11 - Cerridwen

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Cerridwen

15h39

Eu estou tendo alucinações terríveis desde aquele dia. Eu escuto sussurros embaixo da minha cama e, quando vou procurar, não há nada ali. Não consigo dormir, da última vez que tentei, tive o pior pesadelo da minha vida.

Sábado à noite após um jantar desastroso em família — mas, como sempre, sem o meu pai —, como todas as refeições que temos, deito a minha cabeça no travesseiro macio na esperança de finalmente conseguir ter uma noite de sono. Há dois dias eu não dormia, estava mais do que na hora de descansar. Mas o medo me atormentava, aquela paranoia de ver a figura escura e deformada na minha frente ou deitada ao meu lado na cama.

Apesar dos meus temores, meus olhos já estavam pesando mais do que era possível suportar.

O frio bateu com força nas minhas pernas nuas, fazendo-me arrepiar por inteira. Ainda estava de olhos fechados, mas sentia a grama e a lama entre os meus dedos dos pés. O vento soprava meus cabelos compridos para trás, sussurrando para mim que eu deveria ter coragem de abrir os olhos.

E eu abri.

A floresta.

A mesma em que eu e outras pessoas nos aventuramos atrás de Remy, mas não era o mesmo lugar em que caminhei. Na penumbra enevoada, eu só via silhuetas. Como voltar para a borda? Como achar uma trilha segura?

A ventania acertava meu rosto em cheio, levantei a mão bruscamente para segurar meus óculos, mas eles não estavam lá. Como eu sairia dali?

— Redde mihi eam...

Como várias cobras entrando em minhas orelhas, as palavras ecoaram dentro da minha mente. Estava vindo de diversas direções, várias vozes correndo ao redor da minha cabeça com suas bocas sujas encostando na minha pele.

— Omnis autem morietur...

Eu não conseguia sair do lugar, girei em torno de mim mesma para desvendar de onde vêm os sussurros e meu cabelo começou a enroscar no meu próprio torso.

Então eu pisquei.

Sangue, eu vi muito sangue escorrendo e pingando de pontas afiadas e dedos alongados.

Eu senti a viscosidade entre os meus pés e abro os olhos. A lama escura e fria se transformou em sangue morno e grosso, o cheiro ferroso invadiu minhas narinas tão forte como um soco.

Eu pisquei novamente.

Choro de bebê. Uma cabeça...

Eu... eu não queria ver isso.

Me forcei a abrir os olhos, mas agora estavam grudados como se não existissem e fossem apenas um grande borrão de pele. A cabeça decepada estava em cima de um banco de madeira. Aquilo era... a cabeça de Remy. A boca escancarada e as cavidades oculares vazias como um buraco negro. Seu cabelo claro e ondulado estava emaranhado em vários nós, flutuando.

O grito que se acumulava em minha garganta não conseguia se soltar.

Então eu, finalmente, abri os olhos. Ainda naquela floresta, com meus cabelos me envolvendo com a força do vento e os pés de volta em lama espessa. O que eram aquelas visões?

Os sussurros começaram a crescer, em velocidade e altura. Eu já não era mais capaz de escutar o meu próprio pensamento, tentei levar as mãos aos ouvidos, mas meus cabelos pareciam correntes. É como se criassem vida. Malditos fios ruivos.

Lost Sea - Uma Morte e uma MaldiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora