Correr ou morrer?

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O primeiro amor da vida quase nunca da certo, quase nunca é para a vida toda, quase nunca é superado.
O quão destruídos aqueles dois garotos estavam aquela noite? O quão vazios? O peito apertado, a falta de ar, os olhos inchados e vermelhos e as lágrimas carregadas de dor que caiam de seus olhos.

Depois de ver Jeff ir embora Code voltou para dentro onde pediu para Kall levá-lo de volta para casa e o rapaz não hesitou em obedecer ao pedido do garoto, pois havia notado os olhos baixos de Code e sabia que aquilo não era efeito da bebida.

— Tudo bem... eu vou te levar de volta, se quiser eu posso ficar com você hoje à noite. Eu estou livre amanhã...

Barcode encostou sua cabeça no vidro da janela e não falou nada o caminho inteiro e apenas olhava para fora enquanto via as luzes dos prédios e postes das ruas e via também os carros passarem em alta velocidade e ficarem para trás, mas sua mente não estava ali, ela estava no garoto que corria em seu carro em outra estrada onde só havia ele.

Os pais de Code não notaram que o filho havia saído e também não viram quando o mesmo retornou para casa junto à Kall. O pequeno garoto estava deitado no colo do amigo que acariciava seus cabelos e tentava entender o porquê daquilo.

— Você não quer conversar sobre o que aconteceu? — perguntou preocupado e Code apenas negou.

— Só fica comigo essa noite, Kall... tá doendo muito aqui dentro...

— Shi... tá tudo bem... eu tô aqui, tá bom? Eu estou sempre aqui por você.

Kall se endireitou na cama e abraçou Barcode que chorava silenciosamente e as lágrimas atravessavam o tecido fino da camisa do mais velho, mas depois de alguns minutos de choro incessante Code finalmente dormiu.

— Eu vou esperar você estar pronto pra me contar tudo, meu pequeno Code.

Jeff não sabia mais o que fazer para amenizar o que sentia. Bebidas não resolveriam o seu problema, mas Bible tentaria fazê-lo esquecer.
O rapaz não voltou para sua casa aquela noite, ele procurou seu irmão mais velho em sua casa e o encontrou saindo de seu escritório com a arma em mãos.

— Resolveu aparecer logo agora?! Eu tenho que sair!

— Pra onde você vai?

— Tenho que resolver uma coisa. Pensei que tivesse resolvido seus problemas, nunca mais apareceu. — Bible voltou para dentro da sala soltando sua arma na mesa e sentando-se na cadeira atrás da mesa de escritório.

— Parece que só pioraram... — Jeff sentou no sofá no canto do escritório e afundou sua cabeça na almofada. Quando seus olhos se fecharam uma única lágrima escorreu pelo canto, mas ele logo a enxugou. — Então... pra onde você estava indo?

— Acabei de receber uma ligação. Um dos meus homens foi pego saindo de casa e...

— E o que?

— Você e esta mania irritante de me interromper! Apenas me deixe falar, Jeff!

O garoto negou com a cabeça enquanto um sorriso fraco se formava em seus lábios.
Irritar seu irmão mais velho era um passatempo divertido para Jeff e mesmo ficando irado com as interrupções frequentes Bible adorava ver o garoto sorrir por mais pouco que fosse.

— Um dos meus homens foi sequestrado e ele pode me comprometer se abrir a boca.

— Não confia nos seus homens? Afinal, você está indo para salvá-lo ou perguntar algo do tipo: "você vai me entregar?"

— Seu senso de humor é ótimo, Jeff, mas agora não é hora para suas piadas. Você vem ou não?

— Eu posso?

— Desde quando você me pede permissão para fazer algo? Anda logo...

Bible pegou de volta a arma que estava na mesa e Jeff o seguiu até seu carro.

— Não! Sem chance. Eu não vou com você! Você dirige como um idoso.

— O que você disse?!

— Eu vou no meu carro. Quanto tempo até lá?

— Uma hora.

— Como você sabe que é lá?

— Suposição. Se não quiser ir fica aí e aproveita a casa.

— Eu não disse que não iria.

— Corrida até lá?! — perguntou Bible sorrindo para Jeff.

— Você não sabe com quem está falando...

— A partir da próxima avenida, ela está vazia a essas horas.

Os rapazes entraram em seus carros e depois de chegar na avenida mencionada por Bible eles pararam no semáforo e abriram os vidros.

— Pronto para perder, Jeff?!

— Se eu perder, Bible, esse carro é seu! — gritou Jeff em resposta ao irmão e ambos ligaram seus carros.

Aquela avenida vazia seria palco para um verdadeiro velozes e furiosos da vida real, mas com apenas dois pilotos.
O semáforo começava a contagem regressiva para a sua abertura e para a corrida começar e os dois prepararam-se nos bancos.

3, 2, 1...

O carro de Bible saiu primeiro pela rua e deixou o carro de Jeff ficar para trás, mas o garoto de cabelos azuis não estava preocupado com isso, ele sabia que por mais rápido que Bible fosse ele era capaz de o alcançar.
Jeff estava indo bem, correndo muito e quase alcançando seu irmão, mas ele lembrou dos acontecimentos daquela noite.

As lembranças de Code, do beijo de despedida que o garoto o dera, do choro que tivera que engolir, tudo.
Ele lembrou de tudo que estava doendo, e lembrou do que mais o destruía, aquela foi a última chance que ele tinha de fazer Code ficar, mas não conseguiu e então ele se casará em algumas malditas semanas.
Novamente a raiva dos pais do garoto e a tristeza por tê-lo perdido o invadiu, mas não abriu espaço para lágrimas e sim para o ódio guardado.

Para chegar ao local dito por Bible eles passariam pelo caminho da casa de Barcode e Jeff lembrava disso, foi quando decidiu ultrapassar seu irmão.
O mais velho ficava para trás enquanto Jeff pegava a arma do porta-luvas e ligava Bible.

— Eu ganhei, Bible! Entendeu?! Eu sempre vou ganhar! Eu sempre vou estar em primeiro lugar, sempre! Agora passa na minha frente e não para!

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