mostrarem. Simple não atendeu, Gabriel desligou o telefone.
"Eles me trouxeram, você estava meio catatônica. Na verdade, foi Candid que me trouxe, Simple precisou ir para outro lugar, pelo que entendi." Ela explicou.
Simple a deixou com Candid e foi salvar Heitor juntamente com Joe. Gabriel estava no hospital quando chegaram e ele ficou na sala enquanto examinavam Heitor. Gabriel nunca o tinha visto, era um lindo bebê, uma cópia de Honor. Como os outros dois. Aquilo o incomodou um pouco.
"O enfermeiro me contou. Parece que Brian e Brienne sequestraram Heitor, o bebê de Livie e Honor." Claudia disse, a mulher arregalou os olhos. Ela abriu a boca, depois fechou. Gabriel e Michael se aproximaram mais da janela inconscientemente.
"Eu não acredito nisso! Aquela puta!" A mulher disse, Gabriel estreitou os olhos.
"Está falando de Brienne?" Claudia perguntou, a mulher respirou fundo e alisou sua barriga gorda.
"É claro, Brienne. E Brian. Por que eles fizeram isso?" A mulher se levantou, parecia nervosa.
"Eu não sei. Você nunca conversou com eles, não é?" A mulher ficou em silêncio.
"E trouxeram o bebê de volta?" Os olhos esbugalhados dela mostraram a Gabriel, mesmo de longe que isso a interessou, interessou muito.
"É claro. Foi uma burrice sem tamanho na minha opinião." Claudia disse, a mulher assentiu.
"Você sempre teve muita inveja de Livie, afinal Pride nunca olhou para você. E então, seus filhos sequestram logo o bebê de Livie sem justificativa alguma. O que acha que os trigêmeos vão pensar?" Claudia sorriu quando disse aquilo para a mulher.
"Eu estive na mira deles esses dias todos. Nunca tive contato com Brian ou Brienne." Ela disse.
"Bom, então ela é a antiga namorada que 'morreu'." Michael disse para ninguém.
Gabriel balançou a cabeça.
"Como ela fez isso?" Ele disse baixinho para si mesmo.
"Provavelmente foi o Mckay. Ela tem quantos anos? Livie foi implantada a o quê? Doze anos atrás? A tal Mary era uma espiã, não era?" Michael disse, Gabriel o ignorou.
"Eu não tenho nada a ver com isso, não me interessa. Só quero ir embora desse lugar." Claudia disse.
"Eles vão te deixar ir?" A mulher perguntou, Claudia sorriu.
"Eu fiz tudo o que pediram e você me prometeu muito dinheiro pelo meu silêncio. Eles já sabem de tudo, não há por que me manter aqui. E eu quase perdi minha mente, é castigo suficiente.". Claudia disse.
"Eles limparam as minhas contas. E as suas." A mulher disse, Claudia fez uma careta.
"Vão me dar uma parte. Eu sei que não vão mais ter confiança em mim, mas não vão me deixar sem nada. Já você..." Claudia disse e nesse momento, Joe, Elize e Celina entraram no jardim.
A mulher voltou a se sentar.
"Bom dia! Está um lindo dia não acham? Um lindo dia para se juntar a família!" Joe disse com um grande sorriso no rosto. Ele parecia bem satisfeito consigo mesmo, Gabriel se perguntou se ele já sabia o que Gabriel acabara de descobrir naquele momento.
"E então, Celina? Essa é sua irmã?" Joe perguntou com a voz amistosa, Celina estava de costas para Gabriel, não deu para ver a expressão dela.
"Sim. Ela me procurou e me deu aquele chip. Eu ainda demorei para me decidir a ligar para Candid, mas quando uns homens estranhos me encararam na rua, eu fiquei com medo e liguei para Candid. Eu não disse nada, eu liguei de um telefone público. Eu passei o meu número e pedi que ele retornasse, mas quem retornou foi James." Celina contou tudo devagar, a mulher escutou tudo com uma cara de deboche.
"Gabriel..." Michael não terminou de falar, mas não precisava. Ele estava pensando o mesmo que Gabriel.
"Então você é Mary implantada em outro corpo." Joe afirmou, a mulher sorriu.
"Como se sente sabendo que sou eu? Sabendo que me lembro de cada vez que você me fodeu? Cada vez que eu chupei o seu pau?" A mulher sorriu, o rosto ficando ainda mais feio com a expressão devassa.
"O que pretendia, Mary? Se teve uma segunda chance de viver, por que queria me matar? Eu não fiz nada para você." Elize perguntou com sua voz meiga.
A mulher riu.
"Te matar? Por que eu faria isso? Você é uma idiota! Um ser insignificante. Mesmo nesse corpo nojento, se eu quisesse Joe, eu o teria. Você não tem a minha experiência, não tem a minha resistência. Não estou com ele por que não o quis. Ele é um nada pra mim!"
