Alguém sabe me amar? Eu sei que essa pergunta parece carregada de egocentrismo, mas eu não acho que a esse ponto, eu me importe que achem isso, já que todos já me vêem como uma caixa de Pandora. Alguém realmente sabe me amar? Porque eu ainda não esqueci de nada. Momentos e vozes ainda são um prego enferrujado sendo forçado contra meu crânio, inocente, invadido, penetrado, defensivo mas nunca forte, nunca resistente e sempre impotente. Eu não sei o que é amor. Eu já pensei que fosse proteção, mas então, porque ninguém me protegeu quando eu pensei que fosse morrer? Quando eu achei que, fosse pelo peso em cima do meu corpo ou pela pressão cortante, eu sangraria ou explodiria até a morte? E quando meus mecanismos de socorro reagiram e eu rosnei até a garganta queimar, por que ninguém me protegeu da lâmina fúnebre responsável pela cicatriz que eu ainda sustento no meu rosto sem nenhum orgulho, ainda que seja uma cicatriz de guerra? E por que ninguém me protegeu dessa guerra tão pervertida e vil? Por que ainda sim, não entendem que essa guerra nunca acaba, ela ainda acontece dentro de mim? Por que todo o seu sarcasmo e insensibilidade quando minha mente me segurava na cama, incapaz de continuar me movendo para qualquer coisa? Por que tudo fez sentido quando me chamaram de escória, de subversão, de desviado, de doença do mundo? Por que o homem que diz que me ama toda noite mas me recusa todo dia não entende que eu dou o máximo que uma pessoa que chora toda noite e morre todo dia pode dar? Por que as pessoas não entendem que eu tento encher meu copo todo dia, mas ele é pequeno demais para saciar a sede de todo mundo? E por que todo mundo acha que quando eu peço ajuda, o que eu estou pedindo é que elas me mostrem tudo que eu fiz de errado como se eu não soubesse exatamente o que foi? Como se eu fosse estúpido demais para saber que eu tenho que sair da cama quando eu sei exatamente o que eu tenho que fazer e só quero encontrar forças ou motivos que me façam querer levantar de novo? Por que eu preciso levantar se não é pra cantar? Se não é pra dançar? Se não é pra recriar os únicos momentos em que eu já consegui amar a mim mesmo? Eu sei que eu sou só um corpo inerte, mefítico, mas por que o assunto é isso e não o fato de todo o meu esforço para ser algo mais ser frequentemente ignorado? Por que o assunto não são os pensamentos intrusivos que surgem toda vez que eu vejo o despenhadeiro estando diante do volante do carro ou as lágrimas que caem enquanto um terremoto acontece no meu peito e uma ópera chinesa quase escapa pelos meus ouvidos? E por que não parece a nenhum de vocês que é mau agouro o fato de que a performance é uma ária que soa exatamente como minha própria voz, pedindo pela misericórdia da morte?
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Procura-se Eu
De TodoLivro de crônicas (ou algum outro gênero textual alternativo que eu desconheço)