O Maravilhoso Macarrão Instantâneo

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John encarava atentamente seu celular, seus dedos dançando na pequena
tela — estava a procura do enigma ''Steemos'' —, enquanto eu apenas
assistia àquele velho programa de fofocas da cidade. A captura do
Matador de Mulheres havia sido uma grande polêmica, algumas mulheres
que sobreviveram a seus ataques o reconheceram.

Até aí tudo bem. O grande problema é que a garçonete do Sixty Bar deu
meu nome para imprensa, e mais uma vez eu era o alvo daquele programa.

— Devia ficar feliz, você ajudou a prender o cara — disse John,
sentando ao meu lado e rindo de minha indignação. —  Estão falando bem de você.

— Estão tão curiosos quanto eu; sobre como descobri isso. Mas, e sua
pesquisa? Achou algo?

— Infelizmente, nada concreto. Mas tem um grupo em um aplicativo com
esse nome, só falta o ADM nos aceitar — ele me entregou o celular,
como se eu entendesse algo daquilo.

— Isso vai demorar? — perguntei, olhando para a televisão, ele deu de ombros.

A apresentadora fazia especulações e teorias sobre mim:

"Ela sobreviveu uma noite flutuando no rio, ninguém conhece sobre seu passado e sobrevive ao Matador de Mulheres e ainda o descobre? Será que Elizabeth, 'O milagre da Medicina', está mais para uma misteriosa bruxa?''

— Isso é ridículo. Como alguém ainda acredita nessa mulher? —
exasperou-se John, desligando a televisão. — Olhe, não precisa se
preocupar com isso. Relaxe sua mente, quem sabe assim você acaba se lembrando de algo — ele disse de forma tranquilizadora. — Estou indo
ao mercado comprar umas coisas. Você quer ir ou prefere que eu te
deixe em casa?

— Qualquer coisa é melhor do que ficar aqui assistindo a isso.
Ele riu novamente de minha expressão de nojo para a televisão.

Fomos para a rua principal — a cidade estava movimentada, e, por menor
que fosse, as ruas sempre estavam cheias de carros. Caminhávamos
silenciosamente na calçada, o céu nublado anunciando uma possível
chuva no período da tarde. Flores enfeitavam os postes de luz, o
gramado era sempre verde e a cada meio metro que andávamos havia
árvores e plantas espalhadas pela cidade. Poderia se dizer que era um
lugar fresco, com um clima agradável.

— Moro nessa cidade desde que nasci — disse John, quebrando o
silêncio. — Meu sonho é sair daqui e poder espalhar informações para o
mundo todo.

— Eu adorei essa cidade, mas acredito que não encontrarei meu passado aqui.

John respirou fundo e respondeu quase gaguejando:

— A-aposto que você foi uma pessoa importante.

— Não — falei. — Não tem ninguém me procurando.

— Sorte nossa, assim podemos ter você por bastante tempo... — ele
parou de falar e limpou a garganta. — Quer dizer... Stela adoraria —
recompôs-se.

Eu sorri.

Atravessamos a rua e entramos no mercado. Deixei que ele andasse na
frente para que eu pudesse o acompanhar. Passamos por uns carrinhos de
supermercado, perfeitamente encaixados em fileiras, de onde John tirou um e o dirigiu até chegar a uma prateleira que ficava abaixo de uma
placa escrito "Massas". Ele analisou todos os produtos até pegar um
pacote amarelo.

— Macarrão Instantâneo, umas das melhores coisas inventadas pelo ser
humano. — Fiquei em silêncio, não fazia ideia do que era. — Qual seu
problema? Não sabe o que é? — Balancei a cabeça indicando negação e ele me olhou decepcionado. — Quando chegarmos em casa vai saber.

Ao final de nossa compra, o carrinho já estava lotado de itens que ele
chamava de "coisas essenciais para quem mora sozinho" - que iam de
refrigerantes, potes de chocolate com avelã, salgadinhos, e até um
barbeador e o jornal do dia.

Voltamos com as mãos lotadas de sacolas. Não eram tão pesadas já que
continham apenas produtos industrializados. John fez questão de abrir
um pacote de salgadinhos e comer durante a caminhada. Ele me pede para provar um.

Eu comi. E cada mordida fazia um Crac Crac engraçado com a boca. As
bolinhas de queijo soltavam um farelo amarelo que colava nos dedos. Eu não quis lambê-lo, como John fizera, então acabei o limpando em meu vestido florido.

Chegando na casa dele, colocamos as compras em cima da mesa da cozinha.

— Veja a mágica acontecer, minha cara Elizabeth — disse ele, abrindo o
pacote amarelo e colocando-o em um pote com um pouco de água. Rasgou
um pequeno pacote prateado e despejou seu conteúdo na água; senti o cheiro de galinha naquele pozinho. Em seguida, levou o pote a uma
máquina branca com números no canto. Ele apertou o número cinco,
seguido por dois zeros, e fechou a porta da máquina.

— Isso é um microondas. Agora é só esperar cinco minutos para comer
essa maravilha dos deuses.

John abriu a geladeira e tirou de lá duas latinhas de refrigerantes.
Observei atentamente o microondas, o pote girando enquanto o
cronômetro fazia uma contagem regressiva, apitando ao chegar a zero.
Ele colocou o macarrão em dois pratos e me guiou para o lado de fora
da casa.

— Gosto daqui de fora - disse John —  Dá pra sentir a brisa do vento e
comer em paz.

Sentei em uma cadeira de ferro, enquanto ele colocava os pratos na
pequena mesa. Dali se tinha vista do jardim: arbustos cercavam o
perímetro da entrada da casa, acompanhados por alguns pinheiros. Ele tivera a brilhante ideia de pendurar alguns vasos de flores na parede.

Anoitecera antes que percebêssemos e o céu já exibia suas estrelas.
Suspirei profundamente, saboreando os aromas dos pinheiros e da terra.
Fecho os olhos e permito-me um transe leve, deixando que minha mente fique totalmente limpa: o que me trouxe aquela breve onda de calma.
A fumaça sai do meu prato em direção aos céus, estava quente e o
macarrão bem molinho.

— Então, Elizabeth — começou —, eu só queria saber... Como fez aquilo?
Como conseguiu me mostrar aquelas coisas? Era como se eu estivesse lá
— ele tocou na minha ferida, eu queria saber também. Assim como queria saber meu passado.

Como teria direito de saber a vida das outras pessoas sem saber a minha?

Eu precisava de uma resposta que não me entregasse muito.

— Ahm — falei de forma arrastada, hesitando. — Eu não sei. Acredito
que ainda tenho muito tempo para poder descobrir. E tenho sua ajuda,
também — foi a única coisa que consegui responder.

Ele foi até a cozinha, buscando o jornal do dia e o colocando na minha
frente. O destaque era "Preso o Matador de Mulheres"

— Graças a você, Elizabeth, centenas de mulheres estão a salvo desse
monstro. E é por isso que eu acredito em você, e estarei contigo até o
fim. Sei que isso é muito importante pra você.

Eu sorrio, e, antes que eu pensasse em abrir a boca para agradecer,
seu celular tocou:

— Ah, eu acho que deve ser pra você, Elizabeth — John me entregou o celular.

Eu o coloquei na orelha rapidamente.

— Olá, Elizabeth, sabíamos que te encontraríamos logo. Primeiramente,
saiba que ninguém está a sua procura. Até porque você é a nossa
última.

~~*~~*

Quem não adora um mistério? ''Nossa última'' em que? Acompanhe ''A Caçadora de Memórias'' para saber mais sobre a história de Elizabeth! E aqueles que já acompanham, obrigada pelos comentários e votos, continuem assim seus lindos <3

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