▻four; wonderland

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Era uma vez, uma linda família

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Era uma vez, uma linda família.
Papai, mamãe e seu filho.
Espere...
Não era bem assim!

Ou deveria ser, mas o fato era que tudo estava fodido desde sempre.

A mãe escondeu-se com filho no quarto numa noite, enquanto o pai entrava na casa após um dia de merda, ele estava bêbado e frustrado. O filho não entendeu a necessidade da mãe se trancar no quarto com ele em meio ao desespero caótico.

— ABRE ESSA PORRA, SUA VADIA!—
Papai gritava chegando perto.

A mamãe chorava enquanto deixava o filho escondido no guarda-roupa. Tinha seis anos mas já conseguia ouvir os socos barulhentos do pai contra a porta. Ele nunca tinha visto nada assim entre os pais, claro! Pequenas discussões e um clima ruim, mas nada do tipo.

— ABRE ESSA PORTA MARTINA, VOU TE QUEBRAR!

Pobre mamãe, deixou um vão na porta do guarda-roupa, o suficiente para o filho ver a mamãe se encolher na cama a frente e chorar em posição fetal. A porta estourou com os chutes do papai, o mesmo entrou com uma garrafa de vinho em uma mão e na outra uma cinta.

— EU NÃO FIZ NADA DAMIANO!—ele nunca viu a mãe em um desespero como esse.

O pai deu um último gole naquele líquido e jogou a garrafa contra a mãe.

Ele soltou um grito baixo e tapou a boca enquanto o pai começou a espancar a mãe com o cinto.

— SUA PUTA!
O pai gritava enquanto a mãe ficava quieta.

Papai enrolou o cinto na garganta da mamãe e então começou a passar a mão pelo corpo dela.
Ela por alguns instantes olhou para o guarda-roupa a sua frente, tempo suficiente para o pai perceber alguma coisa.

— O que tem ali, Martina?
Perguntou puxando a mãe pelo cabelo.
Antes de jogá-la novamente na cama e ir até o guarda-roupas.

Papai achou!

Ele sorriu quando viu o filho ali.

— Você está aí, meu campeão?—
Ele puxou o menino para fora do armário e deu a cinta para ele.

— Está vendo como se trata uma mulher? É assim que se impõe respeito Élion!

O que ele queria que o menino fizesse?

Com a mãe olhando nos olhos dele, era impossível até mesmo de não chorar com ela.

— Vamos!
— Bate!
— Passe a mão!
— É como uma cadela de estimação.

A voz barulhenta do pai enchia sua cabeça confusa.

O filho não sabia o que pensar ao certo, era novo para saber se aquilo estava certo. Afinal, a mãe não se defendia, e ainda assim, ficava com o pai. E o pai era bom para ele, talvez essa fosse a maneira que ele demonstrava amor.

Ao certo o menino achava que era um gesto de amor.

Por que você não quer sair em família?
Por que nega o carinho da sua mãe ou do seu pai?
Por que não chorou quando a sua avó morreu?
Por que tem esse olhar frio?

— ÉLION?—
Acordei!

Liz me chamava através da porta do meu quarto.

Eu não sentia nada além de um cansaço físico. Não achava que iria me foder tanto como estava acontecendo. Andei lentamente até aquela porta e destravei.
A menina mordia um dos lábios e tinha lágrimas escorrendo pelo rosto sonolento.

— Eles estão brigando, tem que fazer alguma coisa!
Aneliz invadiu meu quarto assustada, como todas às vezes que isso se intensificava e eles partiam para a agressão física.

Porra eu tinha pena dela pra caralho.

Todas as noites que ela costumava invadir meu quarto com medo, a realidade me atingia como um soco no estômago. E eu não estive aqui nos últimos três anos para ela.

— Vá dormir!
Mandei enquanto ela se arrumava em minha cama tentando controlar o choro.

Aneliz não tinha um psicológico forte para aguentar os choros da mamãe nem os gritos do nosso pai. Ela também não tinha força para intervir quando a discussão intensificava. Ela foi um fruto indesejado mas eles a tratavam bem.

Me sentei no chão ao lado da cama enquanto observava o sono tomar seu corpo.

Normalmente eu interviria na briga, mas eu estava cansado de mais para isso. Deveria ter dormido na mansão do Vitéri como os outros, mas então ela estaria sozinha.

Franzi a testa, e massageei um ponto dolorido entre as sobrancelhas.

Olhei para minhas mãos e lambi os lábios que estavam ressecados. Minha boca estava seca, e eu sentia minha garganta arranhar enquanto tentava distinguir a realidade.

Um sorriso se formou em minha boca quando eu percebi que minhas mãos estavam desfocadas e se movendo diante de meus olhos.
Mas eu não as estava movendo.

Algo se quebrou em outro cômodo, então me levantei e peguei os fones. Coloquei os aparelhos nos ouvidos de Liz e liguei uma música qualquer antes de cobri-lá e trancar a porta do quarto por dentro.

Senti a água gelada bater contra meu rosto quando tentava me despertar. O espelho mostrava uma imagem embaçada do meu rosto e um pouco de sangue escorreu do nariz.

Fui até o closet vendo o horário avançado na tela do celular... Eu precisava fazer isso. Precisava vê-la, agora, eu esperei muito por isso.

Peguei o capacete jogado no chão e pulei a janela enquanto a chuva ficava mais forte. Os três já estavam me esperando, tínhamos compromisso para essa madrugada, mas eu não poderia ir sem antes, ver como ela estava.

Estacionei a moto do outro lado da sua rua, como costumava. Pulei a cerca que dava passagem para os fundos da casa, como costumava fazer. A chuva estava forte nesse ponto, mas conseguia ver a janela do seu quarto aberta, a cortina ventando para fora do quarto e então comecei a subir.

Eu deveria ter aprendido, deveria ficar longe da sua casa. Dá última vez que fiz isso, quase me custou a liberdade; mas da última vez foi há três anos, da última vez ela tinha quatorze, da última vez ela estava assustada. Agora, ela tinha idade, agora eu poderia fazer meus jogos com ela, e poderia tê-la para mim, como sempre desejei.

Seu quarto estava mal iluminado, o abajur piscava com as falhas de energia, enquanto ela dormia tranquilamente. O corpo quente, a pele lisa, o cabelo espalhado pelo travesseiro e rosto.
Tive que me controlar para não rasgar aquele shorts curto e a regata que ela usava.

Tudo como eu imaginava, exceto aquelas marcas. Uma pontada de raiva acertou todo meu corpo, fechei a mão em punho e suspirei fundo sendo obrigado a engolir o que queria explodir.

Me abaixei até a altura do seu rosto e tirei os fios que estavam espatifados sobre a bochecha. A necessidade de tocar sua pele me deixava inquieto. Faria isso, mas não agora... não seria assim.

Meu celular vibrou no bolso da jaqueta, precisava encontrá-los agora.

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