Carta para Julie

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Para minha querida Julie,

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Para minha querida Julie,

Quando você era pequena, sempre me pedia uma casa de boneca, pois você achava que a nossa casa humilde não era um lar de verdade, para você e as suas pequenas de pano.

Você queria ter a aprovação do mundo, e mesmo tendo apenas seis anos, desejava me mostrar que conseguiria liderar o seu próprio lar.

Eu, no entanto, nunca escutei os seus pedidos, e então te vi passar natais frios de coração e também de clima, onde eu nunca estava presente e com a nossa árvore, que estava tão mal enfeitada, tão sem brilho, tão esquecida.

E você estava triste, Julie, pois sabia que naquele momento a minha única companhia era alguma garrafa, cheirando à álcool. Você ficava cabisbaixa, pois sabia que a minha vida, se perdia em meio a algum botequim.

Eu sempre chegava tarde, quando a ceia já havia terminado. E naqueles momentos, você e sua mãe já estavam rezando por mim, enroladas num cobertor de lã, que ela mesma teceu.

E a imagem dela já estava tão penalizada e desgastada, Julie... Porém, mesmo assim, eu não abandonei aquele ciclo, e segui assim durante vários anos. E nesse meio tempo, muitas coisas foram mudando, mas eu nem percebi.

Quando dei por mim, senti falta da presença de sua mãe, fazendo um desjejum maravilhoso pela manhã, mas a bebida apagou de minha mente, a data em que ela se foi.

Tudo o que eu me lembro é que o dia estava chuvoso, e que ela foi enterrada no abandonado cemitério, que fica ao lado da paróquia em que ela foi batizada.

E agora você cresceu, pequena Julie, e eu não lhe culpo por ter me esquecido, pois durante muitos anos, você esteve me esperando, e tudo o que viu foi a minha imagem triste, a perambular entre a nossa casa e a sarjeta suja e fria.

Você me esperou sim, Julie, e sonhou e rezou, pedindo que eu lhe demonstrasse ao menos um pouco de carinho, que eu fosse um único dia lhe acordar para dizer que sentia sua falta e que lhe amava. E você esperava que eu chegasse tarde em casa por simplesmente estar trabalhando, e não mais por estar bebendo. Você esperou que eu me irritasse com o seu primeiro namorado, e que reparasse quando ficou moça.

Esperou que eu lhe desse meu amor, que eu demonstrasse presença e que eu tivesse lutado para manter a sua mãe viva, mas ao contrário disso tudo, eu lhe deixei crescer desnorteada. Eu lhe deixei perder o rumo, para redescobri-lo sozinha.

Você sofreu e ainda sofre... E eu sei disso, querida Julie, mas saiba que a bebida já me levou totalmente, tanto que às vezes eu ainda me pergunto quem eu sou.

E o pior de tudo é que a resposta é mais triste do que eu imaginei... Eu sou apenas um ser solitário, acompanhado da triste lembrança do rótulo de um whisky qualquer.

No entanto, Julie, saiba também que eu sempre lhe amei, e para que reconheça esse amor, hoje eu lhe envio a chave dessa linda casa, pois sei que um sonho nunca morre. E sei ainda mais, que se sentirá feliz em ver suas filhas realizando o sonho da Grande Casa de Bonecas, então lhe mando essa casinha, mesmo que tardiamente, para que ainda sim, possa tentar suprir o que eu fiz da sua infância, que deveria ter sido doce, ao invés de escura.

(im)perfeição (entre) versosOnde histórias criam vida. Descubra agora