Nunca estive sozinha em casa antes. É meu primeiro verão em Derry desde que nos mudamos de volta, e mamãe me tranca em casa até ela voltar do trabalho, por que não há ninguém para ficar de olho em mim e não tenho que ir para a escola. Mas eu tenho seis anos, sei me cuidar muito bem.
- Você aceita um chá, Senhorita Nina?
A Senhorita Nina estava apoiada na parede, a melhor posição que eu achei para que ela não caísse para trás, e ela negou meu chá balançando sua grande cabeça de pano. Eu achei rude por parte da Nina recusar meu delicioso chá, preparado por mim. Já que o fiz, o tomarei! Seguro a linda xícara rosa com detalhes em dourado em minhas mãos enquanto levanto o dedo mindinho, assim como as damas chiques da TV. Levo a porcelana delicada aos meus lábios e bebi o líquido quente, coloquei a língua para fora fingindo que a queimei.
- Cuidado, Nina, o chá está tão quente!
Brincar de faz de conta me cansou, nem sequer tinha a linda xícara rosa que imaginei, mas um dia irei usar luvas com babadinhos e exibir o meu nariz empinado.
Meu estômago roncou e senti a necessidade de deixar a Senhorita Nina na cama, minha boneca de pano que tinha grandes botões no lugar dos olhos, e cabelos de tecido preto com uma franjinha. Eu achava ela linda, com um vestido azul como o meu, mas o da Senhorita Nina é mais escuro. Mamãe me dizia que Nina não podia ter sapatos, - Quando a perguntei por que ela estava descalça. - por que não possuía dedos. Eu tinha, então usava minhas sapatilhas o tempo todo.
Arrastei a cadeira até o armário e subi nela, estiquei minhas mãos e o abri, o cereal era tudo que minha barriguinha desejava. Puxei a caixa com cuidado, senti medo dela fugir dos meus dedos, pois ela era tão grande que tomava minha mão por inteiro. Desci da cadeira e peguei leite de caixa na geladeira, mamãe provavelmente me mataria se soubesse que eu bebia direto da caixa.
Mastigo o cereal, a crocância é percebida pelos meus ouvidos, num barulho chato. Não tive tempo de terminar, captei sons das chaves batendo contra a porta de madeira e o ranger da maçaneta. Me mantive sentada na cozinha, e vi ela passar pelo sofá e subir as escadas. Sequer prestou atenção em mim.
Suspirei. Mamãe ficou distante quando Rob foi para o céu, assim ela dizia, dançar nas estrelas. Mas porque ela estava triste, exatamente? Eu também queria dançar nas estrelas, como o Rob, mas sinto medo de nunca mais voltar. Não lembro o que aconteceu com ele, eu era muito nova quando Rob subiu aos céus, minhas memórias são confusas em relação ao acidente.
- MAXINE!
Mamãe gritou lá de cima. Um arrepio desconfortável percorreu minhas costelas, odiava quando mamãe gritava meu nome daquele jeito. Saio de cima da cadeira e corro lá pra cima, subi as escadas do jeito mais rápido que pude.
- Sim, mamãe?
A mamãe jogou a bolsa de couro velha e fedida que levava para todo canto em sua cama. Ela me encarou, furiosa, eu não sabia ainda o motivo. Dei dois passos para trás quando ela estendeu as mãos que segurava o seu vestido creme, com estampa florida das mais lindas rosas, em pedaços, ele foi destruído, cortado.
- Por que você fez isso?
Minhas mãos tremem ao ver o estado que o vestido ficou. Mamãe se aproximou de mim quando fiquei em silêncio, incapaz de falar, e apertou meu braço. Ela me puxou para cima e eu senti as pontas dos meus pés tocarem no chão, meu braço doía muito ao seu aperto e eu sentia as unhas pintadas de violeta quase cortarem minha carne. Tentei me livrar, sem sucesso, de suas mãos empurrando inutilmente seu pulso com minhas mãozinhas.
- Não fui eu, mamãe, eu juro.
