A verdade

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Anita Pov

Acordei com o relógio apontando 6h da manhã, fiz minha higiene matinal e desci para a cozinha para fazer o café.

-bom dia, o cheiro está bom-diz verônica ao chegar na cozinha

-bom, temos uma diferença né, a cozinha é uma das minhas paixões- deu uma risada ao ver a careta da morena

-sério, como alguém pode gostar de cozinhar em plenas 6h da manhã?!!

-bom, cresci sem pai e mãe, nunca tive esposa para cozinhar para mim e empregada estava fora de cogitação! Não confio em colocar estranhos dentro da minha casa, não sou doida como você- piscou para verônica que deu uma risada com a referência da loira.

-sempre deixei a parte da cozinha para meu marido... ex-marido quer dizer, as crianças sempre preferiram a comida dele mesmo.-deu de ombros até se tocar em algo que Anita havia falado- espera, espera um pouco! Você disse "esposa"?!

-hum, sim?! Algum problema Torres? Vai me dizer que é homofóbica?-lançou um olhar debochado para a morena

-claro que não!-disse meio exasperada- é só que eu imaginei que você tivesse algo com o... você sabe

-com quem? Eu não sei mesmo

-com aquele bonitão que estava no seu escritório quando fui te ver, só havia vocês dois trabalhando lá então pensei que...

-pensou errado!  Lima foi um traíra mas ainda sim foi o único que prestou apoio quando precisei e por isso trabalha lá comigo.
Mas poxa, você me ofendeu agora. Caramba verônica, logo o lima?-lançou um olhar incrédulo seguido de uma risada da morena

-o que? Eu não tinha como imaginar ok?! Agora passa esse bolo e esse café pra cá que estou morrendo de fome e precisamos começar a agir logo.

Após tomarem o café, seguido de um silêncio que ao todo não era desconfortável era como um momento de paz para cada uma.

-então Anita, como foi que você acabou entregando eles? Afinal, você era uma deles.

-passei a vida tentando corrigir os erros que cometi na minha ânsia de acertar. Ao tentar corrigir um erro, cometi outro. Sou uma culpada inocente.

-uau, Clarice Lispector? Não sabia que gostava de literatura brasileira.- a loira deu uma risada

-muita coisa você ainda não sabe sobre mim, verônica. Mas o que essa frase diz é exatamente o que se passou comigo, tentei corrigir erros que já não eram mais tão pequenos assim até que me vi na mira deles.
E foi quando eles tentaram me matar que eu vi a proporção que tudo havia chegado.
Eu nunca tive noção do quão terrível era tudo isso. verônica, quando você cresce com as pessoas ao redor dizendo que aquilo é certo, você acredita que é certo! Eu era uma criança orfã, não tinha uma base fora dali, mesmo adulta eu continuava acreditando que tudo aquilo era certo, hoje vejo que não é.

-eu sei o que acontece lá dentro, sei como funciona a cura, mas nunca tivemos relatos diretamente das vítimas, apenas da filha dele... Anita, você tem alguma noção de como é de fato a cura?- após isso a morena percebeu a tensão se instalar na loira e sua expressão ficar mais séria- você não precisa me contar agora se não quiser!

-não, eu preciso! Eu disse que isso não iria me atormentar mais, eu quero me ver livre disso.

-certo, quando quiser pode começar a falar.

-eu tinha 13 anos, tudo começou quando eu recusei o pedido de namoro de um menino e ele começou a me vigiar como um louco, no começo eu pensei que poderia ser só ego ferido, até que ele começou a me seguir e em uma dessas vezes ele me flagrou com a minha namorada da época, éramos crianças verônica, nem de fato nos beijamos era só um encostar de lábios inocentes e "eu te amo" sem entender o peso real daquela frase. E foi aí que ele correu para contar ao Matias, eu era uma das melhores deles, eles não queriam correr o risco de me perder e por isso não me mataram.
Matias me chamou na sala dele e veio com uma história de férias, estranhei o fato de eu ser a única a ter férias entre todas as crianças dali e ele me explicou que eu merecia pois era a melhor em tudo e precisava descansar um pouco para continuar sendo a melhor, e eu, óbvio que acreditei. Quando chegamos a casa dele os primeiros dias realmente foram como férias, sabe? Piscina, televisão, quarto só pra mim, conforto, comida boa, até que chegou o fatídico dia, ele me disse que sabia quem eu era e que aquilo era um erro; e disse que ia me curar para eu não seguir sendo uma pecadora... ele me levou até um quarto afastados dos demais, havia tipo uma maca no meio do quarto e velas ao redor, ele me deitou ali e fez tipo uma "oração" antes de começar a me abusar.

-quando você diz abusar...

-ele me estuprou.
Óbvio que não época eu achei que aquilo era realmente para me curar, afinal, eu acreditei que de fato havia algo de errado comigo. Mas, eu não queria aquilo! Depois eu senti dores, me senti suja, chorei até dormir após quase arrancar minha pele esfregando o sabão no banho.
Verônica, ele faz isso com todas, é tipo um padrão, ele procura um "erro" em você e usa aquilo para te "curar" você acredita, e então, ele te estupra.

-Anita, em primeiro lugar, eu sinto muito! Não tenho noção da dimensão do seu sofrimento.
Você é uma mulher forte, na época era só uma criança, agora que seu deu conta de tudo resolveu concertar a situação.
Não se sinta culpada por ser inocente. O certo é algo utópico, nós nunca iremos estar certos 100%
O que é certo para você pode parecer errado para mim, então, nunca saberemos quando algo é de fato certo.  Bom, você acha que ele fazia isso com todas as meninas do orfanato?

-não, acho que não, eram muitas e uma hora alguém iria estranhar.

-mas todos não sabiam o que ele fazia? Por que estranhariam?

-haviam pessoas de fora da sujeira toda lá dentro. Acredite, ele não correria esse risco.

-certo, você acha que ele fez mais vítimas antes de você?

-não, eu fui a primeira.

-e como você sabe?

-é aí que chega a parte onde vai te interessar.
Havia um caderno na época onde ele anotava o nome das vítimas, eu era a primeira e essa lista só foi crescendo, haviam mulheres que não faziam parte do orfanato! Mas, agora esses nomes foram passado para uma pasta no computador dele. Acho que só teria acesso hackeando o sistema ou pegando o computador.

-e você acha que mesmo depois de tudo ele manteria essa lista no computador?

-sim, os nomes estão em uma pasta como se fossem pessoas que ele ajudou com doação, para caso algo vazassem ninguém desconfiasse. O cara é um gênio querendo o não.

-vou ver o que glória pode fazer para ter acesso a esse sistema. Acho que por hoje está bom, não quero te martelar com o passado de uma vez só.

-verônica eu estava pensando, o que você ganha se metendo mais ainda nesse caso? Você tem dois filhos, um maridão, não vejo motivo de se afundar mais nisso.

-Anita eu vi mulheres perdendo a vida por causa dele e de seus irmãos. Não quero mais vítimas, minha família está protegida pela glória, e meu ex-marido já seguiu a vida dele com uma mulher, e sinceramente? Melhor assim, prefiro ver ele feliz do que se lastimando por algo que estava fora de seu alcance.

-e esse algo fora de seu alcance que você diz seria te impedir de dar andamento ao caso?

-exatamente. Bom, vamos abrir um vinho e descansar um pouco pois hoje tivemos revelações bem desagradáveis-soltou um riso forçado

-é, nem me fale! Lembrar dessa merda toda só me faz ter mais ódio desse homem.

-vamos?

-vamos!.

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