O negro das estrelas
Me banha em prata
Componho o último ato
A derradeira sonata.
Primeiro movimento:
Sou poeta do negrume
Pois vomito na folha
A bolha de nanquim.
O cenho à mesa
Às traças.
No rosto
O sorriso torto
Conformado com o fim
No fundo
Um sujeito escroto
Que mora dentro de mim
E que chora por veios loucos
Por versos poucos
Em soluços roucos
Um tristonho arlequim.
Segundo movimento:
A morte à espreita
Gela o meu peito
Balança o berço
E lambe os beiços
Convida-me ao gélido leito.
Observo
O orbe servo da tela negra
A lua cheia
A cortina a farfalhar.
Devaneio
Em meu anseio
E o meu seio a falhar:
Como pode ser o vento invisível
Se me empurra com tamanha força?
Como pode o silêncio ser tão calmo
Se estoura os meus tímpanos!
Como pode a alma ser tão medrosa
Que se esconde em minha entranha.
A vida é uma coisa estranha...
Terceiro movimento:
Eu, criatura atormentada
Revirada pelo álcool
Amaldiçoo meu criador
Por fazer-me
E preencher-me de dor
E o pior!
Por dar-me inteligência
E racionalidade
A capacidade do pensar
E por isso
A de sofrer
Por isto afogo-me em absinto
E derramo o meu escrito.
A brisa noturna seduz
O sufocante frio da noite
O inebriante golpe da foice
Cada vez mais próximo.
Gran finale:
Que tortura!
Que tontura!
Que loucura!
Não vou partir de óbito
Sou vítima da maestria
De morrer em poesia
Pelo meu próprio labor
Amigo...
Muito melhor que morrer de amor!
Vos digo.
Olho para baixo
As pedras na rua
Olho para cima
E vejo a lua
E, mesmo assim
A vontade de rir.
"Da garrafa o gole
Do cigarro o trago
Da janela o salto
Da cortina o brim..."

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Poesias para deprimir...
PoesíaDepressão, pessimismo, melancolia, tristeza... Sentimentos comuns a todos os seres humanos. Mergulhe no lado obscuro da poesia, encolha-se num cantinho escuro e aprecie a obra, ou deprecie...