O primeiro dia veio e passou, assim como o segundo, o terceiro e os outros sete.
Enquanto Charlotte tentava ocupar sua cabeça com as possibilidades do que vestiria no baile ao qual seria obrigada a ir, já que seu irmão não a deixaria recusar e o duque a convidou pessoalmente, Lucian conhecia cada vez mais da fazenda.
Ele passava os dias desbravando os vastos campos, ouvindo de Marcel como a economia do lugar funcionava e, vez ou outra, os dois homens seguiam para a cidade a fim de que o Duque visse um pouco mais sobre o lugar onde passaria alguns meses.
Em meio a passeios e jantares, Brista tentava aproximar-se a todo custo, apesar de Lucian não demonstrar para ela nada além de cordialidade, o que a deixava extremamente frustrada. Judith também notou o pouco interesse do Duque em sua filha e aquilo a preocupou, afinal, sabia que a imagem de Charlotte , sua filha mais velha, poderia ter algo a ver com aquilo.
No entanto, preferiu não se manifestar, ao menos não naquele momento. Preferiu deixar que o homem se instalasse, que se sentisse à vontade entre eles e, só então, tentaria fazer com que os olhos dele se voltassem somente para Brista.
Naquele fim de tarde, fugindo de seu escudeiro e de seu anfitrião, Lucian cavalgou com a certeza de para onde iria. O cavalo trotava levemente e ele não tinha nenhuma pressa, aproveitava a luz quente do pôr do sol, que aquecia sua pele e o protegia da brisa fria que denunciava que a noite seria muito confortável.
Ao passo que cavalgava e se aproximava da casa, ele notou uma movimentação estranha no grande campo de flores. Parou o cavalo e, virando-se para olhar melhor, encontrou aquela que, intimamente, chamava de anjo. Ela estava distraída entre as flores, a luz do sol poente iluminava sua pele e fazia seus cabelos parecerem brasa viva. A brisa leve fazia o tecido se seu vestido flutuar vez ou outra, desenhando as belas pernas e a fazendo rir enquanto tentava manter o tecido no lugar, riso que chegava aos ouvidos dele como um belíssimo coral de anjos, como o som da felicidade.
Charlotte havia saído para cumprir com seu passatempo favorito.
Depois da tempestade, precisou esperar alguns dias para que as flores estivessem belas novamente e, naquela tarde, saiu para colher algumas e esfriar a cabeça. O Duque ainda ocupava seus pensamentos, mesmo que ela negasse esse fato todos os dias quando era pega pensativa por Annie. Alheia aos olhos escuros que estavam sobre ela, a ruiva tirava uma flor de cada cor, sentia seu perfume, sorria levemente diante da beleza que via na natureza e, então, colocava a flor delicadamente em sua cesta.
Lucian aproveitou seu momento de distração para descer de seu cavalo e, caminhando à passos de algodão, se aproximou, sem fazer barulho algum. Tinha um sorriso arteiro nos lábios e, aproveitando que a moça se encontrava de costas, pegou uma flor amarela, parando ali e esperando que ela se virasse enquanto observava como os belos cabelos avermelhados lhe caiam como uma cascata pelas costas.
Quando se virou, Charlotte sentiu o coração acelerar e o corpo gelar por alguns instantes. Seus olhos se fixaram no homem a sua frente, seu sorriso que transbordava malícia e sedução, seu corpo forte que tinha quase dois terços a mais de sua altura. Ele usava vestes simples, a camisa social estava dobrada até os cotovelos de forma nada elegante, expondo os braços fortes e se agarrando aos músculos, que pareciam muito convidativos para ela.
Depois de se dar conta de que estava o encarando demais, a ruiva desceu os olhos para a flor que ele trazia consigo, erguendo os olhos para ele novamente, com confusão estampada no olhar.
— Olá, senhorita Capman — falou ele, inclinando o corpo levemente para frente, num cumprimento cavalheiresco. — Achei que iria vê-la na casa principal, mas os dias se passaram e não a encontrei.
Lucian esperava uma explicação, mas duvidava que teria o que desejava. Charlotte parecia se envergonhar de algo e ele suspeitava que seu distanciamento de sua família tivesse algo a ver com isso.
"O que ela esconde?", ele se perguntava, enquanto encarava os belíssimos olhos verdes. "Será que tem um filho? Ou já envolveu-se com algum homem? O que faz com que sua mãe a mantenha tão longe?", os pensamentos iam e vinham em sua mente e ele não sabia mais o que concluir sobre Charlotte .
