7. Fundo do poço.

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&. Escutar a música e ler a letra para melhor experiência.&


  Totalizou um ano depois da minha morte. E em todos os anos de minha vida, com certeza esse foi o pior.

  Eu poderia morrer de novo, poderiam me ferir, meu psicológico poderia quebrar que eu sobreviveria, me levantaria depois. Mas ver o garoto que amo se destruir aos poucos por mim, me corroía por dentro.

  Zack saiu da ilha dos angelicais sozinho voando e voltou a nossa casa com o livro. Kalibam não deu sinal nesse tempo.

  No primeiro mês, ele apenas voltou para a nossa casa e vivia os dias como acordando, comendo, lendo os livros da minha prateleira e dormindo. Ele leu cada livro de minha estante, sendo um livro de romance ou um livro sobre as raças e plantas, ele leu todos em busca de respostas. As vezes lia na sala, as vezes na cama, ou caminhava em círculos pela casa lendo.

  Zack falava comigo mesmo eu não podendo responder, ele fazia comida para duas pessoas e deixava um prato para mim na pequena mesa em frente ao tronco de minha casa, onde tivemos nosso aniversário. Ele dormia apenas em um lado da cama e me deixava um espaço mesmo que eu não consiga dormir. Quando ele ia tomar banho e saia do banheiro pingando água como de costume, ele me pedia desculpas e secava o chão.

  Mas o tempo acaba com qualquer um.

  O moreno no começo varria e deixava nossa casa organizada, mas depois de um tempo ele apenas foi parando aos poucos. Começou deixando a louça acumulando na pia, dormia nas roupas de cama sujas e deixou poeira acumulando nos móveis. Queria ficar brava com ele, mas não conseguia, não poderia culpa-lo. Ele começou a ficar a maior parte do dia quieto, deitado na nossa cama com as asas abertas olhando para a janela. A janela que ele sempre entrava, talvez estivesse esperando eu entrar por ela dessa vez.

  Aos poucos ele parou de falar comigo, parou de fazer um prato de comida para mim, parou de deixar meu espaço na cama. Parecia que ele havia desistido, ou esquecido do propósito que ele criou de me ajudar. O tempo era o problema, o tempo corrói tudo, até mesmo as forças de Zack que sempre foram seu ponto forte.

  Após a comida da geladeira acabar, ele voltou a caçar, o que me deu um pouco de esperança, pensei que ele apenas desistiria de comer também. Mas o jeito que ele caçava... Era como se ele descontasse toda sua raiva na criatura a sua frente, poderia ser um coelho ou um enorme bisão, ele matava e destroçava e comia no local, sua fome de carne e sangue voltou, e voltou mais forte que nunca.

  As semanas foram passando, Zack finalmente resolveu sair daquela casa um pouco. Em uma manhã ele voou em direção a cidade grande, onde teve o baile e onde a rainha morava. Acreditei que ele iria à praça ver pessoas ou falar com a rainha, mas ele apenas entrou no bar.  

  Aquilo me dava um mau pressentimento, nunca vi Zack beber daquele jeito, ele começou com alguns copos de alguma bebida alcoólica e depois foi tomando mais e mais. As criaturas a volta dele no começo acharam emocionante alguém conseguir beber tanto, apostavam para ver quantos copos ele conseguiria beber sem vomitar, mas depois de um tempo a diversão virou preocupação aos olhos das criaturas no bar.

  Por ser um demônio, Zack era resistente a álcool, o que me fez pensar que ele acabaria a noite bem, mas ele sabia dessa sua resistência e isso só fez ele beber mais. Ele queria ficar bêbado.

  Naquela noite, foi a primeira noite de muitas que acompanhei Zack de bar em bar como sua sombra, que depois ele caía em um beco molhado e sujo e apenas dormia. Ladrões tentavam roubar os pertences dele e eu jogava pedras neles para os assustar. Em algumas dessas noites protegendo Zack, eu ganhei mais cruzes em minhas costas, estava boa em fugir da morte, já havia se tornado rotina.

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⏰ Última atualização: Dec 15, 2023 ⏰

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