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Darnell se afasta para pegar no fundo da mochila as trufas caseiras trazidas por ele para "me dar 1% a mais de vida".

Infelizmente não acontecerá, mas isso não quer dizer que nunca podemos sonhar com cada momentinho e fugir um pouco da rotina. O esperado é, em nenhuma circunstância, afetar o meu tratamento.

Minhas férias do ano foram arruinadas outra vez pela fibrose cística, por bons meses vou me ocupar fazendo grossos cachecóis avermelhados, ler, desenhar, comer pudim - só quando a general Barb deixar - e por fim, ser movida por antibióticos, bolsas de soro e aparelhos médicos.

É a minha marca registrada.

- Daya, o que você acha de começarmos pelo de maracujá? - Darn pergunta já me jogando um.

- Nem esperou eu responder! - Reclamo animada me ajeitando entre os lençóis.

Uma coisa que eu adoro nas trufinhas são as embalagens de bichinhos, é tão significativo todo cuidado que meu amigo tem com os doces para mim, ele nunca erra. Abro um sorriso para ele que dá de ombros sentando-se na ponta da cama; a embalagem de hoje contém vários ursinhos coloridos. Entusiasmada, desfaço o laço da fita pronta para colocar a trufa toda na boca.

- Vai se engasgar desse jeito, lindinha.

- Está uma delícia!

Darn ri. Nunca foi um problema falar com a boca cheia perto dele.

- Vou deixar dois na mesa, tenta não comer tudo hoje por causa da sua revisão.

Faço um biquinho ao ouvir isso, o espírito de formiga que existe em mim não aguenta. Ele ergue as sobrancelhas para me intimidar, mas logo em seguida estende a garrafa com água.

- Me ama muito. - Provoco.

- É, tem um lugar reservado para a senhorita bem, bem, bemmm lá no fundo do meu coração.

- Tem um lugar reservado para você também bem, bem, bem, bem, bem, bem, bemmm...



Solto o ar enquanto Barb mede a minha temperatura. Na noite de ontem fiquei um pouco febril e acabei não dormindo tão bem. Hoje pela manhã a dor de cabeça veio com tudo e só depois do banho morno e do café da manhã com os antibióticos que tive uma melhora aceitável. Tenho em mente que estou tão acostumada com essas recaídas que nem me desespero mais.

Barb confere o acesso da sonda na minha barriga antes de arrumar minha blusa e ajeitar meu cabelo, eu devo estar péssima.

- Sem febre. - Ela diz - Quero que fique um pouco no inalador, ok?

- Preciso mesmo? Queria ir ao jardim...

Ela me encara gentilmente enquanto tento respirar fundo algumas vezes.

- Está liberada para ir só depois do inalador.

Percebo que estou chiando um pouco.

Ela retira duas luvas de látex e uma máscara do carrinho para mais tarde. No canto do quarto, pego o pequeno inalador e o frasco de Flovent, Barb já havia arrumado os travesseiros para eu me sentar, ela é tão atenciosa comigo. Desde quando eu me entendo por gente que ela cuida de mim aqui dentro. A considero como segunda mãe.

- Até daqui a pouco, meu bem.

- Obrigada! - Agradeço antes da porta se fechar.



Eu poderia encher de tinta essas paredes grandes e sem graça. Penso, logo desisto porque não aguentaria tanto esforço com a minha função pulmonar em 40%. Isso me deixa frustrada.

Imagines tomdayaOnde histórias criam vida. Descubra agora