Mas tinha a certeza de que queria saber mais sobre ela, saber tudo e conhecê-la até em seus mais íntimos medos, protegê-la de seus maiores temores.
— Eu não costumo visitar muito a casa principal, senhor — ela falou, depois de alguns minutos em silencio. — Não devia estar aqui, tenho certeza que meu irmão está a sua procura.
A última frase deixou Lucian um tanto quanto curioso e, munido de sua ousadia natural, deu um passo à frente, erguendo a destra para apoiar dois de seus dedos no queixo de Charlotte .
— Certamente não deveria, afinal, Marcel se desvia de qualquer atração que me ponha há pelo menos 100 metros da senhorita — falou ele, erguendo o rosto dela levemente. — Só queria saber o porquê.
Ao contrário do que imaginou, Charlotte não se afastou de seu toque, manteve-se em seu lugar, por mais que retraída e claramente envergonhada.
— Meu irmão só deseja me proteger e o senhor deveria voltar para a casa principal — ela respondeu, num tom firme, apesar de gentil. — Não deve gastar seu tempo comigo, Duque, não tenho o que você procura.
Os lábios do homem curvaram-se levemente para cima, num sorriso gentil e, de certo modo, carinhoso. Lucian aproximou-se um pouco mais, erguendo a flor e colocando-a entre os fios ruivos enquanto aproximava o rosto da jovem. Para ele, pouco importava que a conhecesse há somente alguns dias, importava ainda menos o fato de terem se encontrado somente duas vezes, tinha uma convicção ferrenha e firme de que já havia encontrado o que buscava, mesmo que ela achasse que não.
— Eu duvido do que diz, senhorita Capman — ele falou, num sussurro, subindo seu dedo indicador do queixo para os lábios dela, tocando a pele macia e os contornando com certa adoração. — Mas sou um homem paciente.
Enquanto sentia o toque, íntimo demais para uma conversa entre uma dama de respeito e um cavaleiro, Charlotte sentia todo o corpo estremecer e seu estômago se revirar. Sua pele se arrepiou quando o dedo dele contornou seu lábio de forma lenta e, ao notar o olhar que mostrava muito mais do que ela já havia visto na vida, seu coração se aqueceu.
Ela arfou, sentindo todo corpo se incendiar com aquela aproximação. O perfume dele, uma fragrância que parecia ser única, inundou seus sentidos enquanto a cesta de flores caia de suas mãos, ao passo que o braço forte do duque tocava sua cintura, a puxando mais para perto, perto o bastante para que ela sentisse seu corpo pressionado ao peito largo e forte dele.
No entanto, por mais que aquelas sensações novas fossem extremamente satisfatórias, por mais que seu coração estivesse acelerado, que suas pernas estivessem bambas e que seu maior desejo naquele momento fosse ser beijada por ele, ela fechou os olhos e, unindo todo o resto de juízo que tinha, deu dois passos para trás, desvencilhando-se dos braços fortes e recebendo um suspiro de frustração do homem à sua frente.
— Peço que, por favor, desista — foi tudo o que disse, ainda de olhos fechados.
Então, abaixando-se para pegar a cesta de flores e erguendo-se com rapidez, correu para o caminho que a levaria para sua casa, abrindo os olhos somente quando ele já não estava em seu campo de visão, afinal, ela sabia que, se o olhasse, ele perceberia o quanto os toques e suas palavras a abalaram.
Enquanto Charlotte se distanciava, ao longe, Judith observava a cena com irritação e até raiva. Havia saído assim que viu o Duque se esgueirar para fora da casa discretamente, estava curiosa para saber o que motivou uma saída às escondidas e, quando chegou ao campo de flores, amaldiçoou o dia em que a tempestade caiu e o forçou a pernoitar na casa destinada a filha que ela havia jurado esquecer.
Seu coração encheu-se de raiva e indignação. Enquanto seus olhos se mantinham fixos no homem, ainda parado no meio do campo e olhando para o céu como um tolo apaixonado, Judith jurou a si mesma que não deixaria que sua filha imprudente levasse o nome da família para a lama novamente.
Desse modo, ela faria de tudo para que os olhos do duque se voltassem somente para Brista, fosse por amor ou por obrigação, ele se casaria com ela e deixaria Charlotte no esquecimento, mais uma vez.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Duque que me amava
ChickLitCharlotte , uma jovem belíssima, filha de um dos fazendeiros mais importantes do reino, não era nobre, mas todos sabiam seu nome e sabiam que ela decidiu casar-se por amor. Enquanto tudo o que ela desejava era viver seu conto de fadas, seu marido a...