Lost Sea - Uma Morte e uma Maldição

3 - Armin

3

Armin

17h13

De todas as pessoas que eu esperava ver hoje para me perguntar como eu estou, Cerridwen certamente me pegou desprevenido. Nós nos falamos apenas uma vez e achei que ela jamais iria olhar na minha cara novamente. Mas foi bem o contrário, todas as vezes que eu a olhava, ela já estava a me fitar. Seu consolo foi estranhamente reconfortante, me senti especial por ter sido notado por alguém como ela. A garota que, por quase um ano, eu estive apaixonado, finalmente me notou!

Quero dizer, após ser ignorado por tanto tempo e seguindo os conselhos de Cooper, eu decidi seguir em frente e tentar esquecer essa paixãozinha estúpida. Não sei o que tinha na cabeça em fazer isso. Meu amigo passou várias noites em claro me ouvindo resmungar e, confesso, chorar por desilusão amorosa. Até hoje ele briga comigo quando repara que estou olhando para Cerridwen pelos corredores da escola.

No dia em que fizemos dupla na aula de francês, eu nunca agradeci tanto por Cooper ter faltado, mas tive também que lidar com toda a vergonha de ter uma garota encantadora e inteligente como ela ao meu lado. Seus olhos pareciam me espetar e sua voz furava meus ouvidos, seu cabelo ruivo estava tão cheiroso que eu sequer conseguia me concentrar no assunto do trabalho.

Foi assustadoramente incrível. Mas então ela passou a me ignorar e Cooper sempre me arrastava para longe todas as vezes que ela se aproximava.

Mas hoje ela estava aqui, ao meu lado, me abraçando e consolando com chocolate. Não sei como me sentir, só sei que não devo deixar essa ilusão falar mais alto que a realidade e acabar me magoando novamente. Ela só me vê como um colega de turma — no máximo um amigo. Nada mais.

Mas não consigo não me sentir culpado por isso. Se Remy não tivesse desaparecido, nada disso estaria acontecendo. Minha mãe não teria surtado e me batido no rosto, felizmente não está mais a marca ou a garota teria visto. Meus irmãos não estariam em pânico com medo de desaparecer também, a culpa e o julgamento de todos não estaria sobre as minhas costas.

Os policiais até mesmo perguntaram se eu não deixei a janela aberta de propósito!

Eu só consegui chorar até perder o fôlego quando me fizeram esta pergunta. E eu até mesmo pedi para Cooper me deixar sozinho por algum tempo, não queria que ele me visse tão derrotado. E meu amigo não é a melhor das pessoas para consolar alguém, por mais que esteja sempre fazendo piadas, quando o clima fica tenso, ele não sabe lidar.

Os fatos estão sendo processados lentamente. Eu não consigo saber ao certo o que diabos aconteceu nesse quarto, só consigo me recordar da cena: a cortina voando para fora da janela na noite escura, a lua sendo a única luz a iluminar o cômodo e a cama bagunçada, os livros jogados no chão junto com a chupeta preferida do meu irmãozinho. O frio naquele quarto não foi o suficiente para me fazer arrepiar, mas sim a cena devastadora. Sua presença chorosa simplesmente havia evaporado janela afora. Nada neste quarto respirava.

E pensar que eu havia gritado com ele horas antes. E que eu sempre desejei que ele não fosse responsabilidade minha ou que sequer existisse. Talvez o universo tenha escutado meus desejos, mas resolveu atender somente o pior deles. E eu não consigo parar de me martirizar por isso. Se eu tivesse apenas ficado no quarto essa noite, Remy ainda estaria aqui, nossas vidas estariam normais.

É tudo minha culpa. Independente do que aconteceu.

A culpa é inteiramente minha.

Cerridwen se despediu com um aceno rápido e logo saiu pedalando em sua bicicleta chique. Não consigo esconder a surpresa de sua visita, nem mesmo por Cooper eu estava esperando, visto que o pedi para me deixar só. Assim que a garota some do meu campo de visão, sinto as lágrimas grossas e pesadas inundarem meu rosto como uma cachoeira liberta de uma prisão. A falta de ar se faz presente, apertando meu peito sem misericórdia alguma, como uma manada de elefantes pisoteando meu corpo inteiro.