Capítulo 12 - O poder da destruição (2/2)

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Meus pulmões doíam um pouco quando suguei o ar quente do verão. A luz inegavelmente linda do sol atravessava as cortinas brancas e provavelmente de seda, algo que desconheci depois do hospital. Em Juniper Hill podíamos usar roupas normais, algumas me foram doadas. Porém no que eu fui transferida, era apenas roupa hospitalar. Pintaram as paredes de branco para tentar esconder os crimes podres dos doentes. Esconder o sangue de meus pais que escorriam quente em minhas mãos, mas eu era considerada insana demais para viver em sociedade. Um pijama de bichinhos e um quarto confortável não mudava a tempestade dentro de mim.

Peguei o pão com geleia nas mãos e encarei Maturin. Ele me olha com interesse e o sorriso gentil foi substituído pela mandíbula tensionada. Tenso, Maturin estava tenso. Consegui reparar na postura ereta, numa forma inumana, as costas do ser permaneceram rígidas por um longo momento antes que eu decidisse morder o alimento em minhas mãos. Fugi das orbes oliva e remexi o pão com geleia em minhas mãos, virei e revirei, senti o cheiro enjoativo e doce chegando às minhas narinas. Fiquei confusa por um instante, eu estava com fome mas não queria comer aquilo e parecia bom. O pão com geleia parecia realmente bom.

Mordi o pão, sem exatamente estar constrangida com o olhar do ser. Ainda não sei exatamente o que Maturin é, mas ele é o extremo oposto de Pennywise. Enquanto o palhaço me causa arrepios na espinha, Maturin emana bondade. E surpreendentemente são irmãos. Saboreei a massa e a geléia que estava um pouco gelada, e o gosto me lembrava de… morangos. Geleia de morango, é. Mesmo assim… porque parece que é menos gostoso do que eu me lembrava? O ser em minha frente parecia ter relaxado.

Engoli e coloquei o resto no prato da bandeja, comi algumas uvas, sem cerimônia e sem gosto. Recusei a maçã quando foi-me oferecido. Agora quero respostas.

– Então… Maturin. – Estalei a língua, testando a pronúncia. – Uma coisa por outra.

– Foi o acordo. – Respondeu, simplesmente. – Pergunte.

– Antes de tudo… Eu quero saber o que você é, você me diz que não é um demônio. Pennywise seria um então? Ambos são criaturas… – Parei um segundo, prendendo o ar momentaneamente, antes de continuar. – que não são naturais. Não é?

– Antes disso…

Sem dizer mais nenhuma palavra, Maturin se deitou ao meu lado, de forma oposta a mim. Onde eu conseguia ver seu rosto de frente, e seus pés com meias brancas - sem, sequer, uma marca de sujeira - ficavam a minha lateral. Me senti leve pela casualidade e ri baixo, sem entender muito bem. Deixei a bandeja de lado e apoiei as costas contra a cabeceira. Olhando-o bem, em silêncio e deitado, não importa o quanto a maldita cama fosse fofa e macia, os músculos fortes do ser estavam tensos de novo. Com esse comportamento, um incômodo cresceu em meu interior.

– Desculpe, pelo menos neste corpo preciso sentir o que é dormir. – Riu. – A hibernação do meu irmão me obriga a acordar a cada vinte e sete anos.

Maturin bocejou. Encarei-o incrédula. E parece que minha face entregou. Com certeza meus lábios se abriram e as sobrancelhas se franziram.

– Não volto ao meu casco faz três dias, me dê um desconto. Vinte e sete anos foi uma pequena soneca. 

Escondi a boca com os dedos, evitando rir. Maturin estava reclamando de dormir por vinte e sete anos, e por não dormir durante três dias. Não era proporcional. Espera…

– Casco? Como assim? – Indaguei.

– Podemos nos apresentar de novo, sim? – Perguntou sem esperar resposta, pois continuou: – Humana Maxine Harris, Maturin a Tartaruga.

Estendeu-me a mão e esperou. Estiquei o braço e apertei. Com o tamanho consideravelmente grande da palma e dos dedos finos e bonitos, presumi que Maturin, nessa forma, deve ter a mesma estatura que Pennywise. Ou pelo menos, corpos na mesma medida. Lembrei-me de Robert Gray, o palhaço estava, de forma ridícula, lindo de morrer. Deve ser de família disfarçar-se de homens bonitos e perseguir os moradores de Derry.

Pennywise, Meu Amigo Imaginário.Onde histórias criam vida. Descubra agora