"Não estamos aqui para um acerto de contas, Mary. Eu só vim aqui para perguntar uma coisa." Joe disse, Claudia o interrompeu:
"Ah, graças a Deus! Eu não aguento dramalhão." Ela disse, Gabriel e Michael sorriram.
"O que acontece se eu esmagar esse chip?" Joe tirou um chip do bolso, Gabriel prendeu a respiração. Era o chip que ele tinha dado a Joe. Joe sabia!
"De onde saíram tantos Chips?" Michael perguntou, Gabriel o ignorou.
É claro que a mulher não se alterou.
"Por que não aperta e descobrimos?" Ela sorriu.
"Talvez eu morra, ou talvez ela. Se Gabriel te explicou bem, você sabe que a conexão é aleatória." Ela sorriu e esperou.
"Mesmo se esse chip for de Samantha? Um que só ela utilizou?" A mulher apertou os lábios finos minimamente, mas se Gabriel viu, Joe também viu. Era tudo o que ele precisava.
"Vá em frente." Ela se levantou. Joe fez um sinal para Gabriel, Gabriel pulou a janela e se aproximou. Michael o imitou.
"Você me deu esse chip, dizendo que era o de sua mãe. É verdade?" Joe perguntou, Elize abraçou Celina.
"Não. Esse é um chip comum. O chip de minha mãe está aqui." Gabriel não iria mentir. Não quando depois de toda a solidão tinha encontrado um amigo. Um amigo sincero, um parecido com ele. Gabriel amava Vengeance, mas o coração de Vengeance era puro demais, assim como o coração de John. Os dois estavam muito acima dele, Joe era como ele.
Ele colocou a mão no bolso de sua camisa, retirou o chip e o mostrou.
"Gabriel! Você não pode fazer isso comigo! Eu amo você!" A mulher disse, Gabriel sentiu frio. Tanto frio! Não era como quando ele ainda era um vampiro zumbi, como Candid o chamava, o frio era seu amigo, seu companheiro. Aquele frio se transformou em dor. A dor de perceber que se amou um objeto que se imaginava perfeito, mas a perfeição do objeto era só imaginária. O objeto estava apodrecido, morto.
Gabriel entregou o chip para Joe, Joe encarou a mulher.
"Esse não é o único, mas iremos achar todos. E destruir todos. Eu te prometo isso." A mulher o ignorou e se aproximou de Gabriel.
"Você queria que eu e você fossemos para uma ilha tropical, você queria que eu e você envelhecéssemos e um dia morréssemos. Sabe que eu não quero isso. Sabe que há um potencial inexplorado nesses chips, olha para mim! Eu descobri como fazer em humanos com segurança! Isso é o futuro, filho! Como pode achar que eu me resignaria a ser a mãe de um médico dedicado cuidando dos pobres, mesmo que morássemos numa ilha paradisíaca? Não posso, meu filho, eu não posso." Ela disse e se afastou.
Joe suspirou.
"Você é louca! Teve a chance de viver uma boa vida e a jogou fora por uma glória que no fundo só trás morte. A vida que você persegue não tem valor."
"O que sabe da vida, seu dissimulado? Você é um bebê ainda! Não sabe de nada! Vocês poderiam colocar o mundo de joelhos, vocês são o exército mais formidável da terra, mas estão aqui tendo esses filhotes insuportáveis, vivendo essa vidinha ordinária! Você não sabe nada da vida!" Ela disse, Joe olhou para Gabriel, Gabriel sentiu seu peito doer como se uma faca lhe rasgasse o coração, mas ele assentiu e Joe esmagou o chip.
A mulher gorda caiu sem vida como uma grande trouxa de roupas.
Elize e Celina gritaram de susto, a outra sorriu. Ela era durona, Gabriel tinha de admitir.
"Eu sinto muito, Gabriel. Eu sei que você a amava." Joe disse.
"É como ela mesmo disse, eu e ela temos objetivos diferentes de vida." Gabriel não queria falar sobre aquilo mais. De repente, ele se sentiu ainda mais sozinho.
"Padrinho?" Gabriel olhou para a direita, John sorriu para ele da entrada do jardim.
"Eu sabia que você iria precisar dele." Joe disse, Gabriel sorriu para seu amigo, seu bom amigo Joe.
"Mamãe disse para te convidar para almoçar." John disse, Gabriel nem sabia o que dizer.
"Não se esqueça dos meus filhotes." Joe disse as costas de Gabriel quando ele já tinha saído do jardim.
"Por que Joe disse isso?" John perguntou quando cruzavam a recepção do hotel.
"Por que Elize é estéril. E eu quero muito ter um afilhado." Gabriel respondeu John riu.

FILHOTES DE VALIANT - JAMES E JOE - LIVRO 4Onde histórias criam vida. Descubra agora