ᴇᴘɪ́ʟᴏɢᴏ

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— Sabe, anjo, nunca planejei ter filhos, mas aí ela chegou

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— Sabe, anjo, nunca planejei ter filhos, mas aí ela chegou. Encontrei-a na estrada quanto estava indo pra cidade.

Respirei fundo, tentando começar a conversa que tanto adiei a ter.
E admito, se não fosse pelo medo eu não estaria aqui agora.

— Não consegui ignorar, por mais que tenha tentado, ela era tão miúda e estava ali, pra morrer uma segunda vez. Eu não quis tomar essa responsabilidade pra mim, mas não fui capaz de fugir dela — assumi, e vi o menino começar a prestar atenção em mim.

Preciso ser sincera, e sei que ele não entenderá, ou não prestará a devida afabilidade, mas é minha obrigação fazê-lo entender.

— o começo foi extremamente difícil, eu posso te afirmar que ser mãe as vezes é abrir mão, minha filha precisava ser amamentada, e eu não podia fazer isso por ela, ademais a amamentação é só um dos milhares de exemplos. Esse papel materno é cheio de doações, a gente se doa o tempo todo pensando no melhor pros nossos filhos.

Senti o nó na garganta, mas não parei com minha fala. Pensando que se fizesse isso a probabilidade do choro me alcançar seria enorme.

eu errei como mãe, e meu erro custou a saúde da minha filha. Nesse caso específico causei dores desnecessárias em minha criança, eu teria tomado atitudes diferentes e assumo isso.

Encarei o céu, obrigando minhas lágrimas a voltarem por onde quer que elas tenham saído. Contei de um acontecimento tão antigo, mas o desabafo me parece tão recente!

— Sei que esse meu pensamento não muda nada pra ti, você não é mãe, e não passará por isso, mas quero que entenda o quão é difícil pra nós, também. Entendo que não deve ser fácil abrir mão de tudo o que viveu, não quero jamais diminuir sua dor.

O menino assentiu, parecendo me entender, ou se não estiver parece ao menos tentar.
Seus olhos verdes me encaram, e não desviam o olhar.

— Você tem em mente que vai sofrer, que vai ser horrível, que nunca vai se acostumar, e eu levo isso em consideração, os cuidados, eu, eu entendo que seja difícil, meu bem, mas eles são tão necessários, e aprenderá (assim como Sina) a lidar. Odeio ter que fazer comparações, porque são seres diferentes que vão aprender de forma diferente, mas sua irmã tinha entendido, com muitos desafios, que tudo o que fazemos é necessário.

Prossegui, tentando ignorar todo o resto do mundo.

– Você já me mencionou o tédio, não? Sinto muito por isso, mas telas são muito prejudiciais. Comentou que delas você não abre mão, mas isso, infelizmente, não é tu quem decide. De onde você vem as pessoas estão cada vez mais alienadas em telas, mas aqui não temos isso, ok?

Tive que dizer.
O fato não me revolta, mas me deixa triste.

— ontem te vi a beira de cair, e sei que chorou no berço até apagar completamente — falei, e ele pareceu se envergonhar — o que quero dizer é que é comum perder o equilíbrio, em um momento ele volta você ainda vai cair, querido, mas aos poucos vai aprender como evitar isso, sei que tem medo, aos poucos também vai perdê-lo, mas o medo faz parte, cair também,
o que importa é que eu e sua
mamãe estaremos aqui pra te ajudar a superar e isso eu posso te garantir.

Afirmei e vi lágrimas se acumulando no mar verde que são seus olhos.
Peguei-o no colo e abraacei seu pequeno corpo.

— não vai poder contar só conosco, meu amor, aos poucos vai conhecer a família, e terão momentos incríveis de diversão sua irmã os amou, e tenho a impressão de que vai os amar também. Foi uma criança muito esperada, precisa saber o quanto seus avós imploravam por um príncipe na família. 

Não menti.

— quero que seja sincero comigo, porque eu estarei aqui pro que precisar. Afirmei isso uma vez e falhei, mas agora aprendi, a vida não é assim? Quero que conte comigo pra tudo, meu filho, e lembre-se sempre que tudo bem passar por desafios e dificuldades, mas saiba vamos dar um jeito em tudo, nem que tenhamos que ter mais injeções com calmantes — brinquei, mas ele não entendeu a referência.

— não te conheço muito bem, mas parece ser uma boa mãe.

— eu tento — concordei.

— por que diz como se não fosse boa?

— por que falhei uma vez, e isso custo a felicidade da sua irmã.

— tive uma irmã?

— você ainda tem — afirmei sentindo minha mão tremer — ela não está aqui com você, mas tenho certeza que te enxerga de onde quer que esteja.

— ela sofreu um acidente?

— sim — afirmei — sua irmã era incontrolável, querido, e ela amou demais pessoas que não mereciam esse amor.

Conseguia sentir meu rosto encharcado de lágrimas quentes e grossas. Assim como escuto meu coração negro pulsando alto e rápido.

— e por isso estamos tendo essa conversa hoje. Preciso que entenda que eu posso ser rígida, mas que não faço nada que não seja necessário. Meu dever como mãe é manter você seguro, eu já falhei uma vez, Noah, e isso custou a vida de sua irmã, não vou falhar novamente.

— ela parecia ser muito amada aqui.

— ela era, meu filho, ainda é — um nó se formou em minha garganta — mas quis voltar pra uma vida que já não a pertencia, e se esqueceu que não era mais a mesma.

— foi o sol, mamãe?

— sim — afirmei mais uma vez.

Noah secou minhas lágrimas e bochechas molhadas, e eu me obriguei a parar de chorar.

— entende que só quero te ver bem? Eu não conseguiria suportar perder mais um filho.

— não vou querer voltar nunca — ele me garantiu — e prometo tentar me dar bem com isso tudo.

— que bom, meu amor. Fico feliz por isso — beijei seu rosto — será que posso chamar a mamãe Any? Promete que vai deixar ela te alimentar?

Assisti minha criança assenti sem medo, e sorri chamando minha esposa.
Ela demorou um tempo mas logo chegou no quarto infantil já de pijama, e o que carregava em suas mãos me fez voltar a derramar lágrimas. 

— tenho um presente pra você — a mulher disse chegando perto do berço — era da sua irmã, mas estava comigo, costumava grudar nele quanto tinha saudades dela, mas acho que fará um melhor proveito.

O polvo felpudo já está velhinho, mas ainda trabalha muito bem.
Já o Dino está com Sina, cuidando dela.

Foram longos tempos fazendo terapia e me enchendo de álcool, sempre com minha esposa por perto pra me garanti que tudo ficaria bem. E hoje entendi que não preciso deixar o tempo que tive minha menina cair no mar de esquecimento, não deixarei No Passado.

— mame, meu amor. As mamães vão te proteger de tudo — minha morena garantiu, e eu concordei fazendo carinho no nosso miúdo.

■> Considerações finais

Huuum, ok. Acho que acabamos aqui.

No PassadoOnde histórias criam vida. Descubra agora