Capítulo 7

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   Sinto o ar frio da casa por todo o meu corpo, fico parada no hall de entrada enquanto observo todos o ambientes que meus olhos conseguem contemplar, os quadros de incontáveis gerações de Ferraris pendurados pelas paredes, o tapete vermelho vinho que vai da entrada até o andar de cima pelas escadas duplas, os moveis de madeira e até as flores cuidadosamente escolhidas pela governanta. Sigo subindo pelo lado direito da escada, ponho minhas mãos sobre os corrimões gelados e vou indo em direção ao meu quarto, passo pelo longo corredor ignorando todos os cômodos, já que cada um deles carrega alguma memória que estou desesperadamente tentando esquecer. 

   Abro a porta do meu quarto e para minha surpresa ele está exatamente igual o jeito que eu deixei da ultima vez em que estive aqui, o papel de parede rosado, a cama de casal com um dossel branco e meus bichos de pelúcia todos juntos perfeitamente colocados sobre o lençol branco. Fecho a porta com cuidado e adentro mais no quarto, me aproximo da janela e aprecio a vista que sempre amei ao mesmo tempo em percebo que estava com mais saudades daqui do que eu gostaria de admitir, toda a vista do meu quarto da em direção para o lago e para as montanhas, viro-me e caminho direção a minha escrivaninha onde tem fotos apoiadas de toda a minha vida, fotos minhas de bebe, uma foto minha com meus avos na ceia de natal e varias fotos minhas com meu irmão durante o anos. Vou para o meu closet e pego um casaco, e meu Deus como a minha eu adolescente  tinha um gosto questionável para roupas, sinto o meu estomago roncar e decido que é hora de deixar de ser medrosa e ir explorar casa e torcer para os funcionários terem preparado algo para o almoço.

   Sigo o cheiro de comida do ar, o que é ótimo, isso já é um sinal de que meu dia está começando a melhorar. A cozinha é coberta de armários brancos, com mármore nas bancadas e janelas por todos os lados deixando-a inteiramente iluminada pela luz natural. Vou em direção ao fogão industrial, que minha amada progenitora fez questão de ressaltar que era uma edição exclusiva de alguma marca que não faço a menor ideia e por isso não devíamos nem respirar perto dele, para a sorte dela sempre fui péssima na cozinha. Busco um prato e assim que me sirvo sento em uma das banquetas e aprecio a comida em silencio, os funcionários não estão em nenhum lugar a vista o que não é um bom sinal.  

   Novamente sou tomada por meus pensamentos, esse lugar carrega a maioria das memorias da minha vida. Depois da morte do meu pai toda a família se isolou aqui para fugir dos ataques da mídia, não lembro muito dessa época, na verdade não lembro de nada em relação ao meu pai, só tinha três anos quando ele faleceu. Sei que quando ele morreu tudo o que os Ferraris conheciam caiu por terra, sempre nos achamos invencíveis, mas quando tragédias como essa acontecem tudo é posto em uma nova perspectiva e foi isso que aconteceu com minha família. Não tenho memoria minha com pai, tudo o que sei sobre ele aprendi sozinha ou pelas histórias que meu avô me contava, na adolescência eu passava noites em claro assistindo entrevistas dele escondida só para poder ouvir o som da sua voz, tudo relacionado a ele sempre trouxe muita dor para minha mãe. Meu irmão é copia do meu pai, possui os mesmo cabelos loiros claros e os olhos azuis e quando ele sorri parece que o papai está realmente vivo nele, já eu sou exatamente como minha mãe, cabelos castanhos escuros, pele clara e olhos verdes, ás vezes parece que somos gêmeas separadas pelo tempo.

   Passei quase todos os verões da minha vida aqui nessa casa e sempre que haviam os GPs de Monaco também ficávamos. Todas minhas melhores e piores lembranças estão nessa e na nossa casa em Roma, crescer na minha família não foi fácil, mas eu sobrevivi, conheci Laura e assim que tive idade suficiente fui em bora, não é como se eu os tivesse abandonado continuo falando com avô e agora vou trabalhar junto com ele, estou sempre grudada no meu irmão a única pessoa que ainda é doloroso de mais manter contato é minha mãe, porém já me conformei com este fato.
   Começo a levantar para levar a louça para a pia quando finalmente escuto vozes vindo da área dos funcionários. Eles entraram na cozinha e posso ver o brilho de seus olhos sumindo assim que me vem, isso dura somente algum segundos, eles me dão um sorriso assim que percebem que não sou minha mãe.

- Senhorita Isabela não estávamos esperando a sua presença por aqui. - Diz um deles.

- Eu estava aqui por perto e resolvi dar uma passa por aqui. - Respondo rapidamente. Eles se entre olham claramente sabendo que estou mentindo, todos que trabalham aqui sabem que evito a propriedade ao máximo.

- Claro. Pode deixar a louça e que nós damos um jeito.

- Não é necessário, eu não quero atrapalhar vocês podem deixar que eu lavo. - Eles assentem e seguem seu caminho.

   Lavo os pratos com calma enquanto olho para o jardim, já que estou aqui decido que vou aproveitar a casa. Saio da cozinha e subo novamente as escadas só que dessa vez vou pela esquerda em direção a biblioteca Magnólia, batizada em homenagem a minha avó, empurro a grande porta de madeira, respiro profundamente sentindo o cheiro de todos os livros que estão guardados nesse lugar, vou passando por entre as estantes a procura de algo que chame minha atenção e paro exatamente em frente na seção de livros de poemas, puxo um livro de Emilly Dickinson e sigo para jardins.
   Sempre gostei da escrita de Dickinson, a forma como ela expressou seus sentidos e continuo acreditando no seu sonho de ser uma poeta mesmo quando todos a puxavam para baixo me inspirou. Sento-me debaixo da minha árvore favorita da infância e abro o livro em uma página aleatória sentindo o sol esquentar o meu rosto.

"Dizem que “o Tempo tudo cura” —
Mas o certo é que não —
A dor que é dor fica mais rija
Como velho Tendão —

O Tempo é Teste de Tormentos —
Não Remédio afinal —
Se algo isso prova, também prova
Que não havia Mal"


Tudo o que essa mulher escreveu sempre me pareceu se encaixar em algum aspecto da minha vida e é óbvio que no dia de hoje não seria diferente. De repente o sol que antes era forte some e ouço uma voz que faz meu estomago revirar. Minha mãe está aqui.

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