15h28Eu não esperava que a vista da "parte feia" para o porto fosse tão agradável. Não é como meus pais dizem, não existem ratos andando por aí em plena luz do dia ou mendigos me perseguindo.
Na verdade, vejo pessoas normais entrando e saindo de lojas, principalmente de artigos de pescaria, mulheres cochichando entre si e segurando firme as mãos de suas crianças, homens tentando vender seus peixes grandes para elas e está bem movimentado para um dia em que alguém desapareceu por aqui.
A brisa litorânea é fria, densa e ligeiramente fedorenta. De um lado vejo lojas e pessoas, do outro apenas o grande mar de onde meus pais extraem suas pérolas, com alguns barcos na praia e outros no fundo da paisagem, tão pequenos e longínquos que parecem formigas. É uma vastidão azul da água e cinza do céu, estou adorando sentir minhas tranças balançarem atrás de mim neste lugar. Não é como o caminho que faço todos os dias da escola para casa, apenas árvores e ruas de pedra em uma subida exaustiva.
Então essa é a vista de Armin todos os dias...
Algumas vezes eu paro de pedalar, aproveitando a inércia, e estico as pernas. É engraçado, eu estou me divertindo com tão pouco. É bem melhor tudo o que estou sentindo agora, do que ficar caminhando pelos corredores desertos daquela mansão, com o tédio consumindo cada pedaço da minha alma. Embebida pela chatisse da minha família e suas provocações a respeito de qualquer coisa sobre mim. Meu cabelo, minhas sardas, minhas roupas, minha voz, meu jeito, minhas unhas, a forma como eu respiro e até mesmo como eu caminho.
— Olá, Cooper! — algumas pessoas cumprimentam o garoto à minha frente, que apenas acena com a mão. Outras apenas me encaram como se eu fosse um alienígena. Compreensível.
— Algumas pessoas ainda não sabem o que aconteceu — ele sussurra, a voz grossa e os olhos cor-de-amêndoas me encaram fixamente — Então nem pense em fofocar para não criar pânico. Vão fazer um comunicado esta tarde, para reunir um grupo de busca hoje à noite. Foi o que Armin me disse.
Com a mão esquerda fora do guidão, faço um gesto de zíper sobre minha boca. Minha boca é um túmulo.
Por enquanto.
Sinto gotas minúsculas de água cair nos meus óculos, está chuviscando. Eu espero que não molhe meu gravador, não posso perder essas informações por nada que é mais sagrado! Com apenas mais alguns minutos pedalando, chegamos em uma área mais deserta, as casas são separadas por terrenos baldios cheios de grama alta e árvores mal cuidadas.
Diferente do centro comercial do porto, aqui a aparência não é tão boa. Portões velhos e quebrados, casas com a pintura desgastada e tristes, como se seus anos de glória já tivessem passado há décadas e agora só lhes restam o abandono.
Dificilmente vejo um balanço ou algum outro brinquedo de criança no quintal da frente, a maioria tem apenas um gramado esquecido que predomina a visão. Cooper para sua bicicleta na frente de uma casa aparentemente como qualquer outra dessa rua, mas diferente das outras, essa está completamente fechada. Como se tivesse sido abandonada de vez.
Eu me pergunto como deve ser a vida de quem mora aqui, independente das paredes descascando ou da grama mal-cuidada, será que as pessoas daqui são felizes? Suas famílias são harmoniosas? Como será o café da manhã em uma manhã chuvosa com todos rindo ao redor da mesa?
Bem, talvez eu esteja fantasiando muito. Mas eu gostaria de saber como é estar em outra família, ter uma vida mais normal e sem tanta pressão para ser perfeita e agir com delicadeza em jantares cheios de pessoas fúteis e arrogantes.
Sério, eu não entendo o que as patricinhas da minha escola veem de tão bom nessas coisas a ponto de serem fissuradas em parecer ricas, mal sabendo elas que não enganam ninguém. Eu aposto que se passassem uma semana no meu lugar, com uma família como a minha, iriam desistir da riqueza em questão de dias. Mas eu estou presa a eles. E pelo que, correntes e cordas? Apenas um sobrenome? Sim, infelizmente. Eu tenho o sangue da família Preciosa em minhas veias, e isso para eles significa que eu os trago vergonha.
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Lost Sea - Uma Morte e uma Maldição
TerrorEXIBIÇÃO DE PRÉ-VENDA! Armin é um adolescente solitário e descontente com a vida, o que ele não esperava é que ela se tornaria um inferno quando seu irmão mais novo desaparece durante a noite, então ele precisa lidar com a culpa, desespero, um relac...