Chorei, me sentindo furiosa e confusa. Não fiz aquilo no vestido, e ela me culpará. Mamãe gritou comigo de novo, não entendi o que ela disse porque meus gritos se tornaram altos até para mim, senti ânsia quando pingos de saliva atingiram minha face. Olhar para a face transfigurada em ódio dela era torturante, e eu não olhava, fechei os olhos com força e levei a cabeça pra trás na tentativa de impedir mais saliva no meu rosto.
- Não quero brincadeiras, Max! Se isso acontecer de novo, você já sabe!
Minhas costas doeram quando meu corpo se chocou contra o piso de madeira, ela me soltou de forma bruta, ergui meu corpo enquanto soluçava. Olhei para mamãe, o meu cabelo ficou bagunçado e alguns fios atrapalhavam minha visão. Me levantei e saí correndo do quarto, indo direto ao meu, mamãe ainda resmungava sobre seu vestido creme totalmente destruído.
Ao fechar a porta atrás de mim, percebo algo estranho em minha cama. A senhorita Nina está numa posição diferente, agora estava no chão, embaixo da cama.
- Senhorita Nina? Como desceu até aí, minha amiga?
Nina ficou em silêncio, ela não queria papo hoje, me aproximei do móvel e abaixei para pegar a senhorita Nina. Havia algo mais embaixo da cama, eu vi um par de olhos azuis, um azul estranho e brilhante, semelhante a uma bolinha de gude, irreal. Era tudo o que conseguia ver, ao redor a escuridão não deixava meus olhos captarem nenhuma feição da criatura.
- Olá? - Perguntei aos olhos, tensa. - Você quem moveu a senhorita Nina?
O vazio gargalhou. Fiquei confusa. Ouvi um barulho de sinos, a coisa bateu a mão enluvada contra a madeira e eu me assustei. Por um momento tive que desviar o olhar para a porta, com receio de que minha mamãe tivesse escutado o barulho. Quando me virei de volta, um palhaço gigantesco remexia os braços e as pernas, que produziam aqueles sons de sinos, praticamente saltou debaixo de minha cama. Recuei dois passos, desconfiada.
- Você é um palhaço. - citei, convicta.
- Ora, você acertou Maxine. Sou Pennywise, o palhaço dançarino.
Aquele palhaço com maquiagem engraçada e as roupas cinzas, como se estivessem sujas, ou realmente estavam, falava de um jeito estranho. Parecia que ele soltaria uma gargalhada a qualquer momento. Apertei a senhorita Nina contra meu corpo, e o palhaço sorria.
- Você quer ver um truque de mágica, Max?
Mordi os lábios, estou começando a ficar ansiosa. Olhei para a porta fechada pelo canto dos olhos. Queria muito ver a mágica, mas mamãe estava em casa, neguei com a cabeça baixa. O palhaço riu baixinho e fez surgir um lindo balão vermelho em suas mãos. Pennywise segurou a cordinha branca e me entregou o balão, fiquei fascinada com a cor carmesim acentuada da bexiga.
- Foi incrível, senhor Pennywise!
Abri bem os braços e abracei o palhaço com força, minhas mãos mal rodearam sua cintura e uma delas estava ocupada segurando a cordinha do balão que ganhei. Durante o abraço percebi que a senhorita Nina caiu do meu colo. Me afastei do palhaço e abaixei para pegar Nina, mas quando voltei a olhar para o senhor Pennywise, ele estava paralisado como uma estátua. Não consegui distinguir o que ele estava sentindo, a feição sorridente dele se transformou numa careta.
- Senhor Pennywise?
- Palhaços não gostam de abraços.
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Pennywise, Meu Amigo Imaginário.
KorkuClassificação indicativa: 🔞 Max era uma criança que nasceu e cresceu na cidade de Derry, no Maine. Sofrendo abusos de seus pais, a sua mente criou um amigo imaginário, Pennywise o palhaço dançarino, - Foi como se apresentou para ela - como mecanis...