Conheço a minha salvadora

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Ele me perguntou se eu estava com algum tipo de dor e neguei com a cabeça. Eu me sentia bem. Confusa pela situação, mas bem.
- Isto estava em seu pescoço quando te resgatamos - O doutor me entregou um colar.
O cordão era negro, e o que mais me chamava atenção era o pingente: uma turquesa pequena, leve e redonda, presa por um arame de ferro; no centro havia um símbolo bem desenhado com a forma de um losango. A pequena pedra brilhava em meus olhos. Era a coisa mais bonita que já havia visto em toda a minha vida (como se já tivesse vivido tempo suficiente para experiências transformadoras). A pedra transmitia uma onda de calma, fazendo com que eu sentisse uma repentina esperança de recuperar minhas memórias.
- Onde está Stela? - perguntei colocando o colar em meu bolso. Stela fora a primeira pessoa que eu vira, e ainda tinha minhas dúvidas se era um anjo e que eu estaria logo no céu.
- Stela virá conversar com você esta noite. Até onde sei, ela tem planos que envolvem cuidar de você.
- Me chame de Liz - sugeri.
- Liz. Muito bem, então. Foi Stela que te encontrou no rio, se não fosse por ela talvez você estaria morta. Ela parece gostar muito de você. Veio te visitar todos os dias que esteve em coma.
Fiquei feliz ao saber que alguém se preocupava comigo. O sorriso de Stela surge repentinamente em minha mente e era reconfortante.
♣♠
Logo depois do almoço Thomas me encaminhou à psicóloga. Era uma jovem de pele bronzeada e cabelos curtos até a altura do ombro chamada Samantha. A moça usava roupas em diferentes tons de azul claro, tudo perfeitamente combinando.
Tanto a voz quanto o jeito de Samantha eram calmos. Contei sobre meus sonhos durante o coma, a pedra azul em meu colar e sobre Stela. No final na sessão ela recomendou que eu voltasse a ter uma vida normal, sob os cuidados do hospital, porque minhas logo memórias acabariam voltando de supetão.
Quando saí da sala me deparei com Stela sentada na cadeira branca do hospital. Dessa vez ela usava o cabelo preso em coque, colar de pérolas e na boca um batom rosa-claro. Além do traje social de sempre.
Fiquei feliz ao vê-la, e caminhei até ela em passos vagarosos.
Stela me deu um abraço apertado e nisso senti meu corpo formigar, então fechei os olhos. Passou rapidamente um filme na minha cabeça - Stela criança, diante de um homem e uma mulher que usavam roupas sociais, como as da Stela adulta. Deviam ser seus pais. Entre os flashes de lembrança, Stela estava se casando. A imagem de seu rosto, as lágrimas escorrendo pelas bochechas ao ler mais um teste dando negativo, me deixou abalada; o marido era estéril. Logo depois a mulher estava sorrindo, pois acabara de adotar uma criança junto a seu companheiro.
Eu não sabia como tinha feito aquilo. Como podia saber das lembranças das pessoas e das minhas não? Aquilo me deixou tonta, e percebi que ainda estava com os braços ao redor de Stela.
- Elizabeth, querida, como vai? - ela tinha cheiro de rosas. Fiquei orgulhosa comigo mesma por saber identificar o cheiro de rosas.
- Eu estou ótima, fico feliz por vir me visitar. - respondi, abrindo um sorriso sem graça. Stela apontou para a cadeira ao lado dela, e eu sentei.
- Você já recebeu alta, querida. Já tem pra onde ir? - balancei a cabeça negando. - Você poderia vir pra minha casa, se quiser. Quero te ajudar com a sua recuperação.
Parecia uma boa ideia morar em uma casa e ter uma família, pelo menos temporária. Eu já tinha me acostumado com o hospital, as sopas e as camas desconfortáveis já pareciam normais.
- Eu agradeço o convite Stela... Só que quero um tempo para pensar, tudo bem?
- Ótimo, o tempo que quiser - ela sorriu, um pouco desanimada.
- O que houve comigo? - perguntei puxando a linha branca de costura que saia do meu vestido hospitalar.
- Pelo que se sabem foi um caso de amnésia retrógrada, causada por alguma lesão na cabeça. Pode ser que quando se afogou bateu com a cabeça em alguma pedra.
- Tenho medo de não conseguir recuperá-las. - admiti.
- Não se preocupe querida, logo terá suas memórias de volta - ela sussurou um "espero" baixinho em seguida.
- Stela, ninguém dessa cidade veio me procurar? Ninguém aqui me conhece?
- Até agora ninguém... Você foi considerada um milagre da medicina e talvez já esteja em alguns jornais pelo país. Se te conhecem talvez não querem te encontrar. - Stela disse tapando a boca se sentindo um pouco envergonhada pelo o que disse.
- Eu não entendo... Eu achava que estava morta.
- Deuses! Elizabeth não diga isso! Eu agradeço por não estar morta, esses dois meses tem feito bem pra mim - ela revela.
- Por que se preocupa tanto comigo? - perguntei num tom de voz baixinho.
- Não tem outra coisa para eu me preocupar. - respondeu fazendo valer a visão que tive de suas lembranças.

A Caçadora de MemóriasOnde histórias criam vida. Descubra agora